As prioridades de Alckmin no Ministério da Indústria após pacote de carros
Secretário-executivo do MDIC elenca prioridades, como a inclusão de pessoas de baixa renda em programas, e descarta negócios sem compromisso ambiental

Eleito nos braços das classes D e E, quase metade do país, cuja renda familiar equivale a um salário mínimo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou a mirar também a classe média e acelerou programas que beneficiam aqueles que ganham mais de dois salários mínimos, que representam, na prática, a outra metade do Brasil. O aceno se dá por meio da ampliação da faixa de financiamento do Minha Casa, Minha Vida, pelo programa de barateamento de veículos, pelo Desenrola, ferramenta de renegociação de dívidas que promete tirar até 70 milhões de pessoas da inadimplência, e pelo aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda.
O pacote econômico dos últimos dias é também um aceno para a indústria, maior geradora de empregos do país, cujo relação com o início do governo foi atrapalhada. O setor reclamava da falta de diálogo, apesar da boa vontade de interlocução do ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin. “O governo como um todo estava fechado e atendendo alguns poucos bancos”, reclama um alto executivo com trânsito no setor.
Apesar dos espólios na classe média, Marcio Elias Rosa, secretário-executivo do MDIC, garante que os programas não são desenhados especificamente para uma ou outra faixa de renda. Em entrevista a VEJA, ele explica porque a prioridade é “incluir o pobre no orçamento” neste primeiro semestre de governo Lula e que a única indústria que não será incentivada é a que “não tem compromisso ambiental”.

Por faixa de renda, a classe média é o setor mais resistente ao governo Lula. O pacote anunciado é uma forma de diminuir essa resistência com o eleitor das classes B e C? O governo não está trabalhando especificamente para a classe média, ele está incluindo nos programas anunciados todas as faixas de renda. A principal decisão é incluir o pobre no Orçamento. E isso foi feito, com aumento real do salário, Desenrola, que atenderá também dívidas de até 5 mil reais, Minha Casa Minha Vida, Farmácia Popular… Todas essas medidas atendem várias faixas de renda.
Como então o governo tem visto essa parcela do eleitorado, já que não há um olhar especial para essa faixa de renda? Mesmo que os programas não sejam destinados especificamente para a classe média, o governo não exclui ninguém. Por exemplo, quando desenhamos o programa de barateamento de carros, a imprensa supunha que seria carro popular e fomos com carros de até 120 mil reais. A ideia era atingir até 50% do mercado consumidor. É um governo de união. Estamos tentando fazer isso, mas a obrigação primária é incluir políticas públicas para quem mais precisa do Estado. Essa sempre vai ser a prioridade.
O programa de barateamento de veículos consumiu quase a totalidade do que foi oferecido pelo governo (650 milhões de reais dos 800 milhões de reais disponíveis). Qual a avaliação sobre o programa? O programa não poderia ter sido melhor. Ele consumiu isso tudo e vendemos 20 mil unidades a mais do que um ano atrás, mas essa não é uma política estrutural. É uma medida pontual para superação de uma dificuldade momentânea.
Mesmo assim, montadoras seguem anunciando paralisações. Foi mesmo um sucesso? As montadores anunciaram paralisações porque não há crédito acessível para o consumidor. Com essa taxa de juros e spread bancário é impossível. Não é recomendável contrair financiamento, salvo você tiver boa condição de renda. Não temos crédito e isso dificulta o acesso do consumidor a carro novo. Além disso, o Brasil sofreu nos últimos anos um processo de desindustrialização que dificultou. O próprio Ministério da Indústria foi recriado só agora. O programa que anunciamos não vai resolver problema do setor, não gera produção que se mantenha, mas ajudou a escoar carros que estavam parados nos pátios das montadoras. A boa notícia é que em agosto vem o Rota 2030 e a gente tem expectativa que as montadoras voltem a investir no país, seja no carro elétrico, seja no carro flex, mas respeitando a nossa vocação, que é o etanol. É óbvio que se o mundo impõe eletrificação — e o setor caminha pra isso –, o Brasil tem a opção do etanol. Exigiria até menos investimento e gera descarbonização. A gente só pode descartar a indústria que não tem compromisso com a sustentabilidade ambiental. Isso é um compromisso.
A taxa de juros está dada, apesar da pressão do governo. Como driblar essa situação? Estamos disponibilizando linhas de financiamento mais vantajosas para pequenos e médios empreendedores. Lançamos nos últimos dias um pacote de 106 bilhões de reais para inovação e pesquisa. Também lançamos o “Brasil Mais Produtivo” e a ideia é apoiar a transformação digital das empresas. É um pacote de neo-reindustrialização.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) projeta que a economia brasileira vai crescer 2,1% em relação ao ano passado, mas com alguma resistência na indústria, com crescimento de apenas 0,6% e queda de 0,9% na indústria de transformação. Como mudar esse cenário? A gente acha que o cenário no segundo semestre será um pouco mais desafiador, mas não precisa ser necessariamente negativo. Em janeiro, todos os cenários apontados eram ruins, mas alcançamos no primeiro semestre a maior balança comercial da história, com 166,2 bilhões de reais, e superávit de 45,5 bilhões de reais. Por que o segundo semestre não pode ser também vantajoso? Estamos com perspectiva boa de aprovação da reforma tributária no Senado, arcabouço foi superado, inflação em queda e PIB em alta. O governo vem demonstrando boa capacidade de superação. Cenário é desafiador, mas não é impeditivo. A equipe econômica tem dado mostras da capacidade de superação.