Empresas se mobilizam por soluções para prejuízos dos desastres ambientais
Segundo a Confederação Nacional de Municípios, o rombo já supera 45 bilhões de reais em 2024
Entre incêndios e enchentes, o Brasil vive um ano de catástrofes naturais sem precedentes. O rol de tragédias inclui 2,3 milhões de hectares do Pantanal destruídos por queimadas, o equivalente a 16% do bioma — por enquanto. As chamas também atingem a Floresta Amazônica, que enfrenta o segundo ano consecutivo de seca. O enredo contém ainda uma certa ironia: nos últimos dias, as correntes de vento que costumam levar a umidade da Amazônia a todo o país, conhecidas como “rios voadores”, transportaram a fumaça dos incêndios até a região Sul, que ainda se recupera das enchentes recentes. Além das perdas humanas e de biodiversidade, os eventos climáticos extremos calcinam a economia. Segundo a Confederação Nacional de Municípios, o prejuízo causado por desastres naturais já supera 45 bilhões de reais em 2024.
O setor mais prejudicado é o agropecuário. No Rio Grande do Sul, os prejuízos dos produtores rurais com as inundações somam 5,4 bilhões de reais — no total, o estado perdeu mais de 13 bilhões. Em São Paulo, que registrou em agosto o maior número de incêndios de sua história, estima-se que o custo para os agricultores foi de 1 bilhão de reais. “O agro está muito vulnerável porque o clima afeta diretamente a produção”, diz Renata Potenza, coordenadora da Imaflora, uma entidade de conservação ambiental. Outro setor bastante atingido é o das seguradoras, cada vez mais acionadas para cobrir as perdas dos clientes. A crescente dificuldade de prever o tempo é o fator que mais preocupa, já que o preço das apólices depende de uma análise do padrão histórico do clima. “Nossa convicção é de que a mudança climática já aconteceu”, diz Dyogo Oliveira, presidente da Confederação Nacional das Seguradoras. “Nos últimos cinco anos, virou um desafio antever e precificar os riscos climáticos.”
Outros segmentos também tentam se adaptar aos novos tempos, como o varejo de moda, que tem suado para lidar com as temperaturas mais altas. A Confederação Nacional do Comércio estima que o calor fora de época reduzirá em 4% o faturamento da coleção outono-inverno deste ano. O aquecimento global também afeta a produção de outros países. Um estudo recente da universidade americana Cornell avalia que, até 2030, quatro dos maiores produtores mundiais de roupas — Bangladesh, Camboja, Paquistão e Vietnã — deixarão de faturar 65 bilhões de dólares devido à crise atribuída ao clima.
Diante das perdas, as empresas brasileiras começam a se mobilizar. Em agosto, 52 personalidades do mundo dos negócios, entre empresários, grandes executivos e economistas, lançaram o “Pacto Econômico com a Natureza”, que defende o desenvolvimento sustentável. “Podemos gerar renda e empregos e, ao mesmo tempo, preservar as áreas verdes e transformar espaços urbanos”, diz o documento. Entre seus signatários está Walter Schalka, ex-executivo-chefe e atual conselheiro da Suzano, conhecido defensor da agenda ESG (sigla em inglês para boas práticas ambientais, sociais e de governança). Em 2020, Schalka foi um dos líderes de um grupo de empreendedores que cobrou publicamente do então presidente Jair Bolsonaro medidas concretas para combater as queimadas na Amazônia. Na época, o executivo afirmou que o país caminhava para o “precipício ambiental” e cabia às empresas buscarem “ações relevantes” para impedir que caíssemos nele.
Uma das estratégias de adaptação é recorrer à consultoria meteorológica. “As corporações buscam contabilizar os riscos de eventos extremos”, diz Nil Nunes, diretor de operações da Climatempo. Um de seus clientes é a plataforma de entrega de refeições iFood, interessada em prever picos de chuva, pois a demanda cresce nesses dias, enquanto os entregadores enfrentam dificuldades para se locomover. Já para a CCR, também parceira da consultoria, os dados subsidiam sua “estratégia de resiliência climática”, que consiste em mapear os custos financeiros de desastres naturais. “As empresas que não mitigarem as emissões e se adaptarem às mudanças climáticas perderão competitividade”, diz Amanda Schutze, coordenadora executiva do FGV Clima. O esforço de governo, empresas e sociedade para conter o aquecimento global é urgente. O planeta e a economia agradecem.
Publicado em VEJA de 6 de setembro de 2024, edição nº 2909