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Penduricalhos fazem consumidor pagar mais R$ 4 bi na conta de luz

Lista inclui desde ações para beneficiar produtores rurais em atividades de irrigação e criação de peixes até subsídios a prestadores de serviços públicos

Por Estadão Conteúdo 31 mar 2018, 08h42

O consumidor de energia tem desembolsado bilhões de reais todos os anos para bancar, por meio de sua conta de luz, programas públicos que não têm nenhuma relação com o setor elétrico e que sequer são fiscalizados pelo governo. A lista de penduricalhos cobrados na conta de luz inclui desde ações para beneficiar produtores rurais em atividades de irrigação e criação de peixes até subsídios concedidos a prestadores de serviços públicos de água, esgoto e saneamento.

Só no ano passado, essa conta paralela chegou a 4 bilhões de reais. Nos últimos cinco anos, consumiu mais de 17,5 bilhões de reais.

O jornal O Estado de S. Paulo teve acesso exclusivo a um relatório de auditoria, ainda em sigilo, realizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A corte investigou detalhes de cada encargo que o cidadão paga ao consumir energia elétrica. O levantamento foi realizado entre janeiro e março, a partir de informações da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e de dez ministérios responsáveis por programas financiados pela conta de luz.

Ao analisar os números, a auditoria concluiu que, em 2017, as despesas com os subsídios “rurais” chegaram a 2,6 bilhões de reais. Financiamentos de programas de irrigação e aquicultura ficaram com 779 milhões de reais, enquanto ações que subsidiam programas de empresas de água, esgoto e saneamento receberam 689 milhões de reais.

As informações sobre esses programas são omitidas do consumidor. Na fatura mensal de energia, o que se vê é apenas a cobrança de “encargos”, sem a discriminação do que efetivamente é cobrado. Esses recursos, segundo o TCU, equivalem a um quarto do total de gastos previstos na chamada Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo que reúne recursos, pagos pelos consumidores via conta de luz, e que financia também programas como o Luz para Todos.

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Até 2014, o fundo era custeado pelo Tesouro Nacional, ou seja, com o dinheiro dos contribuintes. Depois, passou a ser cobrado diretamente na conta de luz, com o barateamento artificial feito em 2013 pela ex-presidente Dilma Rousseff. Ela renovou concessões de hidrelétricas e transmissoras de energia que, em contrapartida, aceitaram receber tarifas mais baixas pelo serviço prestado. Houve um barateamento artificial momentâneo, seguido de altas sucessivas.

Para os auditores do TCU, ficou confirmado “o custeio indevido de alguns subsídios”, porque o governo “se utiliza indevidamente da via regulatória” para embutir na tarifa de energia elétrica ações sem relação com o setor, “configurando uma espécie de orçamento paralelo, sem as amarras que regem as finanças públicas”. Procurada, a Aneel não respondeu até a publicação desta reportagem.

Aneel não fiscaliza, diz TCU

A ausência de qualquer relação entre o setor elétrico e alguns programas subsidiados por meio da conta de luz não foi o único problema identificado pelos auditores do Tribunal de Contas da União (TCU). Ficou comprovado ainda que a maior parte dessas ações não é fiscalizada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ou mesmo pelo órgão que administra o benefício.

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Dos nove tipos de subsídios incluídos na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e administrados pela agência, apenas dois têm sido controlados e fiscalizados, segundo o TCU. 

Nos últimos cinco anos, a Aneel fez 97 fiscalizações. Dessas, 79 ocorreram sobre os resultados atrelados à Tarifa Social de Energia Elétrica e 18 sobre o subsídio aos chamados “Sistemas Isolados”, que estão fora da malha nacional de transmissão de energia. A respeito do Programa Luz para Todos, a agência informou que não possui competência legal para fiscalizar.

“Conclui-se que 75% dos subsídios que estão sob a competência da Aneel não têm sido fiscalizados. Dos 25% restantes, há várias unidades da federação, e consequentemente as distribuidoras que nelas atuam, que não têm sido fiscalizadas”, afirma o TCU.

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Para medir as consequências dessa falha de acompanhamento, o tribunal analisou um caso específico, checando os beneficiários do subsídio “irrigação e aquicultura” atendidos pela Companhia Energética de Brasília (CEB), distribuidora do Distrito Federal. Foram encontradas 167 unidades consumidoras da CEB que receberam descontos na fatura de energia elétrica em 2016 atrelados a esse subsídio. O total descontado desses usuários – mas cobrado de todo o País – foi de R$ 3,8 milhões.

Ocorre que, a partir do cruzamento de bases de dados da CEB, da Agência Nacional de Águas (Ana) e da Agência Reguladora de Águas Energia e Saneamento Básico (Adasa DF), ficou constatado que metade (53%) dos beneficiários não tinha autorização de outorga do direito de uso de recursos hídricos, ou seja, não podiam retirar e usar a água, item indispensável para obter o benefício. 

“Pela lógica legal e normativa, nenhum subsídio da CDE poderia ser concedido sem a competente outorga de direito de uso”, afirma o TCU. A reportagem procurou a Aneel, mas não obteve resposta. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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