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Por que a paranaense Copel é exemplo do que a Enel deveria ser e fazer

Empresa que também foi privatizada tem atendimento ágil e boa manutenção da rede elétrica

Por Márcio Juliboni, de Curitiba
2 nov 2024, 08h00

Em setembro de 2023, uma tempestade com ventos de 90 quilômetros por hora deixou sem energia 960 000 clientes da Copel, a concessionária que atende 395 municípios do Paraná, incluindo a capital, Curitiba. O número equivale a 19% dos 5,1 milhões de imóveis abastecidos. Ciente do temporal que se formava, a concessionária reforçou as equipes de emergência e religou a energia de 98% dos clientes em 24 horas. Dois meses depois, em 3 de novembro de 2023, temporal semelhante castigou a cidade de São Paulo e outros 22 municípios paulistas, mas o saldo foi bem pior. Cerca de 2 milhões de imóveis ficaram no escuro, de um total de 8,1 milhões atendidos pela distribuidora local, a Enel. Um dia após a borrasca, apenas 60% deles estavam reconectados à rede, e foram necessários quatro dias para a luz voltar a 98% dos afetados. Compreender o abismo que separa a Copel da Enel é salutar não apenas para melhorar os serviços de energia da maior cidade do país, mas também para aprimorar o próprio setor elétrico brasileiro.

A diferença central é que a Copel investe em manutenção preventiva, enquanto a distribuidora paulista espera o pior acontecer para reagir — e muito mal. “A Enel sempre paga para ver se terá um problema”, diz um funcionário que pediu anonimato. Já na Copel, a ordem é não ser pego de surpresa. Em 2024, ela está investindo 2 bilhões de reais para tornar a rede elétrica mais robusta. Isso significa, por exemplo, aumentar a redundância com dois ou mais circuitos abastecendo o mesmo ponto. Assim, é possível contornar trechos danificados e levar a energia ao cliente por outro caminho. Para isso, a empresa aposta na inteligência artificial. “Isso torna a rede mais resistente aos temporais”, diz Marco Antônio Villela, diretor da Copel Distribuição. Para reparos in loco, a Copel mantém 300 bases em todo o estado com um contingente fixo de 800 equipes. Em dias normais, elas fazem todo tipo de serviço — de instalar novos postes a podar árvores. Em emergências, o número de equipes pode dobrar, mobilizando até 7 000 técnicos. Tudo isso torna a Copel uma das distribuidoras mais rápidas em emergências: em média, cada ocorrência é atendida em três horas.

Na outra ponta está a Enel, com uma demora média de dez horas, fruto de cortes de pessoal e de baixa nos investimentos em manutenção. Ao assumir a concessão, em 2018, a companhia italiana herdou da americana AES cerca de 22 600 funcionários, entre próprios e terceirizados. No fim de 2023, o quadro havia caído para menos de 16 000. Após o apagão de novembro de 2023, a Enel prometeu reforçar as equipes, mas contratou menos de 2 000 pessoas até agora. “Para piorar, nem todos são técnicos de campo”, diz Eduardo Annunciato, presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo. “A falta de pessoal na linha de frente continua.”

Enquanto promete melhorar, cortou o investimento em manutenção, de 419 milhões de reais no primeiro semestre de 2023 para 315 milhões no mesmo período deste ano. Funcionários ouvidos por VEJA relatam um cenário desolador: almoxarifados vazios e demora de semanas para receber itens básicos como óculos de proteção. Mesmo os recém-contratados ficam parados por dias até ter o material necessário. O sucateamento da rede é uma consequência.

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arte COPEL

O Sindicato dos Eletricitários calcula que, apenas na capital, a rede necessite de 18 000 intervenções para resolver problemas graves, como postes caídos e fiação danificada. Em nota à VEJA, a Enel nega os problemas. “A companhia aumentou em 24% a força de trabalho de eletricistas próprios em campo desde novembro do ano passado. Até março, serão 1 200 eletricistas próprios contratados. A distribuidora dispõe de equipamentos necessários para que suas equipes possam atuar”, diz. Tomara que um próximo apagão não desminta cabalmente a companhia.

O bom desempenho da Copel impressiona até mesmo o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Após o apagão do último 11 de outubro, que prejudicou 3,1 milhões de clientes da Enel, ele enviou emissários a Curitiba e tem dito a interlocutores que o ideal seria transformar a Enel numa versão paulista da Copel: uma empresa privada de capital pulverizado. A solução esbarra na letargia do governo federal, que, como poder concedente, pode intervir na empresa, e da Agência Nacional de Energia Elétrica, que só iniciou uma investigação, que pode conduzir à caducidade do contrato, depois de formada a confusão.

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DESASTRE - Equipe da Enel: sem manutenção preventiva, empresa presta péssimos serviços
DESASTRE - Equipe da Enel: sem manutenção preventiva, empresa presta péssimos serviços (Renato S. Cerqueira/Ato Press/Agência O Globo/.)

Muito pressionada pelo governo, especialmente pelo ministro Alexandre Silveira, a Aneel não tem cumprido seu papel na fiscalização do serviço elétrico em São Paulo. “O que fracassou na privatização do setor elétrico no Brasil foi a agência reguladora”, diz Andrea Matarazzo, ex-secretário de Energia que assinou o contrato de concessão da então Eletropaulo, representando o governo paulista, em 1998. “A Aneel deveria ser independente, mas foi capturada por interesses políticos.” Enquanto isso, a Enel se vale de indicadores de qualidade estabelecidos há 26 anos, inadequados para os tempos atuais, para se defender. Já a Copel, que renovou sua concessão em 2015, cumpre um contrato mais rigoroso, que prevê caducidade automática em alguns casos. “Há espaço para melhorar o modelo da Enel”, afirma Matarazzo. Sem dúvida. Que se faça a luz.

“Investir é vital”

Para Daniel Slaviero, presidente da Copel, somente investimentos robustos garantirão o futuro das distribuidoras de energia.

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EQUILÍBRIO - Slaviero: é possível gerar lucros sem prejudicar os clientes
EQUILÍBRIO - Slaviero: é possível gerar lucros sem prejudicar os clientes (Copel/.)

A Copel virou uma empresa privada de capital pulverizado. O que mudou? Ganhamos agilidade nas decisões, o que nos permite uma visão de longo prazo que busque relevância em geração, transmissão, comercialização e distribuição de energia. Outra vantagem é poder atrair e reter os melhores talentos do mercado.

Por que a Copel investe quatro vezes mais que a Quota de Reintegração Regulatória, que representa o mínimo necessário para repor a depreciação de ativos? O mais importante é melhorar o atendimento ao cliente. Segundo, isso aumenta nossa base de remuneração. Terceiro: reduz custos. Os contratos de concessão são de trinta anos. Por isso, deve-se pensar na perenidade do negócio, que só é possível com investimentos robustos.

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Como conciliar os dividendos dos acionistas, a necessidade de investimentos e o direito da população a um bom atendimento? É possível gerar valor para todos, a partir de decisões equilibradas e visão de longo prazo. Temos um foco muito grande no cliente, porque ele é a razão de existir de qualquer empresa.

O senhor já disse que a Embraer é a referência da Copel. Por quê? Ela também foi privatizada e tem capital pulverizado. É muito ágil nas decisões e se tornou uma empresa de excelência global em todos os seus produtos e serviços. Tem técnicos e executivos muito qualificados. Enfim, a Embraer gera valor em todos os segmentos em que atua.

Publicado em VEJA de 1º de novembro de 2024, edição nº 2917

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