Acordo da Opep+ não deve ser suficiente para conter derrocada do petróleo
Países membros vão cortar a produção em 9,7 milhões de barris por dia para tentar frear a desvalorização da commodity
Foram quatro dias de negociação para que os integrantes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados, a Opep+, enfim, chegassem a um acordo. No domingo 12, as nações optaram por cortar 9,7 milhões de barris de petróleo por dia (bpd) em maio e junho. O intuito, com a redução da produção, é impulsionar o valor do combustível, que declinou mais de 60% desde janeiro diante do excesso de oferta e dos efeitos causados pela disseminação do novo coronavírus (Covid-19) pelo mundo.
O impasse que causa a derrocada dos preços se estendia desde março, quando a Arábia Saudita e a Rússia iniciaram uma guerra pelo preço da commodity, encaminha-se para o seu desfecho. Nesta segunda-feira, 13, o petróleo Brent, referência no mercado internacional, é negociado na base dos 32 dólares. No início do ano, o barril era negociado na casa de 60 dólares. Já o preço de referência do barril WTI, que é retirado de poços do Texas, recuou de 60 dólares para um patamar próximo a 22 dólares no mesmo período analisado.
O acordo da Opep+ foi comemorado, a princípio, já que a derrocada nos preços do barril do petróleo impactou o orçamento de diversos países que dependem da produção da commodity. Os Estados Unidos, a propósito, é um dos maiores interessados na estabilização do valor do combustível, tendo sua indústria de “shale” como maior afetada pelo preço baixo devido a seus maiores custos. Não demorou, porém, para que especialistas vissem a medida como paliativa, cuja função principal – a estabilização da demanda e do preço – pode não ser alcançada.
“Nos últimos anos, a demanda já estava crescendo menos do que a oferta do mercado. Agora, com a pandemia, houve uma queda brutal da demanda, ainda maior. Então, eu acredito que esses cortes sejam apenas um ajuste à demanda atual. Nada mais que isso”, diz David Zylbersztajn, professor da PUC Rio e ex-diretor geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Nesta segunda-feira, 13, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, opinou em sua conta pessoal no Twitter a decisão da Opep+. “Tendo feito parte das negociações, posso dizer que a Opep+ pretende reduzir a produção em 20 milhões de barris por dia, não os 10 milhões que estão sendo divulgados. Se algo assim acontecer, e o mundo voltar ao patamar de negócios predecessor ao desastre da Covid-19, a indústria de energia irá se fortalecer antes até que o previsto”, disse. Segundo Zylbersztajn, a esperança de Trump é que os preços do barril de petróleo subam para que, assim, ele possa elevar mais a oferta. “Mas se não tiver uma retomada na demanda, isso não adiantará em nada”, afirma.
A decisão, num primeiro momento, influenciou positivamente a cotação do barril de petróleo. Ambos os tipos, Brent e WTI, registravam altas. Mas, o clima mudou quando a Saudi Aramco, a petrolífera saudita, decidiu realizar mais um corte drástico no valor da commodity para clientes de países asiáticos, do Mediterrâneo e para o noroeste europeu. Por outro lado, a empresa elevou as tarifas sobre importações de petróleo por parte dos Estados Unidos, acirrando os ânimos novamente. Zylbersztajn classifica a ação dos sauditas como “jogo de cena”. “Os Estados Unidos não são mais tão dependentes da Arábia Saudita como eram antigamente. Hoje, eles são autossuficientes. E se eles, de fato, aumentarem o preço para os americanos, os EUA vão comprar de outros países”, diz.
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Clique e AssineBlefe ou não, o noticiário impactou diretamente o desempenho do combustível no mercado financeiro. O que era uma alta acentuada tornou-se viés de baixa. “O mercado está muito nervoso. A princípio, o corte anunciado fez o valor da commodity disparar 8%. Mas depois isso virou uma queda com especialistas avaliando que o corte anunciado foi insuficiente para compensar a queda da demanda”, diz Pablo Spyer, diretor de operações da corretora Mirae Asset. Neste momento, no entanto, tanto o preço do petróleo WTI quanto a cotação do Brent registram leves altas.
Em relatório, Edward Moya, analista de mercado da OANDA, diz que os preços do petróleo devem permanecer “pesados” no curto prazo, mas algo pode mudar rapidamente caso a economia se reaqueça na Europa e nos Estados Unidos em junho. “Por enquanto, as perspectivas de demanda permanecem sombrias, mas esses cortes de produção podem apoiar o argumento de que os mercados de energia poderão ter um estoque implícito empatado na segunda metade do ano”, afirma. Ainda restam dúvidas da eficácia do acordo, pois a Arábia Saudita já dá sinais de que pode fugir dos números estipulados pela Opep+. Sabe-se, porém, que tanto os sauditas como os russos ainda não estão malucos a ponto de produzir o combustível em demasia sem ter para quem vendê-lo. A princípio, o acordo global será apenas um band-aid temporário para estancar as perdas deste mercado.