O presidente Jair Bolsonaro apresenta, nesta quarta-feira 20, ao Congresso o projeto de reforma da Previdência, considerado vital para o equilíbrio financeiro do país e para sustentar a credibilidade de seu governo após um começo caótico.
O arquiteto dessa reforma é o ministro da Economia, Paulo Guedes, ultraliberal formado na Escola de Chicago, cujo apoio a Bolsonaro rendeu ao capitão do Exército um forte respaldo dos mercados. O presidente advertiu esta semana que, sem um novo regime previdenciário, o Brasil quebrará em 2022 ou 2023.
A apresentação do texto completo do projeto acontece em meio à crise política que resultou na exoneração do ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Gustavo Bebbiano. Nesta terça-feira, VEJA revelou áudios das conversas que anteciparam a demissão.
Bolsonaro entregará o projeto ao Congresso pela manhã e à noite fará um discurso à nação, transmitido pela TV. Os principais sindicatos do país convocaram manifestações contra o projeto, no qual veem o fim da Previdência Social no Brasil.
Em certo momento, Guedes se disse favorável à criação de um sistema de capitalização individual para os novos trabalhadores, mas segundo informações divulgadas pela imprensa, esta medida não fará parte do pacote atual.
No ano de 2018, 9,2% dos 209 milhões de brasileiros tinham mais de 65 anos. Em 2060, serão 25,5%, segundo projeções oficiais.
Ansiedade
Até agora, sabe-se apenas que a idade mínima para se aposentar será de 62 anos para as mulheres e 65 para os homens, com transição de 12 anos.
Guarda-se a quatro chaves a informação sobre quantos anos será necessário trabalhar para se conseguir uma pensão parcial ou total. Um rascunho que vazou falava em fixar este tempo em 40 anos.
“Uma das questões aqui do Brasil é que as pessoas se aposentam muito mais cedo do que em relação à maior parte dos países. Por exemplo, há pessoas com um pouco mais de 50 anos e já aposentadas e isso se agrava mais ainda para algumas categorias que são consideradas especiais, como policiais e professores”, avaliou o economista Marcel Balassiano, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
A perspectiva de um endurecimento das regras de aposentadoria levou muitas pessoas nos últimos anos a pedir aposentadoria antecipada. É o que pensa fazer Silvia Oliveira, de 50 anos, que trabalha com secretária no Rio de Janeiro.
“Eu já contribuí durante 30 anos [o tempo exigido para uma mulher se aposentar], mas não tenho a idade mínima que o governo quer. Então, vou ver se consigo me aposentar porque tenho medo de ter que trabalhar mais 12 anos”, explica.
Outro receio vem do fato de que os maiores esforços recaiam em categorias mais afetadas pelo desemprego, que dificilmente vão poder cumprir com seu tempo de contribuição.
O porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, assegurou na sexta-feira que se trata de “um projeto de amplo espetro, onde todos estarão presentes proporcionando seu esforço” para reduzir os déficits e abrir caminho a “um futuro promissor” para o Brasil.
Primeiro passo para os mercados
Os gastos com regimes de aposentadoria representaram 13,64% do PIB em 2017 e sem correções podem chegar a 23% em 2060.
A tendência marcada pelo envelhecimento foi acentuada pela recessão de 2014-2015 e pelo fraco crescimento: o déficit das aposentadorias (setor público e privado), que representava 2,1% do PIB em 2011, chegou a 4,25% em 2018.
Guedes antecipou que pretende economizar pelo menos um trilhão de reais em uma década.
A consultoria britânica Capital Economics destacou que os indícios apontam para uma reforma “ambiciosa que (…) estabilizaria a relação dívida pública-PIB” em torno de seu nível atual, próximo de 80%.
Mas advertiu que “historicamente” este tema gerou muita rejeição no Congresso e que existe o risco de o esforço por levar adiante a reforma sacie o apetite de acometer outros desafios que devolvam o país ao crescimento.
Vento a favor
Bolsonaro dispõe a princípio de uma maioria constituída pelas bancadas de vários partidos para aprovar essa reforma constitucional, que requer maioria de três quintos tanto na Câmara dos Deputados (308 de um total de 513) quanto no Senado (49 de 61).
O vice-presidente, Hamilton Mourão, disse na terça-feira que o governo tem até agora 250 votos na Câmara e que serão necessários 60 ou 70 para aprovar a proposta.
Mas o impulso com que Bolsonaro chegou ao poder em 1º de janeiro foi afetado por desavenças e denúncias de corrupção, que terminaram com a exoneração na segunda-feira de Gustavo Bebianno, ministro da Secretaria-Geral da Presidência.
E os brasileiros ainda têm fresco na memória que a reforma impulsionada pelo ex-presidente Michel Temer (2016-2018) acabou em fiasco quando sua maioria foi fragilizada por denúncias de corrupção contra o mandatário.
(Com AFP)