O forte avanço do PIX, o meio de pagamento instantâneo criado pelo Banco Central, é o exemplo mais eloquente das mudanças vistas nos meios de pagamento, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. Algumas formas, como o dinheiro em espécie e os cartões de débito, sentem as transformações com mais intensidade. Enquanto isso, outras se reinventam, como os cartões de crédito, que estabeleceram uma verdadeira simbiose com as carteiras digitais.
É o que mostra o Global Payments Report 2024, pesquisa anual que chega à nona edição e é realizada pela Worldpay, empresa especializada em meios de pagamento e que opera em 146 países, processando transações em 135 moedas. Segundo o relatório, as carteiras digitais responderam por metade das transações do comércio eletrônico no ano passado, o equivalente a 3,1 trilhões de dólares. Até 2027, essa fatia deve subir para 61%, alcançando 5,4 trilhões. Em contrapartida, os cartões de crédito, que ocuparam o segundo lugar no e-commerce em 2023, com uma participação de 22%, devem recuar para 15% no mesmo período. Já a fatia dos cartões de débito cairá de 12% para 8%.
O mesmo movimento será visto nos pagamentos realizados em lojas físicas, segundo a Worldpay, onde as carteiras digitais ganharão 16 pontos percentuais de mercado até 2027, somando 46%. Com isso, o total de pagamentos deve subir de 10,8 trilhões no ano passado, para 19,6 trilhões. Assim como no mundo virtual, o avanço no mundo real retirará espaço dos cartões de crédito, que perderão 5 pontos de participação, para 22%, e do débito, que encolherá de 23% para 18%. “Os meios que oferecem maior rapidez, segurança e comodidade são os que crescerão mais rápido, como as carteiras digitais”, diz Thiago Medeiros, diretor de novos negócios na Worldpay Brasil.
Mas ainda é cedo para decretar a morte dos cartões de crédito. Eles serão menos vistos nos balcões das lojas e nos sites de comércio eletrônico, mas desempenharão um papel importante no crescimento das carteiras digitais. “São duas formas de pagamento muito conectadas”, diz Medeiros. A pesquisa da Worldpay mostra que em países como a Austrália, os cartões de crédito são a forma de pagamento cadastrada em 47% das carteiras digitais. No Reino Unido, essa fatia chega a 50%. As projeções indicam que a fatia dos cartões de crédito no varejo físico permanecerá estável, ao redor de 80%, nos próximos três anos, quando se somam os pagamentos feitos com plásticos e os embutidos em carteiras digitais.
“A grande mudança será a migração do cartão de crédito físico para o cartão digitalizado”, afirma Medeiros. “Ele sairá do bolso de trás da calça, da nossa carteira, para o bolso da frente, dentro do celular”. A resiliência dessa forma de pagamento deve-se, também, a alguns méritos próprios. Um deles é a possibilidade de ser reembolsado por compras indevidas, como nos casos em que o cartão é clonado. Outra são os serviços e benefícios ofertados pelas operadoras de cartões, como programas de fidelidade, acesso a salas vips de aeroportos e descontos na compra de produtos. No Brasil, há mais uma vantagem: a compra parcelada com cartão, uma invenção nacional.
Mesmo o lançamento do PIX parcelado, adiado para o ano que vem pelo Banco Central, não significará, necessariamente, o início do fim para os cartões de crédito. Para Medeiros, primeiro é preciso entender como essa modalidade de pagamento funcionará na prática. Entre os pontos que determinarão se o serviço cairá no gosto dos brasileiros, estão a imposição ou não de um limite de parcelas, as taxas de juros cobradas na operação e o formato do crédito concedido, que pode ir de uma linha pré-aprovada a algo mais burocrático. “Ainda é cedo para saber se o PIX parcelado será um sucesso”, diz o executivo. Até lá, a aliança com as carteiras digitais garantirá o sossego dos cartões de crédito.