Enquanto o general Braga Netto, que comanda a Casa Civil, se reúne com ministros para tentar traçar um plano de retomada econômica que passa por investimentos públicos em infraestrutura, uma espécie de Plano Marshall tupiniquim, o Ministério da Economia caminha em direção oposta e diz que o caminho da reabilitação passa por privatizações. Nesta quarta-feira, 22, quando os estudos da Casa Civil que VEJA teve acesso se tornaram públicos, o secretário de desestatização da Economia, Salim Mattar, reapresentou o plano do governo de passar empresas públicas para o investimento privado, um dos pilares da eleição do presidente Jair Bolsonaro. Com uma apresentação intitulada como “Reconstrução do Estado”, Mattar discorreu sobre o plano já vigente de encolhimento do tamanho do estado para ganho de eficiência, defendido com unhas e dentes por seu chefe, Paulo Guedes. Na visão do Ministério, essa é a única saída para a crise econômica sem o aumento de impostos, já que a dívida pública pode chegar a 90% do PIB brasileiro se a desaceleração brasileira chegar aos 5% devido a crise do coronavírus.
O ponto do Ministério da Economia é político: bater o pé em uma medida liberal enquanto o chamado núcleo duro do governo defende um intervencionismo para a criação de empregos em um cenário de devastação de postos de trabalho pós pandemia. Sem entrar em polêmica, mas deixando clara a visão defendida por Guedes, Mattar afirma que o governo brasileiro não tem dinheiro sobrando e a busca por recursos por parte do Ministério da Economia é correr atrás de dinheiro privado. O projeto gestado pela Casa Civil, com apoio da Infraestrutura e do Desenvolvimento Regional, segundo ele, é algo embrionário, mas em um jogo de morde e assopra, afirma que propostas opostas mostram a “espetacular” face da democracia brasileira, em que o projeto mais oportuno será escolhido. “Ao contrário do que falam, o governo Bolsonaro não é autoritário”.
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Clique e AssinePara tentar defender porque as privatizações e desinvestimentos são melhores que o aumento do gasto público no financiamento de obras, Mattar cita que estatais que foram privatizadas no passado aumentaram o quadro de funcionários. A Vale passou de 10 mil para 70 mil, a Embraer de 9 mil para 18 mil e a CSN de 15 mil para 24 mil. “Privatizar significa aumentar o número de postos de trabalho. A iniciativa privada investe, cresce, aumenta a produtividade e a eficiência dos setores. Com esse crescimento, precisa de mais força de trabalho. O governo não tem mais dinheiro e é preciso usar dinheiro privado, e há muito dinheiro privado no mundo. É possível usar esse dinheiro para investir na nossa infraestrutura”, afirmou o secretário.
Na prática, entretanto, o plano apresentado por Mattar mostra uma pisada no freio no ritmo das privatizações neste ano de pandemia. A pasta acena que não irá cumprir a meta traçada, que é desestatizar 150 bilhões de reais em 2020. Para o segundo semestre deste ano, por exemplo, estavam previstas quatro desestatizações via BNDES, entre elas a da Eletrobras. Agora, estão previstas duas e a Eletrobras passou para o segundo semestre de 2021. Segundo Mattar, a mudança de foco é momentânea e necessária, já que muitos dos projetos precisam passar pelo Congresso Nacional, focado em aprovação de medidas emergenciais para combate a Covid-19. Além disso, o governo não irá vender empresas a preço de banana: não há venda apenas por vender se não houver ninguém disposto a comprar. O recado, porém, é que, passada a crise, os planos liberais de Guedes continuam de pé: a ideia é diminuir ao máximo o tamanho do estado, ressalvando empresas estratégicas como Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Petrobras. Plano totalmente antagônico ao da Casa Civil.
Infraestrutura
O projeto comandado pelo general Braga Netto terá eixos militarescos de “ordem” e “progresso”: uma das formas de retomar o crescimento econômico (ou mitigar os efeitos da epidemia) será o investimento público em obras paradas. Para isso, os ministros desejam contar com pequenas e médias empreiteiras para destravar projetos de infraestrutura, como estradas, viadutos e projetos de saneamento. Assim, contratações de até 1 milhão de trabalhadores podem surgir, segundo os cálculos do Planalto. Na contramão do que sempre defendeu o ministro da Economia, a solução viria do próprio Estado – e de novos parceiros.