Os planos da Latam para sobreviver à pandemia
Companhia espera socorro bilionário do BNDES e agora explora sinergias com as sócias internacionais para reduzir custo de operação
O setor aéreo foi um dos mais atingidos pela crise provocada pelo coronavírus. Entre março e abril os pousos e decolagens chegaram a cair cerca de 90% no país. Com isso, uma série de medidas precisaram ser tomadas para evitar o colapso dessas empresas, entre elas a assinatura de acordos de suspensão de contratos com os tripulantes das companhias e um socorro, via BNDES, um avaliado em 6 bilhões de reais, dividido igualmente entre Azul, Gol e Latam. A última, que entrou com pedido de Recuperação Judicial nos Estados Unidos, acaba de dar mais um passo para sobreviver. A companhia está próxima de fechar um acordo de joint venture, uma espécie de compartilhamento de voos, com a americana Delta Air Lines. As companhias encaminharam ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) uma apresentação preliminar do acordo entre as duas empresas que, caso seja aprovado, irá conectar as malhas aéreas das companhias entre as Américas do Norte e do Sul. A Delta possuía participação na Gol, mas se desfez dela no fim de 2019.
“Nossa aliança estratégica com a Delta continua sendo uma prioridade. Essa apresentação reafirma nosso compromisso em fornecer aos clientes liderança em conectividade e experiência de viagem nas Américas e a aliança é uma das maneiras pelas quais emergiremos dessa crise global como um grupo de companhias aéreas mais forte, mais ágil e mais competitivo”, afirma, em nota, Jerome Cadier, CEO da LATAM Brasil. O diretor-executivo da Delta, Ed Bastian, comentou que a parceria já havia sido firmada em 2019 e que o novo contexto aprofundou a intenção de construção da atuação conjunta. “Enquanto nossas companhias enfrentam os impactos da covid-19 nos nossos negócios e adotam medidas para proteger a segurança dos nossos empregados e consumidores, estamos construindo a aliança porque sabemos que eles irão querer voar no futuro”, analisou.
Em setembro de 2019 a Delta confirmou a compra de 20% da Latam, transação avaliada em 1,9 bilhão de dólares. À época, a americana ainda prometeu comprar aviões da chileno-brasileira e investir o equivalente a 350 bilhões de dólares na parceria. “As companhias aéreas neste momento devem agir não só para se recuperar mas também para planejar a retomada. Todas as empresas têm que tomar medidas para a retomada, que vai demorar, mas vai acontecer. Essa parceria entre Delta e Latam se encaixa no que estava planejado anteriormente. No passado, a Latam tinha um acordo semelhante com a American Airlines e agora vai ter com a Delta, um passo que já estava planejado e se reforça nesse momento de pandemia, porque compartilhar voos é muito melhor para a sua malha”, analisa André Castellini, especialista em aviação e sócio da consultoria Bain & Company.
No final de maio, a Delta optou por ressarcir a Latam em 62 milhões de dólares em razão da suspensão da entrega de quatro Airbus A350-900 utilizados pela empresa sul-americana. Apesar disso, as companhias mantiveram o acordo de compartilhamento de voos entre elas. “O racional desse acordo vale independente do tamanho do mercado. Por exemplo, do ponto de vista da Latam, ela quer que seus clientes possam voar para cidades que não opera e vice-versa para a Delta, então não importa se o mercado é grande ou pequeno, aliás quanto menor o mercado, mais importante se torna a aliança, porque consegue servir os viajantes com a capacidade de um terceiro. Quando se faz esse tipo de acordo a intenção é dar conectividade a um mercado que não é o seu de origem”, explica Castellini.
A Qatar Airways, que possui 10% das ações da Latam, metade do percentual da Delta, pretende apoiar a recuperação da sul-americana, mesmo em meio a uma profunda crise econômica e de saúde. Essa intenção da companhia do Oriente Médio é vista pelos especialistas não apenas como uma questão de rentabilidade, mas principalmente como uma estratégia de mercado. A Qatar Airways, vale ressaltar, ainda não pediu nenhum tipo de auxílio governamental para enfrentar o período de crise, fato que evidencia a capacidade de liquidez da empresa mesmo em meio à pandemia. “A estratégia da Qatar é de se tornar uma empresa global e deixar de ser apenas uma empresa local. Uma hipótese que faço é a de que eles não querem ser só uma empresa focada na região de origem, mas sim uma multinacional e para isso deve fazer investimentos em diferentes lugares do mundo, como na Latam”, pondera Castellini.