Carta ao Leitor: Prioridade nacional
Uma nação forte não se constrói sem estar sobre o alicerce firme de uma infraestrutura eficiente e moderna

Considerado um dos maiores presidentes americanos de todos os tempos, Abraham Lincoln (1809-1865) liderou o país no período da Guerra Civil e foi essencial na abolição da escravatura nos Estados Unidos. Sua visão arrojada também se mostrou fundamental no sentido de reforçar o fato inescapável de que a rota para o progresso passa por investimentos em infraestrutura. “Dê-me boas estradas e eu lhe darei uma nação forte”, pregava. Na história moderna, a China é que segue com maior determinação o ensinamento de Lincoln. No ano passado, o dragão asiático investiu 6,1% do PIB, taxa bem acima da média mundial, na construção de obras variadas, de ferrovias a hidrelétricas. A transformação ocorrida na China, de exemplo de atraso a modelo de progresso, não ocorreu à base de improvisação. Ela é fruto de um planejamento feito de forma detalhada há décadas, com previsão orçamentária e objetivos claros.
O Brasil, com suas estradas esburacadas, portos congestionados e malha ferroviária estacionada no tempo, entre outros problemas, vai ficando cada vez mais para trás ao não fazer sua lição de casa nessa área. Em 2024, o país investiu 2,3% do PIB em infraestrutura — ou seja, somente um pouco mais de um terço do que o montante gasto pela China. Outro drama são as obras paradas, por motivos diversos, em um total de 12 000, segundo dados do Tribunal de Contas da União. A necessidade de mudar urgentemente esse cenário foi um dos tópicos abordados por autoridades, empresários e especialistas no VEJA Fórum Infraestrutura, realizado em São Paulo no último dia 18.
Há um consenso de que o melhor caminho passa por mais estímulos à participação da iniciativa privada, com maior oferta de oportunidades e segurança jurídica. Os governadores Tarcísio de Freitas, de São Paulo, e Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, ambos presentes no evento, estão entre os gestores que vêm tirando vários projetos importantes do papel via parcerias entre o poder público e as empresas. Na abertura do fórum, o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, defendeu que o tema infraestrutura seja tratado no país de forma técnica, longe das disputas entre esquerda e direita. “A gente está cansado desse divisionismo, dessa disputa permanente entre nós e eles”, disse.
São bastante oportunas essas palavras. Como mostra reportagem da edição, o mesmo sentimento de cansaço é cada vez mais evidente entre a população, farta das discussões estéreis que só dizem respeito a interesses imediatos de determinados grupos. Temáticas fundamentais como educação, saúde e segurança pública ficam de fora da pauta ou são abordadas de maneira superficial em debates no Congresso Nacional. São justamente as áreas em que a nação acumula atrasos históricos e problemas urgentes. A mudança só virá com planejamento e construção de boas políticas de longo prazo. O investimento necessário para termos boas estradas, bons portos e boas ferrovias também depende dessa visão. A China é a comprovação de que uma nação forte não se constrói sem estar sobre o alicerce firme de uma infraestrutura eficiente e moderna.
Publicado em VEJA de 22 de agosto de 2025, edição nº 2958