Criado em 2015, o Fundo Nacional para Repartição de Benefícios (FNRB) ainda patina e está bem longe de alcançar seu pleno potencial de arrecadação. Seu objetivo é compartilhar parte dos ganhos que empresas nacionais e estrangeiras obtêm com a exploração da biodiversidade brasileira com as comunidades que zelam por ela, como os povos indígenas e as comunidades agrícolas tradicionais.
A lei 13.123, que instituiu o FNRB, determina que as empresas destinem 1% da receita líquida gerada por produtos que exploram substâncias extraídas de nossa flora e fauna. Com uma das maiores biodiversidades do planeta, em tese, o fundo teria potencial para arrecadar e distribuir muito dinheiro. Mas, passados nove anos, o saldo do fundo no fim de maio era de apenas 9,3 milhões de reais.
Os especialistas, contudo, calculam que é possível captar muito mais. O banco de investimentos VGRI Partners, por exemplo, estima que apenas duas linhas de produtos – pneus de borracha, cuja base é o látex das seringueiras amazônicas, e medicamentos derivados do veneno da jararaca, como o Captopril, para hipertensão – poderiam arrecadar cerca de 170 milhões de dólares por ano. “Se considerássemos todas as cadeias produtivas enquadradas pelo fundo, o montante seria muito maior”, diz Gustavo Vaz, o sócio-fundador da VGRI.
Em linhas gerais, há três motivos para que o FNRB não decole. O primeiro é o grande número de exceções previstas na lei. Embora o recolhimento de 1% da receita ao fundo seja obrigatório, apenas o último elo da cadeia produtiva deve abastecer o fundo, deixando toda a rede de fornecedores e intermediários de fora. Micro e pequenas empresas também estão excluídas, bem como empresas de alimentos e bebidas e a indústria têxtil. O agronegócio e a indústria de biocombustíveis, idem. Com tantas exceções, apenas 500 produtos estão cadastrados no fundo.
Outro fator da baixa arrecadação é a possibilidade, prevista na lei, de compensações não monetárias pela exploração da biodiversidade, como projetos de educação ambiental, transferência de conhecimento e treinamento profissional. As empresas que optam por esse caminho não estão, necessariamente, com má vontade de pôr a mão no bolso. Como todo fundo público, a gestão dos recursos e sua destinação causam dúvidas nos agentes privados.
“A maioria das empresas prefere alocar recursos onde pode ver um resultado concreto”, diz Francine Leal, uma das fundadoras da GSS Carbono e Bioinovação, consultoria especializada em projetos sustentáveis. “Isso é importante, principalmente para companhias estrangeiras”, completa.
As empresas estrangeiras, aliás, estão na base do terceiro motivo da inanição do FNRB. Criado em 2015, o fundo só se tornou plenamente operacional em 2017, quando sua plataforma de cadastro entrou no ar. O problema é que esta primeira versão apresenta uma série de problemas para o cadastro e a contribuição dos gringos. “O governo não está disponibilizando as ferramentas necessárias para que as empresas cumpram com suas obrigações”, diz Leal.
Além da GSS, Leal também participou da criação da Vbio, plataforma que pretende encontrar apoiadores para projetos de exploração sustentável da biodiversidade nacional, envolvendo empresas e comunidades locais. Até o momento, a plataforma já captou 14 milhões de reais. “O Brasil é um berço de biodiversidade e vejo um grande potencial de crescimento da bioeconomia nos próximos anos”, diz. Cabe ao governo aproveitar essa janela.