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Sancionada por Bolsonaro, lei de clube-empresa pode ter impacto limitado

Veto ao projeto sobretaxa clubes que seguirem pelo caminho; presidente do Cruzeiro diz a VEJA que Congresso se articula para reverter decisão

Por Felipe Mendes Atualizado em 9 ago 2021, 23h01 - Publicado em 9 ago 2021, 19h05
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  • Aguardada com grande expectativa por alguns dirigentes de clubes de futebol brasileiros, a lei que regulamenta a transformação dos times em empresas pode não ter o impacto desejado. Sancionada na última sexta-feira 6, pelo presidente Jair Bolsonaro, o projeto de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e relatoria do senador Carlos Portinho (PL-RJ), recebeu alterações significativas em seu texto-base. A princípio, a proposta visava criar um arcabouço tributário positivo para atração de investimentos a clubes endividados, com alíquota única de 5% em regime de caixa mensal. O projeto, no entanto, não agradou ao Ministério da Economia, que convenceu Bolsonaro a demover o item da pauta. Hoje, a maioria dos times de futebol são associações sem fins lucrativos, que não contribuem com o caixa da União.

    O governo optou pelo veto com a premissa de que a medida violaria as leis de Responsabilidade Fiscal e de Diretrizes Orçamentárias. “A medida acarretaria renúncia de receita, sem o cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória e sem que estivesse acompanhada de estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro”, argumentou o governo à Agência Senado. Para Pedro Daniel, diretor-executivo de esportes, mídia e entretenimento da consultoria EY, o veto pode afastar tanto os clubes como os investidores do modelo de Sociedade Anônima do Futebol (SAF), fazendo com que a adesão seja limitada. “O clube que sair do modelo associativo para SAF terá uma tributação muito maior, pelo projeto sancionado. É algo que diminui a atratividade”, afirma. “Fora isso, também foi vetada a possibilidade de projeto incentivado, algo que ajuda as associações sem fins lucrativos a atraírem investimentos para categorias de base”.

    A VEJA, Sérgio Santos Rodrigues, presidente do Cruzeiro, um dos clubes que mais endossaram a aprovação da nova norma, diz que o Congresso pode reverter o veto de Bolsonaro. “O veto foi feito com uma justificativa equivocada, porque, na realidade, os clubes adotam praticamente um regime de não-pagamento ou isenção de boa parte dos impostos como associação. Ao se tornarem uma SAF, eles passam a pagar. A ideia de que o governo estaria abrindo mão de receita é errada”, afirma. De qualquer forma, Rodrigues já trabalha a pleno vapor para ser a primeira agremiação a aderir ao novo modelo — com ou sem veto. “A gente pretende encaminhar o processo de estruturação para a criação da SAF já. Vamos registrar ela com ações 100% pertencentes ao clube, enquanto caminha a consolidação do cenário de derrubada do veto.”

    Se a canção diz que “quem tem fome, tem pressa”, o mesmo pode se falar do Cruzeiro. Multicampeão do futebol brasileiro, o clube mineiro se agarra ao projeto como uma forma de encontrar a redenção. Com dívidas avaliadas em 897 milhões de reais, o Cruzeiro foi vítima de más gestões, que gastaram mais do que deveriam em busca de títulos, e hoje amarga a segunda divisão do futebol brasileiro. Impossibilitado de realizar contratações devido a punições impostas pela FIFA, o time pode usufruir de alguns aspectos da nova lei para tentar se reerguer no cenário nacional, como a possibilidade de arrecadar recursos por meio de debêntures (títulos de dívida), abrir o capital em bolsa ou solicitar recuperação judicial, cuja finalidade seria a renegociação das dívidas. “A SAF exige uma governança mais robusta, com conselho de administração e a formatação do conselho fiscal”, afirma Daniel, da EY, que está assessorando o Cruzeiro no caminho para se tornar um clube-empresa.

    Hoje, alguns clubes de futebol já atuam como empresas. Na elite do futebol nacional, é possível encontrar os exemplos do RB Bragantino, administrado pela multinacional Red Bull, e do Cuiabá, cuja gestão pertence à família Dresch. Caçula da primeira divisão do futebol brasileiro, o Cuiabá é um exemplo de clube-empesa bem-sucedido: nunca atrasou salários. Para Cristiano Dresch, vice-presidente e sócio do time, o modelo de associação, que predomina no país, é atrasado. “São clubes, na maioria das vezes, mais frágeis do ponto de vista da governança e de responsabilidade fiscal se comparados com os clubes-empresas”, afirma.

    Segundo Carlos Aragaki, sócio da consultoria BDO, a profissionalização do futebol brasileiro é um rumo sem volta. “Os clubes que fizeram a lição de casa, que estão com uma boa governança, como Flamengo e Palmeiras, são os que conquistam os títulos hoje. Enquanto isso, times centenários estão ficando para trás. Se esses times não mudarem a gestão e criarem uma boa governança, com transparência, vão estar fadados a disputarem divisões inferiores até caírem no ostracismo”, afirma. Quem sabe assim o futebol do país, que ficou marcado nas mãos de figuras folclóricas que usaram de sua imagem como forma de fazer fortuna e carreira política, possa retomar o prestígio e, sobretudo, os investimentos.

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