Economistas repercutem a alta da Selic: ‘Decisão esperada’
Ajuste monetário de 0,50 p.p. já era aguardado pelo mercado financeiro, que ainda espera o anúncio do pacote de corte de gastos prometido pelo governo
Economistas, gestores e especialistas destacaram que a decisão unânime pela alta de 0,50 p.p. da Selic, anunciada na noite desta quarta-feira, 6, pelo Comitê de Política Monetária (Copom), já era esperada pelo mercado financeiro e que o comunicado enfatiza o peso da questão fiscal na desancoragem das expectativas de inflação.
Marcelo Fonseca, economista-chefe da Reag Investimentos, diz que o ponto mais importante do comunicado é a ênfase dada à influência do fiscal no cenário econômico. “Destaque ficou por conta da ênfase para os efeitos negativos da política fiscal sobre o cenário de inflação e, portanto, para a política monetária, alertando para a necessidade de medidas estruturais capazes de reverter esse quadro de incertezas”, diz. Ele ressalta que o comunicado deixou em aberto o tamanho do ciclo de ajuste monetário.
“O comunicado deixou em aberto não apenas a extensão do ciclo de aperto, mas também o ritmo de ajuste, o que significa que o comitê está preparado para acelerar o passo novamente caso o cenário para a inflação continue se deteriorando”, afirma.
Cristiane Quartaroli, economista-chefe do Ouribank, afirma que o comunicado cita a necessidade de cautela dos mercados emergentes com o ambiente externo desafiador em relação à evolução da inflação e do mercado de trabalho das economias maduras, sobretudo a dos Estados Unidos. “Sobre o cenário local, o Banco Central avaliou que os riscos para a inflação futura são altistas e as projeções de inflação acima da meta contribuíram para a decisão.”
A economista também enfatiza a falta de guidance. “Não deu nenhuma pista sobre os próximos passos, mas afirmou que vai continuar avaliando os indicadores mais sensíveis, principalmente inflação, mercado de trabalho e fiscal”, afirma. Segundo ela, a alta da Selic deve ser positiva para o câmbio, “embora já esteja praticamente precificado pelo mercado, principalmente em um cenário em que o Fed deve baixar os juros na decisão desta quinta-feira”.
Marcelo Bolzan, estrategista de investimentos e sócio da The Hill Capital, afirma que a decisão unânime pela alta dos juros é vista com bons olhos pelo mercado financeiro, que já esperava que a Selic subisse 0,50 p.p nessa reunião. Ele considerou o tom da ata neutro e o comunicado parecido com o anterior.
“O comitê sinalizou um cenário mais desafiador, tanto externo quanto interno. Fica claro que, entre os motivos para o cenário desafiador atual, temos a atividade econômica resiliente, o mercado de trabalho robusto, a inflação dos últimos 12 meses, que já roda acima do teto da meta, e expectativas de inflação desancorando. Além disso, persistem dúvidas sobre a questão fiscal e o corte de gastos do governo junto a um cenário externo mais desafiador para emergentes”, afirma.
Sobre a reação do mercado, ele acha que o fato de a decisão ser esperada não deve mudar muito o humor dos investidores, que ainda esperam pelo anúncio do pacote fiscal. “Acredito que um eventual anúncio de um pacote de gastos com mais detalhes pelo governo, aí possa, sim, fazer um preço muito maior. Então, eu acredito que isso não será um gatilho para a bolsa nesta quinta-feira.”
Lucas Sigu Souza, sócio-fundador da Ciano Investimentos, diz que o Copom agiu adequadamente elevando os juros em 0,50 p.p. para tentar manter a inflação abaixo do teto da meta. “É claro que uma economia mais pujante, de taxa mais baixa, seria ótimo para os nossos negócios, mas em um país assombrado pelo fantasma da inflação desde sempre é prudente um arrocho. E acreditamos que o Copom continuará nessa linha enquanto for preciso”, afirma.
Raphael Vieira, co-head de investimentos da Arton Advisors, lembra que “o mercado já precificava esse 0,50 p.p. de aumento e continua pedindo prêmio na curva de juros, preocupado com a dinâmica fiscal do país e dando um recado claro ao governo, de que não há mais espaço para crescimento insustentável dos gastos públicos”.
Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura Investimentos, também destaca que o ajuste veio em linha com o consenso e que Copom deixa a porta aberta para mais cortes de juros. “O trecho em que o Copom afirma que o ritmo e a magnitude dos ajustes futuros da taxa de juros serão ditados pelo compromisso com a convergência da inflação à meta e, levando em consideração que a desancoragem das expectativas tem aumentado recentemente, deixa em aberto a possibilidade de uma aceleração para 0,75% à frente, apesar de não acreditarmos ser provável”, diz. “A projeção da Nova Futura Investimentos é de taxa Selic em 11,75% em dezembro de 2024 e em dezembro de 2025, mas acreditamos que ela deve atingir 12,50% até março de 2025.”
Claudio Pires, sócio-diretor da MAG Investimentos, ressalta que a decisão veio em linha com o que o mercado esperava e destaca alguns pontos que chamam atenção no comunicado do comitê. “A projeção para o horizonte relevante da política monetária, que na última reunião estava em 3,5% e o mercado esperava diminuir para 3,4%, superou as projeções e alcançou 3,6%. Outro ponto que chama bastante atenção no duro comunicado expedido pelo BC é a cobrança de celeridade ao governo na apresentação e execução de medidas estruturais para o orçamento fiscal, pois sozinha a instituição não conseguirá cumprir a meta que está sobre o Orçamento. Para o atingimento das metas é preciso que política fiscal e monetária caminhem em sintonia. Não adianta uma política monetária ultracontracionista com uma fiscal ultraexpansionista, pois a meta não será alcançada e provocaremos desequilíbrios macroeconômicos relevantes”, diz.