Não é escravidão, diz mulher que ofereceu casa por trabalho
A autora do post no Facebook defende que a iniciativa tem o objetivo de criar uma rede de apoio entre mães solteiras, e não estimular o trabalho escravo
A designer Patrícia Gomes Benfica, de 44 anos, diz que não imaginava a dimensão que sua postagem em uma rede social iria atingir. No fim de semana, ela publicou no Facebook um anúncio em que oferecia moradia compartilhada em um apartamento bem localizado na Zona Sul de São Paulo. O interessado deveria retribuir cuidando de seu filho, ajudando na cozinha e organização da casa. Detalhe: ela não oferecia nenhum tipo de salário, só um teto.
Logicamente que a publicação não passou despercebida nas redes sociais. Em pouco tempo, o post tinha mais de 3.000 compartilhamentos e Patrícia foi acusada de incentivar o trabalho escravo. Depois de tanta repercussão, a postagem foi deletada. A designer nega que tenha apagado o texto.
“O Facebook derrubou minha publicação. Mandaram mensagem falando que minha conta estava sendo excluída porque feria código de conduta e ética da rede. Ainda no domingo liberaram minha conta, mas informaram que o post tinha sido removido por conta da polêmica. Minha página continua lá, só não existe o post”, disse a VEJA.
Apesar de oferecer um trabalho sem remuneração, Patrícia nega que tivesse a intenção de praticar uma versão moderna de trabalho escravo. “Como designer, não conheço as leis trabalhistas, não imaginava essa repercussão”.
Ela rebate as críticas e diz que as pessoas não quiseram ouvir sua versão dos fatos. “Replicaram uma abobrinha milhões de vezes, as pessoas ficaram burras, não questionam e não querem ouvir a outra versão da história. Isso é escravizar a mente. Essa onda de ódio não me incomoda, me incomoda que as pessoas pararam de pensar”, afirmou.
No post, Patrícia pede que o interessado em compartilhar a casa ajude a cuidar do filho na parte da manhã. Ela diz que a criança é cardiopata e passou por uma cirurgia com apenas 20 dias de vida. O menino também passa por um tratamento fonoaudiológico por um problema que pode causar perda de audição. “Isso ninguém quer saber”, lamentou.
Patrícia afirmou que também recebeu apoio na rede social. “Fiquei com as mensagens boas. Para ser sincera, eu não li e não alimentei isso [mensagens negativas]”.
Depois de tanta polêmica, Patrícia afirma que agora corre o risco de perder o próprio emprego “Atingiu meu trabalho porque fere o código de ética da empresa. Corro o risco de ficar desempregada, mesmo que isso signifique ficar com meu filho o dia todo”.
Patrícia diz que ainda não desistiu da ideia da moradia compartilhada. “Eu adoraria transformar isso num projeto social maior. Isso existe fora do Brasil, na Europa, mas lá isso não fere as leis trabalhistas”.
Sobre a reforma trabalhista, que entra em votação hoje no plenário da Câmara, Patrícia ressaltou que é uma discussão importante. “A reforma precisa acontecer. Trabalho de troca não é escravo, estamos em 2017 não em 1880”.
A procura pela vaga ofertada no Facebook foi grande, segundo a designer. “Falei com uma menina de Cuiabá, que tem uma criança de dois anos. Ela já tinha até pesquisado passagem aérea, mas agora não sei o que eu faço porque a lei trabalhista não vai permitir. Isso prejudica as duas partes, inclusive os filhos. Nesse momento, quero encontrar uma forma dentro da lei pra exercer o projeto. Há pessoas precisando de ajuda mas não têm como ajudar porque vivemos em um país burro. Isso precisa ser modificado”.
O que diz a lei?
De acordo com o artigo 149 do Código Penal, configuram trabalho escravo:
- Condições degradantes de trabalho (incompatíveis com a dignidade humana, caracterizadas pela violação de direitos fundamentais coloquem em risco a saúde e a vida do trabalhador)
- Jornada exaustiva (em que o trabalhador é submetido a esforço excessivo ou sobrecarga de trabalho que acarreta a danos à sua saúde ou risco de vida),
- Trabalho forçado (manter a pessoa no serviço através de fraudes, isolamento geográfico,
Ameaças e violências físicas e psicológicas) e - Servidão por dívida (fazer o trabalhador contrair ilegalmente um débito e prendê-lo a ele).
- Leia também – Sobrecarga de trabalho: por que as mulheres sofrem mais?
- Leia também – Sobrecarga de trabalho: por que as mulheres sofrem mais?