Lucros afinados: como as plataformas de streaming começam a sair do vermelho
Elas ampliam receitas com publicidade e mostram ganhos obtidos com a diversificação dos serviços

O streaming revolucionou a maneira de ouvir música nos últimos vinte anos, fazendo com que centenas de milhões de pessoas deixassem de lado seus CDs, discos e pen drives, e deu visibilidade a artistas famosos e iniciantes para além das fronteiras de seus países. Mas só agora essa tecnologia começa a se manter de pé como negócio. O maior exemplo é o Spotify, a principal plataforma de streaming musical do mundo. Desde que foi criada, em 2006, ela sempre operou com prejuízo. Em 2024, pela primeira vez, a empresa deu lucro, e dos bons: 1,14 bilhão de euros, o equivalente a 7,5 bilhões de reais. No ano passado, as receitas em todo o mundo da indústria fonográfica cresceram 4,8%, beirando os 30 bilhões de dólares — e os serviços de streaming responderam por mais da metade desse resultado.
A principal barreira para a lucratividade sempre foram os altos custos de royalties pagos aos detentores dos direitos autorais, consumindo grande parte da receita. E isso apesar das queixas dos artistas, principalmente os menos famosos, de que recebem muito pouco individualmente por vez que sua música é reproduzida. Esse paradoxo afeta todo o setor, a ponto de Spotify, Google (YouTube Music) e Amazon (Amazon Music) terem se unido contra o aumento nas taxas de royalties para compositores nos Estados Unidos.

Enquanto apertam a torneirinha para os artistas e gravadoras, as plataformas de streaming ampliam a receita diversificando os serviços. O modelo do Spotify, emblemático no setor, priorizou o crescimento com uma estratégia freemium (junção de free, grátis, e premium, exclusivo): há o serviço gratuito, com anúncios, e a opção premium, por assinatura, sem publicidade e com recursos extras. Outras grandes plataformas, como Apple Music e YouTube Music, operam de maneira similar. Nos últimos meses, houve um crescimento significativo tanto da venda de publicidade quanto de assinaturas.
Além disso, desde 2019 o Spotify também investiu massivamente em podcasts, áudios com menor custo de streaming e margens potencialmente maiores que a música, entre outras novidades. “No quarto trimestre de 2024, aprimoramos nosso produto em áreas como vídeos e audiolivros, com muitas inovações por vir nos próximos trimestres”, disse Daniel Ek, fundador e presidente do Spotify, ao anunciar os resultados da empresa.
Para os músicos, a conta ainda não fecha. Embora artistas de ponta se beneficiem do volume de execuções, os pequenos e médios enfrentam dificuldades. O que eles recebem por stream (em média, de 0,003 a 0,005 dólar no Spotify) exige milhões de reproduções para gerar alguma renda. Muitos dependem de turnês, produtos, licenciamento ou apoio direto dos fãs. Recentemente, a regra do Spotify que exige no mínimo 1 000 streams em doze meses para gerar royalties teve forte reação dos músicos.
A discussão sobre remuneração justa também envolve os modelos de pagamento. O dominante “pro rata”, que distribui a receita total proporcionalmente às reproduções na plataforma, favorece artistas populares. Outra opção de modelo é o “centrado no usuário”, que direciona a receita das assinaturas especificamente aos artistas ouvidos pelo assinante. O SoundCloud, lar para artistas independentes, implementou um modelo fan-powered royalties (ou seja, rendimentos turbinados pelos fãs), que direciona pagamentos com base no consumo individual do usuário, beneficiando artistas de nicho.
As plataformas menores também tentam se diferenciar pela qualidade. A Tidal se destaca pelo áudio de alta qualidade e foco na remuneração artística. A Deezer também oferece áudio diferenciado, além de maior controle do algoritmo pelo usuário, capacidade para compartilhar música e investimento na remuneração dos artistas. “Nosso foco é música. É isso o que nos diferencia”, disse a VEJA Alexis Lanternier, presidente da Deezer. Grandes ou pequenas, o desafio das plataformas de streaming é serem lucrativas e, ao mesmo tempo, atender às demandas dos artistas. Não é fácil afinar esses interesses.
Publicado em VEJA de 25 de abril de 2025, edição nº 2941