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Emílio deixa a Odebrecht após vinte anos

Pela primeira vez, presidência do conselho do grupo será ocupada por alguém de fora da família

Por Estadão Conteúdo
Atualizado em 27 abr 2018, 17h18 - Publicado em 27 abr 2018, 10h15

Quando chegar nesta sexta-feira 27 à Avenida Paralela em Salvador, onde fica o escritório da Odebrecht na capital baiana, o empresário Emílio Alves Odebrecht iniciará uma mudança histórica no conglomerado fundado na mesma cidade em 1944 por seu pai, Norberto. Após vinte anos à frente do conselho de administração de um dos maiores grupos empresariais do País, Emílio comandará pela última vez uma reunião ordinária do colegiado. A presidência do conselho deixará as mãos da família Odebrecht pela primeira vez.

A saída de Emílio já estava prevista em seu acordo de delação premiada. Mas ele poderia arrastar sua permanência no grupo ainda por bastante tempo sem infringi-lo – a delação permitia que ele ficasse por dois anos na Odebrecht.

A surpresa veio, portanto, da decisão do empresário de antecipar o movimento. Foi uma forma de tentar convencer o mercado das boas intenções do grupo para superar a Operação Lava Jato, que colocou a empresa no centro de um dos maiores escândalos de corrupção no mundo.

A despedida de Emílio teve início nessa quinta-feira, 26, num jantar em seu apartamento, no bairro Caminho das Árvores, em Salvador. Ali, num edifício onde moram vários membros da família, o empresário recebeu os atuais conselheiros e alguns executivos do grupo. Fontes ligadas à companhia preocuparam-se em justificar, mesmo sob reserva, o encontro. Segundo pessoas próximas a Emílio, que começou a trabalhar no grupo em 1968, a intenção do empresário não foi festejar, mas agradecer aos integrantes do conselho pelo trabalho feito.

O momento não é dos mais propícios a celebrações. Na quarta-feira, a construtora do grupo deixou de pagar 500 milhões de reais em títulos emitidos no exterior. Em razão disso, a agência de classificação de risco Standard & Poor’s cortou na quinta-feira a nota de crédito global da empresa. O conglomerado negocia com bancos novo empréstimo, de até 2,5 bilhões de reais, para cobrir essa e outras dívidas.

Se não conseguir convencê-los a liberar o dinheiro nos próximos dias, a empreiteira corre o risco de ter de recorrer à recuperação extrajudicial para não quebrar, segundo executivos a par dos números. Por causa dessas negociações, Emílio poderá participar de alguma reunião extraordinária para decidir sobre o tema enquanto o novo conselho não é formado.

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Tradição quebrada

A saída de Emílio interrompe uma tradição de décadas na Odebrecht de planejar a sucessão do comando. Antes de substituir o fundador, Norberto Odebrecht, na presidência executiva, em 1991, Emílio ficou quase três anos como vice-presidente.

Em 1998, passou ao comando do conselho de administração, enquanto habilitava Pedro Novis para ocupar seu lugar. O executivo, por sua vez, assumiu a presidência enquanto Marcelo Odebrecht era preparado para ascender ao comando, o que ocorreu em 2008 – delator, Marcelo cumpre prisão domiciliar e está proibido de ter qualquer contato com a empresa.

Forçado pela Lava Jato a dar feição profissional ao conglomerado familiar, Emílio diz agora que deseja criar um “dream team” para o conselho de administração. Esse é o termo que vem sendo usado por executivos do grupo na esperança que o mercado assim passe a chamá-lo.

O novo colegiado terá nove assentos, sendo que seis serão de conselheiros independentes e três indicados pela família (mas sem relação de parentesco com os Odebrecht).

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Alguns nomes estão em negociação avançada. É o caso de João Cox, executivo com passagem pelo conselho da Estácio e atual presidente do colegiado da Tim no Brasil. Ieda Gomes, ex-presidente da Comgás, e a advogada Cláudia Prado também devem compor o grupo.

Apesar das conversas em andamento, até ontem a formação completa dessa equipe não havia sido concluída. O principal nome, que é o presidente do conselho, ainda é uma incerteza. Ex-presidente do grupo e executivo de longa data da Odebrecht, o advogado Newton de Souza não se tornou delator e é o preferido de Emílio para o posto.

Cansaço

A pessoas próximas, Emílio vinha manifestando cansaço e certa impaciência com o desgaste imposto pelo processo de delação. Apesar da grave crise do grupo, o empresário nunca acreditou no fim da companhia. Mas, nos últimos tempos, têm sido frequentes as reclamações sobre o que classifica como “campanha para destruir a empresa”. Emílio acreditava que, após o acordo bilionário firmado pela Odebrecht e a confissão dos crimes cometidos, os benefícios para a empresa apareceriam de forma um pouco mais célere.

Não foi o que aconteceu. Desde que celebrou o acordo, em dezembro de 2016, a Odebrecht perdeu obra atrás de obra. As receitas despencaram enquanto os processos em diferentes países se avolumaram. No Brasil, o grupo ainda tenta acertar as contas com o governo – até hoje não foi possível chegar a combinação com Advocacia-Geral da União (AGU), o Ministério da Transparência (CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU).

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Nem a pena prevista em sua delação Emílio começou a cumprir – por dois anos, ele usará tornozeleira eletrônica e depois cumprirá regime aberto por outros dois anos. Como quase todos os delatores, aguarda a sentença de condenação.

Vida pós-Odebrecht

Quem conhece Emílio aposta que ele se manterá ocupado na vida pós-Odebrecht. Além de supervisionar os interesses no conglomerado – ele seguirá como importante acionista do grupo – não faltam empreitadas paralelas para tocar.

Em sua fazenda na Bahia, comandada por um dos filhos, cria gado da raça nelore e bichos mais exóticos, como paca, cuja carne vende a restaurantes e comércios especializados. Costuma se vangloriar do negócio, dizendo-se o maior criador do animal no país. Também produz cachaça artesanal – produto com que tem o hábito de presentear amigos.

Apesar do escândalo de corrupção, Emílio conseguiu manter sua imagem de pé dentro do grupo. Para muitos, ele segue como uma liderança, mesmo após confessar crimes em sua delação.

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Desde a prisão de Marcelo, em 2015, pai e filho não se falam. Os dois já tinham algumas rusgas antes de a Lava Jato atingir o grupo. O estilo de administrar era muito diferente. De acordo com pessoas próximas, Emílio era mais caloroso e voltado às pessoas – deriva daí a admiração mantida pelos funcionários e a relação próxima com a administração pública. Marcelo era mais fechado, por vezes ríspido, e focado no negócio.

Fora da rotina do conglomerado, Emílio será informado sobre os rumos do negócio por meio do conselho e de homens de sua confiança, caso de Newton de Souza e de Sérgio Foguel, que também deve compor o novo colegiado.

Procurados, João Cox, Ieda Gomes e Claudia Prado não retornaram.

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