No período entre as eleições municipais de novembro e a escolha do sucessor de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP) nas presidências da Câmara e do Senado, em fevereiro, abriu-se uma janela para o Ministério da Economia avançar em seus projetos no Parlamento. Mas, como acontece há alguns meses, a energia do ministro Paulo Guedes, que deveria ser concentrada nas grandes reformas, acaba direcionada a evitar riscos à economia — não por responsabilidade dele, mas pelas necessidades. Na segunda-feira 7, circulou a informação de que o Senado havia incluído no relatório que combina as propostas de emenda constitucional (PEC) do Pacto Federativo e Emergencial a possibilidade de liberar algumas despesas do respeito ao teto de gastos. Imediatamente, o Ibovespa, que subia, passou a cair. O Ministério da Economia divulgou nota afirmando ser contra “qualquer proposta que trate da flexibilização do teto de gastos, mesmo que temporária”.
No dia seguinte, saiu um texto preliminar das PECs sem essa ameaça às contas públicas e também sem o Renda Cidadã, programa que promete substituir o auxílio emergencial. Foram duas vitórias para o ministro da Economia, ainda que tímidas. Mas o fato de o texto das PECs estar num estágio preliminar e não formal mostra que acabará votado apenas em 2021, assim como a complexa reforma tributária. Ou seja: o Brasil continua a perder tempo. “Quando a padaria está fechada, não adianta sair para comprar pão”, explica um auxiliar do ministro (por padaria, entenda-se o Congresso Nacional). Se, por um lado, as grandes reformas parecem travadas, por outro, avançaram nos últimos dias reformas menores, como a Lei de Falências, a nova lei que incentiva a navegação entre portos nacionais e o marco legal do empreendedorismo, que facilita a renegociação de dívidas.
Agora, Guedes ainda espera que um último entrave seja tirado da frente para que então possa avaliar o saldo do fim do ano. Matéria fundamental para que o ano se inicie, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que define o Orçamento para 2021, virou uma pedra no sapato. Ela foi apresentada em abril, mas não foi votada até agora, por causa da disputa em torno da sucessão de Maia. Sem aprovação, o governo começaria janeiro com restrições para gastos, sejam eles com salários, aposentadorias ou programas sociais. O natural seria discutir a LDO numa Comissão Mista de Orçamento (CMO), que acabou nem sendo formada — e agora não há mais tempo para isso. “Não discutir Orçamento significa não ter responsabilidade pelas famílias prejudicadas pela pandemia”, diz a deputada Flávia Arruda (PL-DF), que foi candidata à presidência da CMO. “Se não aprovarmos a LDO, não tem como votar mais nada em janeiro.”
A expectativa é que os congressistas deem uma resolução de emergência à situação na próxima semana, até como forma de proteção a críticas. Deputados admitem que, sem a votação, Bolsonaro poderá imputar ao Congresso a responsabilidade de travar o país, mesmo que o presidente tenha se empenhado pouco pelas reformas.“Dar vazão à agenda no ano que vem depende muito de uma atitude positiva do Executivo, mas ele não parece ter interesse genuíno nisso”, diz Antonio Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda. Com apenas duas semanas até o fim do ano, o saldo de 2020 será pífio. Que 2021 traga as reformas de que o Brasil precisa.
Publicado em VEJA de 16 de dezembro de 2020, edição nº 2717