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Risco político e fiscal é entrave para sucesso da bolsa brasileira em 2021

A sensação entre investidores é de que o mercado tem todas as condições para decolar, mas não está conseguindo aproveitar uma grande oportunidade

Por Luisa Purchio, Felipe Mendes Atualizado em 4 jun 2024, 13h56 - Publicado em 30 abr 2021, 06h00

Opção cada vez mais popular entre os brasileiros, a bolsa de valores de São Paulo (B3) vem trazendo este ano algumas notícias capazes de animar os investidores mais conservadores. Depois de duas tentativas frustradas em 2020 por causa da pandemia de Covid-19, a Caixa Seguridade conseguiu, enfim, na terça-feira 27, pôr as suas ações para negociação, levantando 5 bilhões de reais. Foi, até então, a segunda maior venda de papéis de 2021, atrás apenas da realizada pela CSN Mineração, que em fevereiro captou 5,2 bilhões de reais, e desde então já viu o seu valor subir 20%. Esses dois casos são parte de um movimento que já conta com vinte empresas que abriram capital até a quarta-feira 28, ante as 28 de todo o ano de 2020. O feito é ainda mais notável uma vez que cerca de 40 bilhões de reais foram movimentados este ano em emissões de ações, e alguns analistas acreditam que será possível passar dos 150 bilhões de reais até 31 de dezembro, considerando IPOs — sigla em inglês para ofertas iniciais de ações — e follow-­ons, as vendas de ações subsequentes de empresas que já estão no mercado acionário. Será mais do que suficiente para superar a marca de 117 bilhões de reais de 2020.

Pode ser surpreendente, então, perceber que, mesmo com tais prognósticos, o clima entre os investidores ainda não é dos melhores — mas existe uma razão para a desconfiança. Quando os dados são estudados com mais cautela fica evidente que a B3 não está conseguindo se beneficiar do excesso de liquidez disponível no planeta. Com os pacotes trilionários de estímulos governamentais aprovados nos Estados Unidos e na Europa e com as baixas taxas de juros praticadas mundo afora para estimular as economias abatidas pela pandemia, os pequenos e grandes investidores internacionais têm fartos motivos para aplicar em ativos de risco. E as bolsas de grandes países emergentes são uma escolha óbvia neste cenário. Em resumo: era para o Brasil estar bombando neste momento.

arte IPO

E a realidade é que não está. Um levantamento realizado por VEJA mostra que, em comparação com os principais índices de doze países, o desempenho da bolsa brasileira no ano só é melhor que o da Turquia e da China. Até terça-feira 27, o Ibovespa estava praticamente estagnado em relação ao fim de 2020, havia subido apenas 0,31% em real e 0,30% em dólar. Quando convertidos para a moeda americana, os índices das bolsas da Rússia, México e África do Sul apresentam alta acima de 9% no ano. Os sinais de alerta não param por aí. Apesar de haver dezenas de empresas na fila para abrir capital neste ano na B3, até abril 25 companhias de diversos setores optaram por atrasar esse processo, uma quantidade maior que a constatada em todo o ano passado. “Se a economia cresce menos, o limite para a empresa prosperar em seu mercado também é menor”, diz o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB Associados. “No caso de um IPO, isso significa entregar suas ações a um valor menor, o que leva muitas empresas a esperar uma nova janela de oportunidade.” Uma pesquisa da consultoria Economatica mostra que, dos vinte IPOs rea­li­za­dos neste ano, dez registraram desempenho negativo. De março para cá, apenas a Caixa Seguridade conseguiu vender ações sem desconto em relação ao preço mínimo projetado para a operação.

O cenário que se estabeleceu é, enfim, de um paradoxo. De um lado, os investidores e empresas estão interessados nos ganhos potenciais que podem alcançar na bolsa. “Com a baixa taxa de juros, cada vez mais investidores entram na bolsa. E as empresas precisam desse dinheiro para contratar, investir e crescer. É uma conexão benéfica”, diz Tito Gusmão, CEO da corretora Warren. De outro lado, fica a sensação de que o mercado brasileiro tem todas as condições para decolar, mas não está conseguindo aproveitar uma grande oportunidade. A explicação entre os analistas é quase unânime: o alto risco político e fiscal do Brasil alimentado pela crise da Covid-19. “Está faltando um motor para a bolsa, que anda de lado”, diz João Mauricio Rosal, economista-chefe da Guide Investimentos. A expectativa de retomada da agenda de reformas prometida pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, pode ser o empurrão necessário (o silêncio do presidente Jair Bolsonaro também ajudaria bastante). Mas, enquanto isso não acontecer na prática e as incertezas não diminuírem, a dúbia situação pode continuar. O perigo é deixar a oportunidade passar e as condições favoráveis, que estão postas hoje, evaporarem.

Publicado em VEJA de 5 de maio de 2021, edição nº 2736

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