Na segunda-feira, 12, o Walmart Brasil anunciou a mudança de nome da marca no Brasil, que agora passa a se chamar Grupo Big. A empresa chegou em 1995 ao país com uma expectativa enorme, afinal, o Walmart é a maior varejista do mundo. Quase 25 anos depois, a rede é apenas a terceira em número de vendas do setor no país, sofre para se firmar no mercado brasileiro e passa por reestruturação.
O desempenho foi de tal modo decepcionante, que o Walmart, em 2018, vendeu 80% de sua participação na operação no país ao fundo de investimentos Advent. Do outro lado, a rede global continua em ascensão. Em 2018, o lucro líquido foi de 3,69 bilhões de dólares, a receita, de 138,8 bilhões de dólares, e o número de funcionários já ultrapassa 2 milhões de pessoas.
Atualmente, o Walmart Brasil opera com cerca de 550 unidades e 50 mil funcionários em 18 estados brasileiros, além do Distrito Federal. Ao todo, são sete bandeiras diferentes, como hipermercados e atacadistas. VEJA conversou com especialistas no mercado varejista sobre os motivos para o Walmart Brasil não ter deslanchado como o esperado.
Mercado competitivo
Mesmo para a líder mundial do setor, atuar no mercado brasileiro de varejo não é tarefa fácil. Competitivo e dinâmico, os principais players — grupo Grupo Pão de Açúcar e Carrefour Brasil — estão bem segmentados e fidelizados entre a população. Ainda assim, até eles sofrem com a dificuldade de conseguir lucros consideráveis. Em um setor tão competitivo, sobra pouca margem para erro de estratégia e operação. “Nós termos um setor com empresas muito tradicionais que trabalham muito forte o mercado. E o Walmart não conseguiu construir um posicionamento estratégico claro”, diz o professor de MBA da FGV, Roberto Kanter.
Aposta no “preço baixo todo dia”
O Walmart tem como um de seus principais atrativos a política de “preço baixo todo dia”. A estratégia garante preços abaixo da média em relação aos concorrentes de forma regular — promoções são menos frequentes. Essa fórmula consagrada veio junto com a empresa ao país. Mas não deu certo. “O comportamento do brasileiro para o consumo é muito diferente do americano. No Brasil, o pessoal quer saber é de promoção”, afirma Antônio César, sócio-diretor da consultoria Acomp. O próprio Walmart Brasil admite o problema e fala em mudanças. Em nota, a empresa informou que “o modelo de preço baixo todo dia é consolidado nos Estados Unidos. Já o brasileiro gosta de promoções e nunca entendeu a estratégia. A partir de agora, teremos uma estratégia alinhado com o que o nosso cliente procura, preços baixos e muitas ofertas”. O curioso, é que em outros setores, como o recente atacarejo, a fórmula até funcionou, mas a empresa não soube entrar na onda.
Atacarejo não vingou
A dificuldade de se firmar no atacarejo (mistura de varejo e atacado), bem popular no Brasil, também prejudicou o Walmart. O grupo é dono da marca Maxxi, que tem 43 lojas no Brasil, e está em processo de transformá-las em atacarejos, modelo que os principais concorrentes adotam desde a década passada. Nos balanços do segundo trimestre deste ano, o Atacadão, do Carrefour Brasil, e o Assaí, do grupo Grupo Pão de Açúcar, foram as marcas que mais puxaram o desempenho de suas respectivas companhias. Para Kanter da FGV, esse foi o grande problema do Walmart Brasil: “não conseguiu competir com os mercados de bairro, como o Carrefour Express, e com os atacarejos, os dois modelos recentes de mais sucesso no país”.
As vendas totais do Assaí foram de 7,1 bilhões de reais no segundo trimestre de 2019. O grupo GPA como um todo teve 14,2 bilhões em vendas. O Atacadão teve 10,3 bilhões de reais em vendas brutas, e Carrefour como um todo, 15,3 bilhões de reais. O Walmart Brasil não divulga seus balanços, porque não é uma companhia de capital aberto, mas os analistas não enxergam o Maxxi com a mesma força de seus concorrentes. Com o controle da Advent, no entanto, o cenário tende a mudar. Isso porque os novos donos pretendem focar mais no modelo. Dez dos hipermercados que hoje são Walmart vão ser transformados no Maxxi.
Hipermercados
Além da política de “preço baixo todo dia”, a preferência pelos hipermercados também entra na conta das características que deram certo nos Estados Unidos e não funcionaram no Brasil. A variedade imensa de produtos, e as lojas gigantes agradam consumidores americanos. A possibilidade de comprar produtos diversos, de roupas à comida, em um só lugar é atrativa e a experiência de consumo, valorizada, com corredores longos e arejados. Apesar de tudo isso, no Brasil, o modelo se desgastou. “É um momento em que as lojas grandes estão deixando de ser moda”, disse César, da Consultoria Acomp. Para ele, o consumidor deseja cada vez mais uma experiência rápida, tendendo para outros tipos de mercado, como os de bairro.
Do lado dos varejistas, o problema são as despesas gigantes. “Como é muito grande, os custos também são. É necessário estar em um local com muito tráfego, movimentado, não violento e com acesso fácil”, acrescenta ele.
Ineficiência em mercados regionais
Um dos erros de operação da marca do país foi sua ineficiência, analisa Alexandre Ribas, sócio da consultoria Falconi. Nos anos 2000, o Walmart adquiriu grandes grupos varejistas regionais — o Bompreço, rede líder do varejo no nordeste e o Grupo Sonae, dono de marcas como a Big, forte no sul — com a intenção de consolidar a marca em praças regionais e otimizar processos. Porém, o planejamento não saiu como o esperado. A empresa, famosa por preços baixos, não teve margens tão agressivas assim.
“Essa estratégia exige que, a partir dessa consolidação, capture-se sinergias dos negócios e busque-se um grau de eficiência na sua operação que permita operar com uma margem razoável de lucro. No varejo, 5% já é muito”, diz Ribas. “Você pode ser gigante, mas, se você é ineficiente, você é gigantemente ineficiente”, acrescenta ele. Na nova fase da empresa, o nome dos mercados regionais serão, inclusive, resgatados. No nordeste, os hipermercados serão batizados como Big Bompreço e no sul e no sudeste como Big.
Crise econômica
Pensando em fatores mais recentes, a crise econômica de 2015 e 2016 também pode ter influenciado o fraco desempenho do Walmart Brasil. É o que os analistas chamam de uma tempestade perfeita. Se volume de renda e eficiência já eram um problema, o cenário piorou com a situação macroeconômica do país se deteriorando. Para Alexandre Ribas, sócio da consultoria Falconi, mesmo em tempos de crise, o desempenho do Walmart poderia ter sido melhor. “Eles também pegaram momentos que nossa economia estava em ascensão — já estão há mais de 20 anos no país. A crise diminui a massa salarial, mas também oferece operações rentáveis. É preciso entender onde é que ela está afetando, para conseguir atenuá-la.”