Isenção de IR até R$ 5 mil é exagerada em país de renda média como Brasil, diz Bichara
Concentração de toda a arrecadação do IR em parcela pequena da população é pouco ortodoxa

A ampliação da isenção do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) para quem ganha até 5 mil reais mensais promete liberar mais 10 milhões de pessoas do pagamento do tributo. A partir disso, o governo federal afirma que 65% dos contribuintes que hoje fazem declarações ao Imposto de Renda serão isentos. Com isso, apenas cerca de 15 milhões de contribuintes serão responsáveis por toda a arrecadação do IRPF. O tamanho desse contingente em relação à população brasileira, de 203 milhões de habitantes, causa arrepios em alguns especialistas. “Estender o limite de isenção até 5 mil reais mensais é exagerado em um país de renda média como o nosso”, diz o tributarista Luiz Gustavo Bichara, sócio do escritório Bichara Advogados.
Segundo tributarista, o alcance do IRPF passará a ser tão limitado com a mudança proposta pelo governo federal, que não encontra “precedentes em países comparáveis”, no qual pouco mais de 5% da população contribui.
Bichara também chama a atenção para o fato de que a proposta de cobrança de imposto sobre dividendos, incluída no pacote apresentado pelo governo nesta semana, não veio acompanhada de uma redução no Imposto de Renda cobrado sobre pessoas jurídicas — uma antiga promessa do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Até o momento, o Executivo federal propôs manter o IR das empresas no mesmo patamar, somando a ele a cobrança sobre dividendos — o que aumenta o peso da máquina pública sobre o setor produtivo privado. “O governo abandonou de forma ostensiva a promessa repetida há cerca de um ano por Haddad”, diz o advogado.
Para alguns especialistas, a manutenção do tributo sobre as empresas pode gerar outro problema: a bitributação dos dividendos. Atualmente, acionistas que recebem esses proventos são isentos de IRPF. A empresa pagadora, no entanto, é obrigada a recolher o imposto sobre seu lucro. Dessa forma, a proposta de estabelecer uma alíquota mínima de até 10% para os mais ricos pode criar uma cobrança duplicada do Imposto de Renda, já que muitos dos mais abonados recebem rendimentos na forma de dividendos. A empresa continuaria pagando o imposto sobre o lucro ao distribuí-lo, e o indivíduo pagaria novamente ao recebê-lo.
Por mais que o Imposto de Renda passe a incidir sobre uma parcela muito pequena da população, estimada em cerca de 15 milhões de pessoas, há uma diversidade considerável de perfis de renda entre elas. O governo buscou endereçar essa questão com alíquotas diferenciadas por faixas de renda e com a criação de alíquotas mínimas de imposto efetivo para os super-ricos — pessoas que ganham ao menos 600 mil reais por ano.
Ainda assim, Bichara considera que a progressividade do imposto poderia contar com mais segmentações. “Não se pode negar que quem ganha 1,2 milhão de reais por ano está em condições privilegiadíssimas, mas deveríamos diferenciar esse contribuinte daquele cujos rendimentos alcancem 1,2 bilhão de reais ao ano, por exemplo”, diz. Segundo a nova regra, pessoas que ganham ao menos 1,2 milhão de reais por ano pagarão 10% de imposto efetivo mínimo, sem distinção.