Bancos ganharam, mas não levaram o dinheiro da “Caipirinha” de Tarsila
Massa falida entra na disputa por bens de Salim e Milton Schahin, acusando os dois de cometerem fraudes que levaram à falência das empresas
A “Capirinha”, uma obra de arte da pintora Tarsila do Amaral produzida em 1925, estampou noticiários Brasil afora quando foi arrematada por 57,5 milhões de reais, na semana passada. O valor recorde da venda deu ares de vitória para os bancos que conseguiram convencer a Justiça a levar o quadro a leilão. Os bancos ganharam, mas não levaram. A massa falida do grupo Schahin conseguiu bloquear os recursos com a venda, em um processo que apenas recentemente teve o sigilo judicial levantado. As instituições financeiras acusam os irmãos Schahin de fraudes na administração dos negócios, desvios de dinheiro e corrupção, que culminaram na falência do grupo e um prejuízo de 9 bilhões de reais a credores. Isso significa que a pintura “Caipirinha” foi apenas uma pincelada dessa disputa bilionária que ainda tende a se arrastar por anos.
A massa falida está chegando atrasada na disputa pelos bens dos irmãos Salim e Milton Schahin. Há cinco anos, os bancos estão bloqueando bens dos empresários, por conta de avais que eles concederam, como pessoas físicas, para um empréstimo feito para uma das empresas de petróleo do grupo. Adelmo Silva Emerenciano, advogado da família, defende que os bancos já tomaram todos os recursos que podiam. Mas, a massa falida adota estratégia de pedir que a falência do grupo seja estendida aos dois empresários na pessoa física tem por objetivo investigar desvios de recursos, patrimônio oculto ou qualquer outro valor que possa ser rastreado e que amenize as perdas dos credores.
Para conseguir o que chamam de “desconsideração da personalidade jurídica”, em que os indivíduos passem a responder com bens pessoais, o advogado da massa falida, Henrique Frossler, fez uma série de investigações com base em quebras de sigilo no exterior e identificou possíveis fraudes na venda de empresas do setor elétrico do grupo. Segundo o processo, os Schahin venderam os ativos por cerca de 1,5 bilhão de reais, mas internalizaram o dinheiro no banco Schahin. Em troca, botavam créditos podres nas carteiras das outras empresas do grupo.
Outra operação suspeita foi o próprio empréstimo com os bancos, que ajudaram a financiar o navio Vitoria 10000, um dos símbolos da corrupção levantada na operação Lava Jato. Segundo a investigação dos advogados da massa falida, os irmãos deram um aval de que as empresas Schahin Holding e Schahin Engenharia eram solventes, quando detinham apenas uma carteira de títulos podres. Em outra controvérsia sobre esse empréstimo, os bancos chegaram a ser investigados pela Receita Federal, que, em 2014, apontou indícios de lavagem de dinheiro na operação por conta da forma como o empréstimo foi estruturado começando no Brasil e terminando no exterior. Mas a investigação não trouxe conclusões até hoje. Fontes próximas ao administrador judicial dizem que a massa falida pode entrar agora nesta seara. Isso porque quanto mais gente for responsabilizada, mais fácil se torna para conseguir recuperar dinheiro.
A advogada Vivianne Abilio, sócia do Gustavo Tepedino Advogados, que defende os bancos, diz que não há qualquer acusação contra as instituições no processo e que a própria massa falida afirma que os bancos são tão vítimas quanto qualquer credor. No empréstimo original, eram 13 bancos, entre eles Santander, Itaú, Votorantim e HSBC, que hoje executam a dívida em nome de suas subsidiárias internacionais. A dívida está sendo executada fora da falência porque tinha o aval dos irmãos na pessoa física. Mas os bancos também são credores e fazem parte da massa falida com um montante a receber de cerca de 1 bilhão de reais. Na ordem de pagamento, eles estão no fim da fila. Um dos primeiros da fila é o Fisco com mais de 4 bilhões de reais a receber.
No processo de execução, os bancos agora estão brigando, por meio de um recurso ao Tribunal de Justiça, para tentar recuperar o dinheiro arrecadado com a venda da “Caipirinha”, um quadro que foi descoberto por eles na casa de Salim Schahin. O filho do empresário, Carlos, tentou barrar o leilão na Justiça alegando que a pintura tinha sido vendida a ele. Os bancos levaram anos para mostrar à Justiça que a operação era simulada e por isso o leilão demorou a acontecer. Procurados, os advogados dos irmãos Schahin não se pronunciaram.