A primeira grande privatização (das várias prometidas) pelo governo Bolsonaro finalmente vai sair do papel. Nesta quinta-feira, 9, as ações para a capitalização da empresa foram precificadas por volta de 42 reais, conforme informaram fontes ao Radar Econômico. Para Wilson Ferreira Júnior, que foi presidente da estatal de energia entre 2016 e 2021, a privatização da Eletrobras será benéfica para o mercado e trará novos investimentos para o país. “A Eletrobras não participava dos leilões do setor porque não tinha capacidade financeira para investir. Agora, com a privatização, vai poder voltar a participar. Isso, sem dúvidas, vai aumentar a competição nos leilões e será bom para o consumidor.” Hoje, o engenheiro elétrico está a frente da Vibra Energia, empresa criada a partir da desestatização da BR Distribuidora, que pertencia à Petrobras, e tem impulsionado o setor em busca de uma matriz energética mais sustentável.
O senhor foi presidente da Eletrobras por mais de quatro anos. Qual é a sua avaliação do processo de privatização da empresa? O interesse no Brasil via mercado de capitais é muito grande. Há uma regulação boa, as empresas são de porte, tem liquidez na bolsa… São fatores importantes para o investidor institucional de fora do país. Logo, eu não tenho dúvida de que a Eletrobras é muito importante e a desestatização dela aumentará o escopo de investidores na bolsa brasileira. E isso é muito bom.
Qual seria o interesse dos investidores estrangeiros na empresa? Infraestrutura é uma área na qual o mundo carece e a Eletrobras é gigante nesse sentido. É uma das maiores empresas de energia renovável do mundo.
Isso vai estimular a concorrência e trazer investimento para o país? A Eletrobras é uma companhia que tem 30% da capacidade de geração de energia e um pouco menos de 40% das linhas de transmissão do país. Toda a expansão do sistema elétrico brasileiro é feita por leilão, onde a Eletrobras não participa desde 2015. Há muitas empresas que operam no país. Não houve nenhum leilão sem postulantes nos últimos cinco anos. Quando você fala em um leilão que estabelece um preço-teto e coloca os agentes para disputarem, quando você tem um agente desse tamanho, como a Eletrobras, que não participa do certame, há uma perda em termos de competitividade. Ela não participava porque não tinha capacidade financeira para participar, para investir. Agora vai voltar a poder participar. Isso, sem dúvidas, vai aumentar a competição nos leilões e será bom para o consumidor.
A oposição fala que a privatização da Eletrobras poderá ocasionar em falta de energia no país… Eu vejo gente falando isso, mas não faz sentido. Houve um problema em 2001, quando 96% da oferta de energia era hidráulica. Hoje esse número é bem menor. Houve investimento nas térmicas, nas eólicas e nas solares, que chegaram com a força do investimento privado. A gente tem uma excelência no desenvolvimento das agências que fiscalizam e regulam o mercado. Elas avançaram muito.
O senhor assumiu a Vibra Energia após a saída da Petrobras da operação. Quais foram as mudanças implementadas na sua gestão? Quando eu cheguei, havia um conselho de administração, com membros independentes. Fui demandado a criar um plano estratégico para o desenvolvimento da companhia no longo prazo. Isso foi divulgado em setembro. A partir disso, nós fizemos um trabalho para definir as áreas em que teríamos maior efetividade. A companhia mudou de nome, posicionou-se como uma empresa que preza a eficiência, em buscar de ter um menor custo se comparado à concorrência. Criamos uma plataforma ‘multienergia’, para acelerar projetos de transição energética para os nossos clientes. Criamos e disponibilizamos combustíveis da transição energética, como biocombustíveis, energia de fontes renováveis etc. Montamos um conselho de administração com mais diversidade, com experiência em transição energética, meios de pagamentos e digitalização do cliente. O mercado reconheceu isso como uma estratégia nova.
O senhor poderia dar exemplos de como a Vibra conseguiu acelerar sua transição energética após a saída da Petrobras? Sim. A empresa entendeu que tinha mais oportunidades no desenvolvimento de energias renováveis, como biocombustíveis, e procurou firmar parcerias. Fizemos uma joint venture com a Copersucar, por exemplo, para aumentar a efetividade do etanol. Com a Comerc, criamos a maior comercializadora de energia elétrica limpa no mercado livre. Estamos com uma joint venture com a Lojas Americanas para duplicar o número de lojas de conveniência nos postos de gasolina em três anos. E fizemos uma parceria para o desenvolvimento de combustível sustentável para a aviação a partir do óleo de palma, em parceria com a Brasil BioFuels. É um projeto que, de uma tacada só, vai reflorestar algumas áreas degradadas da Amazônia para plantar palma e, com isso, produzir combustíveis renováveis, como o diesel verde e o combustível sustentável da aviação. Tudo isso foi feito desde a minha chegada. Um investimento de quase 4 bilhões de reais já.
Com a saída da Petrobras da operação, como é a composição acionária da empresa? Hoje, a Vibra é uma true corporation, com o capital pulverizado, sem um dono. Nós temos 75 mil acionistas hoje. Disso, quase 73 mil são formados por pessoas físicas, que detêm 4% do capital da companhia. O restante é formado por investidores institucionais, como fundos de pensão e voltados à infraestrutura. Esse grupo possui 96% da companhia. Desses, 46% são formados por investidores estrangeiros.
A população entende melhor o conceito de privatização hoje? Eu acho que a população está bem mais esclarecida do que no passado. Por exemplo, qualquer linha de telefone hoje é de uma empresa privada. É possível perceber os benefícios dessa competição que a abertura desse setor trouxe. Na área da energia, hoje, 90% das distribuidoras são privadas, com investimentos maiores e com um melhor serviço de atendimento ao consumidor. Ou seja, é um processo mais lento de convencimento, mas ele está acontecendo. Não dá para deixar tudo por conta do poder público, porque o Estado não tem dinheiro para expandir. A única forma de o governo investir seria aumentando impostos, e eu acho que é o que a população não quer. Então, há evidências de resultados positivos em privatizações no sentido de desonerar o Estado. A principal função do governo deve ser regular, fiscalizar e garantir que o investimento venha pelo setor privado.