“Não é daquele outro país, não. Tá ok, pessoal?”, disse o presidente Jair Bolsonaro numa das suas lives de quinta enaltecendo o consórcio da vacina da Covid-19 em parceria com a Universidade de Oxford e a farmacêutica AstraZeneca. O outro país, no caso, é a China e a empresa, a chinesa Sinovac, que em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo, também estuda uma vacina. Dias depois, Bolsonaro assinou a Medida Provisória que libera quase 2 bilhões de reais para que a Fiocruz pague a AstraZeneca pela transferência tecnológica. Nenhuma menção à vacina chinesa. Mas a bancada paulista de deputados federais já começou a se mexer para alterar a Medida Provisória e assim abrir a possibilidade de que parte do dinheiro seja transferido para o pagamento da vacina que será produzida pelo Instituto Butantã.
Já são três emendas na MP, inseridas pelos deputados Vinícius Poit (Novo) e Arnaldo Jardim (Cidadania). A politização em torno da vacina tem tornado difícil até mesmo o fechamento de parcerias privadas pelo Instituto Butantan. Uma fonte do governo de São Paulo, que está a par das negociações em torno da vacina, disse que muitas empresas estão reticentes em doar recursos para a ampliação da fábrica do Butantan, como aconteceu com a fábrica da Fiocruz, no Rio. Eles não querem desagradar o presidente. “Alguns que doaram não querem nem botar o nome na placa”, disse a fonte.
Mas o governo federal não poderá ignorar a vacina da Sinovac, já que o processo natural é que se sua eficácia for comprovada, ela seja distribuída pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Sem contar que as vacinas podem ser eficazes em determinados grupos e não em outros, então é possível haver até mesmo haver sinergia entre a vacina da Sinovac e da AstraZeneca com a Oxford para imunizar a população. Além disso, o Instituto Butantã já anunciou que começará a receber as primeiras doses prontas da China, em outubro, antes, portanto, da vacina de Oxford. Serão 15 milhões de doses já prontas para serem usadas e o material para a produção de outras 40 milhões de doses serão entregues nos meses seguintes. Depois disso, o Instituto receberá a transferência de tecnologia para poder produzir mais vacinas e, por isso, precisa ampliar sua fábrica.
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Clique e AssineSem saber direito como o governo federal poderá tratar do assunto, o estado de São Paulo já tem um plano B para a venda da vacina. Ele pode negociar diretamente com os estados e também já tem conversas com outros países na América do Sul. O acordo com a Sinovac prevê a possibilidade de distribuir a vacina pelo continente.
O secretário de vigilância do Ministério da Saúde, Arnaldo Medeiros, disse a VEJA que o governo está atento a todas as vacinas que estão em desenvolvimento no Brasil. “Tanto que estou indo conversar com Butantan, com agenda em São Paulo, para avaliarmos em que estágio está e qual previsão de entrega e compra e produção”. O secretário passará toda a manhã desta quinta em visita técnica ao instituto, em São Paulo. Mas nitidamente a questão ideológica ainda deixa dúvidas no próprio secretário.
A AstraZeneca fornecerá 30 milhões de doses já prontas ao Brasil. Mas ao ser questionado sobre se o Brasil receberia sem problemas vacinas da AstraZeneca se vierem da China, já que a farmacêutica fechou acordo para fazer parte da sua produção em uma fábrica chinesa, Medeiros ficou ligeiramente confuso. “Não sei. Acho que não. Em princípio. Pelo óbvio que não. Não sei te falar isso. Acho que não. Pelo óbvio que não. Embora a tecnologia seja em consórcio de Oxford com a AstraZeneca.”