O consumo das famílias encerrou o ano confirmando sua vocação para ser o principal motor da economia brasileira em 2019. As vendas para o Natal superaram com folga os resultados do mesmo período de 2017, um resultado positivo se for considerado que as promoções para a Black Friday, na segunda quinzena de novembro, já haviam atraído os consumidores. O mercado de trabalho, por sua vez, continua em sua trajetória de recuperação gradual, enquanto o nível de confiança dos brasileiros atinge o maior patamar em duas décadas. Tudo isso posto, Jair Bolsonaro assume a Presidência em 1º de janeiro com o país encaminhado para alcançar o maior crescimento econômico em cinco anos, de 2,5% (na média das projeções de mercado). Caberá a ele e ao seu ministro da Economia, Paulo Guedes, aproveitar a lua de mel que se inicia e atender às expectativas favoráveis não só dos consumidores, mas de empresários e investidores.
Corredores de shoppings e as principais ruas do comércio tiveram dias cheios como não acontecia havia pelo menos quatro anos. O movimento das pessoas se refletiu nos indicadores consolidados do varejo. Nos shoppings, as vendas para o Natal cresceram 5,5% em receita (sem descontar a inflação), superando 53 bilhões de reais. Os dados foram apurados pela Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop) com cerca de 400 empresas varejistas, que possuem, somadas, 30 000 pontos de venda em todo o país. “Estamos muito confiantes no desempenho da economia em 2019”, disse Nabil Sahyoun, presidente da Alshop, ao analisar o resultado do Natal. Segundo ele, apesar de fatores relevantes que afetaram negativamente o comércio nos últimos meses, como a greve dos caminhoneiros, a Copa do Mundo e a incerteza eleitoral, o comércio deve encerrar 2018 com uma expansão da ordem de 6% em relação a 2017. As vendas pela internet, também para o Natal, tiveram um resultado ainda mais expressivo: totalizaram 9,9 bilhões de reais, uma alta de 13,5% em comparação ao mesmo período do ano anterior, segundo a consultoria Ebit. O aumento se deu tanto em número de operações como no valor médio desembolsado pelos brasileiros em cada compra. O varejo como um todo acumulou um crescimento de 5,3% em volume de janeiro a outubro, aproximando-se de níveis não vistos desde 2014. Os dados positivos refletem uma evolução rara da percepção da população. Dois em cada três brasileiros (65% dos entrevistados) acreditam que a economia vai melhorar nos próximos meses, de acordo com pesquisa recém-divulgada pelo Datafolha, com 2 077 entrevistados em 130 municípios. É o maior índice de otimismo da série histórica, iniciada em 1997. Em proporção semelhante (67%), eles avaliam que a própria situação também vai melhorar. Quatro meses atrás, os brasileiros expressavam muitas incertezas sobre o país: apenas 23% achavam que a economia iria melhorar.
O consumo das famílias foi o principal fator de impulsão da economia brasileira entre 2003 e 2013. A forte expansão do mercado de trabalho, o controle da inflação e a melhoria das condições de crédito serviram como alicerce para um boom do consumo puxado pela classe média. Mas o fenômeno perdeu força a partir de 2014, por causa do endividamento excessivo e da inadimplência dos consumidores e do encarecimento de produtos e serviços, seguido pelo aumento das taxas de juros. As medidas da então presidente Dilma Rousseff de interferência do Estado na economia minaram a confiança de empresários e consumidores. O desemprego foi uma consequência natural desse círculo vicioso. Somente em 2018 é que foram criadas, de forma consistente, as condições para que ocorra um novo ciclo de alta do consumo, tais como a queda do endividamento, da inflação e dos juros. A recuperação do emprego é o próximo passo. Na pesquisa do Datafolha, quase a metade dos brasileiros (47%) disse acreditar na melhora do mercado de trabalho, igualmente um índice inédito. Mas, para que o otimismo não seja em vão, será fundamental que o próximo governo consiga entregar resultados concretos. A lista de medidas urgentes e necessárias é extensa, a começar pela reforma da Previdência, para que o Estado volte a ter condições de investir. O tempo começa a contar na posse, na próxima terça-feira.
Publicado em VEJA de 2 de janeiro de 2019, edição nº 2615