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Saúde tira relação ocupacional da Covid-19 e causa insegurança jurídica

Portaria que classificava a enfermidade como doença do trabalho durou menos de um dia e foi revogada

Por Larissa Quintino Atualizado em 2 set 2020, 14h15 - Publicado em 2 set 2020, 11h52

O Ministério da Saúde revogou, após um dia de vigência, uma portaria que colocava a Covid-19 no hall de doenças ocupacionais. Nesta quarta-feira, 2, a pasta comandada pelo general Eduardo Pazuello, publicou uma nova norma, que suspende a vigência da anterior. Com isso, a Covid-19 não está inclusa no hall de doenças do trabalho, como havia sido decidido anteriormente. Neste caso, a empresa não precisará oferecer estabilidade de um ano após a volta ao trabalho. A medida foi revogada a pedido do presidente Jair Bolsonaro, já que causava mais custo para empresas.

Doença ocupacional é aquela adquirida ou desencadeada em função da realização de atividades cotidianas no trabalho. Entre as mais comuns, por exemplo, estão a Lesão Por Esforço Repetitivo (LER), doenças de audição, hérnias e até mesmo doenças psicológicas. Quando um trabalhador dá entrada no INSS com uma doença ocupacional, cabe a empresa a comprovação que a doença não foi contraída na empresa. Se o afastamento for superior a quinze dias, o funcionário tem direito ao auxílio-doença acidentário, com valor de 100% de sua média salarial, contra 60% de quem precisou ficar afastado por outra doença. Além disso, a empresa paga mais por um funcionário afastado com doença ocupacional: ela é obrigada a arcar o FGTS do período de afastamento, além de ter que dar estabilidade de doze meses após a alta. No caso de afastamento do trabalho por doenças ou acidentes que não tenham sido causados pelo trabalho, não há previsão de estabilidade.

Para Ricardo Calcini, especialista nas Relações Trabalhistas e Sindicais, a revogação da portaria após 24 horas de vigência demonstra que não há uma definição sobre o assunto. O problema disso, é que há insegurança jurídica, tanto para as empresas quanto para os trabalhadores. “Na prática, ao não incluir a Covid-19 na Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT), isso dificultará que o INSS, voluntariamente, conceda o benefício previdenciário por auxílio-doença acidentário, salvo se houver decisão administrativa ou judicial em sentido contrário”, afirma.

Com a queda da portaria, a Covid-19 só pode ser considerada doença ocupacional se o trabalhador conseguir provar que foi contaminado no trabalho, algo muito difícil já que a doença tem transmissão comunitária, explica o advogado previdenciário João Badari. Apesar da medida ser benéfica para as empresas, Calcini alerta que a revogação da portaria ministerial não deve ser entendida como sinônimo de ausência de responsabilidade do empregador, em especial nos casos em que fique comprovado o nexo de causalidade na contaminação do funcionário em seu ambiente de trabalho por culpa da empresa. “Esse nexo continua sendo presumido em atividades envolvendo, por exemplo, os profissionais da área de saúde, em razão da exposição direta e de forma mais acentuada ao vírus se comparada às demais profissões”, observa.

Questionada se a rápida mudança de postura sobre a classificação da doença se tratava de um erro na edição da portaria anterior, a pasta informou que decidiu fazer a revogação por “contribuições técnicas” que sugeriam reajuste. A visão de outras áreas do governo é que a classificação poderia gerar mais custos trabalhistas às empresas. “Essas sugestões serão analisadas pela pasta e demais órgãos envolvidos antes da republicação do texto”, afirmou o ministério em nota.

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Como resume a advogada Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), a retirada da Covid-19 da lista das doenças ocupacionais não elimina a relação com o trabalho em uma possível contaminação. mas agora é o trabalhador que precisa comprovar que contraiu a doença do trabalho. Ou seja, é necessário que o perito médico do INSS caracterize o nexo causal da doença. Até o momento, as agências do INSS encontram-se fechadas por causa da pandemia e, com isso, as perícias médicas estão suspensas. A volta aos atendimentos presenciais está marcada para 14 de setembro.

A relação ocupacional da Covid-19 é considerada antes mesmo da portaria relâmpago da Saúde. Em abril, o Supremo Tribunal Federal havia considerado inconstitucional um artigo da medida provisória 927, que descartava a Covid-19 de doença ocupacional.  A MP, entretanto, caducou, mas a decisão prévia do Supremo pode basear casos de judicialização da questão por meio de trabalhadores, afirma a advogada Cintia Fernandes, advogada trabalhista do escritório Mauro Menezes.

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