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‘Com estudo e trabalho, tudo é possível’

O empresário Fabio Camara foi expulso de casa pela mãe, sofreu um golpe do pai e hoje fatura milhões de reais

Por Pedro Gil Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 26 abr 2025, 08h00

Sou um brasileiro típico. Sobrevivente, como tantos no nosso país. Venho de uma mãe desesperada para mudar sua situação de pobreza. Meu pai era filho de militares em plena ditadura. Isso significa dizer que, enquanto ninguém tinha nada, ele já possuía um Fusca. Eles se encontraram e saíram uma única vez — e eis que estou aqui. Logo meu pai desapareceu. Fiquei apenas com minha mãe. Morei até os 12 anos num barraco em Madureira, bairro pobre da Zona Norte do Rio de Janeiro. Muitas vezes, não tinha o que comer.

Eu sempre tentei mudar a minha situação. Vendia cacareco na escola, fazia bicos e com isso gerava dinheiro para me alimentar. Nossa vida melhorou quando minha mãe, cabeleireira, casou novamente. Mas o marido morreu cedo. O nosso padrão de vida caiu novamente. Aos 17, ela me expulsou de casa. Achava que eu era um peso, ou seja, representava muito gasto. Fiquei literalmente sem chão. Dormi em casa de amigos, até decidir me alistar no Exército. Só queria ter um teto. Passei quatro anos lá. Como não tinha família, assumia os plantões dos colegas. Assim fiz um pouco de dinheiro.

Quando saí do quartel, quis conhecer meu pai. Descobri que ele estava em Salvador. Fui para lá e ficamos juntos um tempo. Na Bahia, meu pai tinha empresas de confecção. Inexperiente, cheguei a Salvador com o nome limpo, com alguma reserva financeira. Ele abriu três empresas no meu nome. Achei que isso era normal. Ele passava cheques à vontade. Em dois anos, o negócio desmoronou. Quando me olhei no espelho, eu devia, em dinheiro de hoje, mais de 1 milhão de reais — e ganhava um salário mínimo. A dívida era impagável. Tive de fugir dos cobradores. Até colocaram arma na minha cara. Passei um tempo escondido na Ilha de Itaparica, vivendo das sobras de pescadores. Depois, voltei para Salvador e casei com a minha primeira mulher. Ela me incentivou a estudar. Passei a me dedicar a isso, pois sabia que seria a única forma de cruzar o abismo em que eu me encontrava.

Comecei a estudar uma linguagem pouco popular na época, chamada Delphi. Ninguém botava fé, até Bill Gates lançar o Windows 95 baseado justamente em Delphi. Dei muita sorte. De repente, comecei a ser chamado para trabalhos. Lancei livros e limpei meu nome após dez anos. Salvador ficou pequena para mim. Acabei me separando e fui para São Paulo, onde fiz curso atrás de curso. Em determinado momento, fui o terceiro profissional mais certificado do mundo em cursos da Microsoft, com 86 certificações. Virei uma espécie de consultor da empresa no Brasil e abri o CNPJ da FCamara.

Nessa altura, eu já tinha casado novamente e tive meu primeiro filho. Me afastei da Microsoft no dia em que minha mulher anunciou sua segunda gravidez. O garoto é autista e o tratamento é muito caro. Como eu já tinha aberto a FCamara, resolvi apostar tudo no empreendedorismo. Precisava sair do lugar-comum. Em 2008, o e-commerce era novidade. Comecei a bater na porta de grandes varejistas oferecendo organização de produtos e sistemas de recuperação de compras. Deu certo. Um projeto para o Submarino Viagens foi meu primeiro trabalho, mas o grande salto ocorreu quando o Walmart me chamou. Em 2010, a FCamara faturou 10 milhões de reais. Hoje, a receita é de 480 milhões de reais.

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Quando meu pai soube que eu estava prosperando, ele entrou na Justiça contra mim pedindo pensão após quinze anos sem fazer nenhum contato. Paguei duas parcelas da pensão, mas ele morreu. Hoje, sustento minha mãe, que tem esquizofrenia. Ajudo com gosto. Minha mãe foi uma sobrevivente, enquanto meu pai foi mal-intencionado. A FCamara é o que mais me realiza. Sou a prova viva de que, estudando e trabalhando muito, tudo passa a ser possível. Ainda tenho mais um sonho: quero virar professor universitário quando tiver 75 anos. Vou parar de fazer e começar a contar o que eu fiz.

Fabio Camara em depoimento a Pedro Gil

Publicado em VEJA de 25 de abril de 2025, edição nº 2941

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