Morar em um apartamento alugado do tamanho de um carro e, para completar, não ter carro. Essa tem sido a escolha de milhões de jovens adultos no Brasil e no mundo. É a forma como estão encarando o capitalismo no século XXI, seja por necessidade, seja por opção pessoal. Trata-se de um estilo de vida marcado por uma lógica revolucionária: menos é, sob diversos aspectos, mais. Para os adeptos, a nova forma de viver significa, por exemplo, ter menos dívidas e mais tempo para aprender, crescer e viver — desfrutar é mais relevante do que ter. Pelos menos assim aponta a pesquisa das agências Harris Poll e Eventbrite, que revela que 78% da geração Y, os nascidos entre 1981 e 1996, prefere gastar seu dinheiro com experiências a investi-lo em bens materiais — às vezes sob o olhar crítico de pais e amigos da geração predecessora. Os millennials (outro nome para designar os Ys) pareciam predestinados a encontrar a satisfação nas pequenas coisas e a valorizar o consumo consciente, mas apenas recentemente eles chegaram à idade de exercer seu poder de compra e ditar as novas regras do mercado.
O setor imobiliário foi um dos mais afetados pela mudança de prioridades, mas demonstrou ser capaz de se adaptar. Em 2019, foi entregue, por 99 000 reais, o menor apartamento do Brasil. Localizado em São Paulo, ele tem 10 metros quadrados (pouco maior que um sedã médio, porém menor que uma vaga de estacionamento). Minúsculo em tamanho, tornou-se o maior símbolo dos microapartamentos, categoria de até 30 metros quadrados. A filosofia é simples: viver apenas com o essencial — mesa, cadeira, banheiro e um sofá-cama. A casa do millennial típico baseia-se, sobretudo, na funcionalidade. Às vezes tem uma planta, um canto para o pet e porta-trecos feitos de materiais sustentáveis. Microapartamentos não comportam cozinha, escritório e muito menos lavanderia, que passaram a ser áreas compartilhadas do condomínio, disponíveis a todos os moradores. A geração Y parece ter abraçado o conceito sem resistência.
“Não temos orgulho da metragem, mas, sim, da acessibilidade à moradia”, afirma Alexandre Frankel, dono da Vitacon, que lançou o micro de 10 metros quadrados. A estratégia é pensar no prédio inteiro como uma extensão do apartamento. Em 2020, 75% das unidades vendidas pela empresa foram as de até 30 metros quadrados. Além da praticidade, outro benefício trazido por esses empreendimentos é a localização. Ao abrir mão de espaço, o cliente pode escolher algo próximo do trabalho, ganhando tempo com o deslocamento diário.
Deslocamento pressupõe carro, e automóvel é outro bem que ficou menos atraente para o jovem adulto, especialmente em cidades congestionadas. Com a popularização dos aplicativos de transporte, o usuário pode pedir uma corrida enquanto termina o café da manhã. E, para quem ainda precisa de um, já existe o serviço de assinatura, a locação feita diretamente com as montadoras. Toyota, Audi e Volkswagen oferecem diversos modelos e se tornaram uma opção às locadoras tradicionais de veículos, que, por sinal, mal conseguem dar conta da demanda. As vantagens, qualquer um pode imaginar: nada de preocupação com IPVA, licenciamento, manutenção e seguro — está tudo incluído na assinatura.
Verdade seja dita, a forma de consumo dos millennials se estende para além da casa e do carro. Trata-se de uma geração que veio para reformar o mundo, atualizá-lo e questionar os padrões herdados dos mais velhos. As expressões desse novo modo de pensar são visíveis não apenas nas escolhas de casa e transporte, mas em todos os aspectos da vida. Só o tempo dirá se a tendência terá atalhos ou reversões. Por enquanto, o futuro é minimalista.
Publicado em VEJA de 13 de janeiro de 2021, edição nº 2720