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Fim do saque-aniversário do FGTS é bom ou ruim para o trabalhador?

Governo estuda acabar com o saque-aniversário, ao mesmo tempo em que edita novas regras para o crédito consignado privado. A troca é boa para quem?

Por Camila Pati Atualizado em 16 out 2024, 09h40 - Publicado em 16 out 2024, 09h28

Responsável por uma injeção de 45 bilhões de reais na economia no ano passado, o saque-aniversário do FGTS pode ser extinto. A perspectiva do governo era enviar um projeto de lei para acabar com o saque aniversário até o fim do do ano. Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que não há pressa, para que nada de errado seja feito, ainda que o governo esteja discutindo essa proposta há meses.

Criado pela Lei 13.932/19,  o saque-aniversário é uma modalidade que oferece ao trabalhador a possibilidade de, todo ano, retirar uma parte do saldo do FGTS no mês de seu aniversário. A adesão é opcional. Quem não opta por ela, permanece no modelo tradicional de Saque-Rescisão, que permite o saque integral do saldo em caso de demissão sem justa causa. Ao aderir, o trabalhador pode sacar anualmente uma parte do saldo. Mas, se for demitido, terá acesso apenas à multa rescisória, sem poder retirar o valor total acumulado no FGTS.  

A partir da existência do saque- aniversário, nasceu um produto que os bancos oferecem que é a antecipação desse crédito, uma opção feita por 22 milhões dos 35 milhões de trabalhadores que aderiram ao saque-aniversário. O cálculo dos 45 bilhões de reais que circularam na economia considera operações de crédito (30 bilhões de reais) e os pagamentos realizados aos trabalhadores que não contrataram a antecipação (15 bilhões de reais).

A proposta do governo é editar novas regras para o crédito consignado no setor privado, como uma forma de apresentar um modelo de crédito que possa substituir o saque- aniversário. 

Sob a ótica das contas públicas, o objetivo do governo, ao extinguir o saque-aniversário, é preservar o saldo do Fundo, cujos recursos da aplicação financiam programas de habitação, obras de saneamento e infraestrutura. “Ao tentar mudar a característica das situações de saque, o governo está pensando em deter saldo maior no FGTS”, diz Flávio Riberi, professor da Fipecafi.

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Entre as medidas de melhoria de operação do crédito consignado, estariam a instalação de um sistema centralizado, operado pela Dataprev, a garantia do FGTS, dispensa de convênios entre bancos e empresas, e a cobrança e distribuição das parcelas dos empréstimos via FGTS Digital e e-Social.

“Somos favoráveis a todas as melhorias que o governo propõe para o crédito consignado privado, vai desburocratizar o processo e permitir que o que o crédito seja ofertado diretamente ao trabalhador, sem necessidade de convênio com a empresa”, diz Alex Sander Moreira Gonçalves, diretor de crédito consignado da Associação Brasileira de Bancos (ABBC). 

Segundo a associação, as medidas de aprimoramento dessa linha de empréstimo têm o potencial de incrementar a atual carteira de 40 bilhões de reais para o patamar dos 200 bilhões de reais, montante próximo ao estoque da modalidade consignado INSS. Em termos de concessões mensais, o volume poderá alcançar o patamar de 10 bilhões de reais/mês, montante muito superior à média mensal de 2024 de 1,6 bilhão de reais.

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A ABBC, no entanto, considera que as melhorias no crédito consignado não deveriam estar atreladas à extinção do saque-aniversário.  “São linhas, na nossa avaliação, que podem perfeitamente coexistir e se complementam”, diz Gonçalves. 

A substituição deixaria  sem acesso a crédito e ao saldo  mais de 80 milhões de pessoas, segundo cálculos com base no número de pessoas com saldo e os trabalhadores que estão, de fato, na ativa. Atualmente, mais de 130 milhões de trabalhadores possuem saldo no FGTS e segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged”, são 47 milhões de trabalhadores registrados. 

“Outro ponto também bem relevante é que o consignado privado depende da política de crédito de cada banco. Enquanto que o saque aniversário, pela sua natureza de ter o FGTS em garantia, ele permite que, mesmo tendo restrição cadastral, o trabalhador consiga fazer esta operação”, diz o diretor da ABBC.

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A associação também rebate o argumento de que a medida vai preservar FGTS com os dados de crescimento do FGTS nos últimos quatro anos.  Mesmo com o aumento do saque aniversário do FGTS ao longo dos anos, o saldo do FGTS cresceu de 424 bilhões de reais em dezembro de 2020 para 615 bilhões de reais em agosto de 2024, representando um crescimento de 45%. Segundo a avaliação da ABBC, esse crescimento mostra que é possível manter o saque aniversário sem comprometer o financiamento de projetos de habitação, saneamento e infraestrutura.

É melhor tomar crédito consignado ou saque-aniversário?

“Quando você olha para o crédito consignado, o banco tem a possibilidade de oferecer uma linha de crédito que vincula diretamente sua renda formal, descontando uma parte do salário”, explica o professor da Fipecafi.  Além disso, o banco pode oferecer a opção de liquidação antecipada, com prazos mais longos de parcelamento. No caso de servidores públicos, o “financiamento via consignado pode ser estendido por até 8 anos, facilitando o acesso a essa linha de crédito”, diz o professor. No entanto, o grande obstáculo é a sobra da renda disponível da população. 

Por isso, o teto de crédito concedido muitas vezes acaba sendo maior do que o valor disponível no saque aniversário do FGTS. Quem opta pelo consignado fica comprometido por um longo período, com o valor do empréstimo sendo consumido pelos juros e diretamente vinculado ao salário.

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O saque-aniversário, quando antecipado pelos bancos, tende a apresentar uma taxa de juros mais baixa por representar menos risco. O perfil do público que opta pela antecipação do saque-aniversário, segundo pesquisa encomendada pela ABBC ao Datafolha, é formado majoritariamente por pessoas que estão com restrições cadastrais, os  “negativados”. “São pessoas que estão com uma conta de luz atrasada, com risco de ser cortada a conta de luz. Estão com aluguel também atrasado, com risco de ser despejado. São pessoas que contraíram dívidas que não estão conseguindo pagar.

E o saque aniversário, pela característica de ser uma taxa baixa de juros, e que empresta para quem está com restrição cadastral, que não compromete a renda mensal do trabalhador, é a linha mais adequada para ser usada na quitação de dívidas atrasadas, segundo a ABBC.

A pesquisa encomendada pela ABBC mostra que 90% dos entrevistados afirmam que não terão outra alternativa de crédito, com taxas tão baratas, se de fato a extinção do saque aniversário acontecer.

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