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Os investimentos bilionários das Big Techs em empresas de IA

Gigantes de tecnologia como Google, Microsoft, Apple e Amazon — e seus fundadores — abrem os bolsos para continuar no topo

Por Felipe Carneiro, de Los Angeles
Atualizado em 3 jun 2024, 16h34 - Publicado em 1 jun 2024, 08h00

O noticiário do setor de tecnologia parece anunciar todos os dias investimentos multimilionários em empresas que trabalham com inteligência artificial. Há negócios para todos os gostos, e dinheiro fluindo para empreendedores que muitas vezes nem sequer têm um produto para apresentar. Mas também há quem se destaque pela audácia de seus objetivos e o poder de fogo comprovado para mudar o jogo do setor de tecnologia e, se tudo der certo, de toda a sociedade. Uma das que têm chamado mais a atenção no Vale do Silício é a Perplexity, uma companhia que recebeu 387 milhões de dólares em investimento e, mal tendo completado um ano, já está sendo avaliada em 3 bilhões. Seu objetivo? Desbancar o Google como o grande oráculo da internet. Mais do que isso, a companhia usa IA para mudar a maneira como as buscas são respondidas: em vez de uma lista de sites e links, a Perplexity fornece a resposta correta diretamente.

“Queremos ser aquele nerd da sala que sabe todas as respostas, sem a chatice de empurrar uma agenda política ou propaganda (a quem pergunta)”, repete o fundador Aravind Srinivas sempre que precisa explicar o que faz sua empresa, em uma clara provocação ao Google.

A cutucada pode fazer crer que a Perplexity ameaça o poderio dos gigantes da tecnologia, que ocupam hoje oito posições no ranking das dez empresas mais valiosas do mundo. Não é bem assim. Entre os principais investidores da companhia, estão o potentado de investimentos Sequoia (sócio de Apple, Google e Meta, entre outras) e Jeff Bezos, fundador da Amazon. A situação se repete em boa parte das startups de inteligência artificial. A Anthropic, que desenvolve um chatbot concorrente do ChatGPT chamado Claude, já recebeu uma injeção de 4 bilhões de dólares da Amazon, e outros 2 bilhões de dólares da Alphabet (dona do Google). A Apple comprou em março a sua 21ª startup de IA desde 2017, a Darwin AI, que desenvolve “visão” para robôs. Mas nenhuma cifra chegou perto dos 13 bilhões de dólares que a Microsoft investiu na OpenAI, criadora do ChatGPT, desde 2019. Não existe um número consolidado público, mas a plataforma de inteligência de mercado CB Insights mapeou 75 startups que receberam dinheiro de forma direta ou indireta das big techs só em 2023. Todas elas tiveram aumento superior a 50% em seus investimentos de 2022 para 2023, e prometem gastar ainda mais em 2024. “As big techs são as empresas mais valiosas da história, com capacidade de investimento virtualmente infinito”, afirma Fred Havemeyer, diretor de pesquisa em IA na gestora americana Macquarie. “Elas sabem por experiência própria que não é inteligente deixar brechas para que uma startup de garagem as pegue de surpresa.”

Não são só os investidores que estão atentos aos movimentos das big techs. Tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, os órgãos antitruste estão analisando com lupa cada investimento feito nessa nova leva de startups. Às voltas com processos já anteriores ao hype da IA relacionados a acusações de abuso de poder econômico e monopólio, as empresas estão evitando quanto podem fazer compras públicas diretamente. O investimento de 13 bilhões de dólares da Microsoft na OpenAI é descrito como uma parceria. A empresa de Bill Gates tem direito a 49% dos lucros da parceira, e trabalha para integrar sua tecnologia aos produtos e serviços que oferece aos consumidores, mas legalmente não há vínculo societário entre as partes.

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Aravind Srinivas, da Perplexity: “Queremos ser o nerd que sabe todas as respostas”
Aravind Srinivas, da Perplexity: “Queremos ser o nerd que sabe todas as respostas” (Tasos Katopodis/Getty Images)

Outra estratégia usada pela Microsoft foi simplesmente contratar todos os setenta funcionários da Inflection AI, que promete criar um robô de suporte emocional, incluindo seus fundadores Mustafa Suleyman e Karén Simonyan. A própria Perplexity não recebeu investimento direto da Amazon, mas de Jeff Bezos na pessoa física, seguindo o exemplo de Larry Page, fundador do Google, ao tirar dinheiro do próprio bolso para virar sócio da startup da área de saúde Aitia. “A FTC (comissão antitruste dos Estados Unidos) já avisou que vai colocar qualquer aquisição das big techs em inteligência artificial sob escrutínio, e as empresas estão abusando da criatividade para evitar problemas com os reguladores”, afirma Brendan Burke, analista de tecnologia na firma de inteligência empresarial PitchBook.

Todo mundo no Vale do Silício conhece a moral da história de quando os fundadores do Google, Larry Page e Sergey Brin, convenceram o criador do Netscape — então o browser mais popular do mundo — a incluir uma barra de buscas em seu navegador, em 1999. A parceria deu à então pequena startup acesso instantâneo a um público enorme, e a colocou no caminho para se tornar uma das maiores corporações do planeta vinte anos depois, ao passo que o Netscape ficou pelo caminho.

Avatares, adeus: após dois anos, Mark Zuckerbeg fechou o laboratório de metaverso
Avatares, adeus: após dois anos, Mark Zuckerbeg fechou o laboratório de metaverso (./Reprodução)

Lição aprendida, as big techs agora acharam um jeito de garantir que não sejam atropeladas pelas hoje pequenas empresas a quem estendem a mão. É verdade que elas despejam bilhões de dólares em dezenas de companhias, mas os acordos exigem exclusividade das novatas no uso de seus serviços de nuvem e data centers para treinar seus modelos de IA. O caso da Anthropic é emblemático: o mesmo contrato que garantiu um investimento de 4 bilhões de dólares por parte da Amazon na empresa a compromete a gastar 4 bilhões de dólares na plataforma de nuvem AWS, também de Bezos, ao longo dos próximos cinco anos. Essa tem sido a norma nessas negociações.

Anthropic: investimento de 4 bilhões de dólares em troca de contrato de mesmo valor
Anthropic: investimento de 4 bilhões de dólares em troca de contrato de mesmo valor (Ted Hsu/Alamy/Fotoarena/.)

A manobra faz parecer que o investimento nas startups é livre de risco, mas isso não é verdade. Ainda não se tem notícia de empresa de IA que já dê lucro, e é impossível ter certeza se isso um dia vai acontecer. Ninguém mais fala em metaverso, por exemplo, mas a certeza de que esse seria o futuro da internet era tão grande que Mark Zuckerberg mudou o nome de sua empresa de Facebook para Meta em outubro de 2021. Dois anos e 49 bilhões de dólares desperdiçados depois, Zuckerberg fechou o laboratório dedicado à tecnologia sem grande alarde e começou a fazer anúncios de investimento em IA. Apesar de todo o dinheiro investido e de todo o hype, o Google processa em uma hora e meia mais pesquisas do que os 500 milhões de buscas realizadas na Perplexity em todo o ano de 2023. Por mais avançada que seja a inteligência artificial, ela é incapaz de prever o futuro. E, por maiores que sejam os gigantes, eles também podem cair. E sabem muito bem disso.

Publicado em VEJA, maio de 2024, edição VEJA Negócios nº 2

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