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Lambança no Enem é mais uma nota vermelha na gestão de Weintraub

Ministro chama atenção, dentro e fora do governo, pela falta de resultados concretos

Por Maria Clara Vieira Atualizado em 4 jun 2024, 14h58 - Publicado em 31 jan 2020, 06h00
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  • Crítico ferino de seus antecessores, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, prometia superar a todos e promover “o melhor Enem da história” neste 2020, sua estreia no comando da gigantesca engrenagem da prova que funciona como um vestibular. Mas acabou derrapando feio, como viria a se tornar público depois que estudantes, um atrás do outro, foram às redes para alertar sobre erros na correção do exame. Saldo: quase 6 000 afetados diretamente e os 3,9 milhões de jovens que fizeram o Enem em estado de nervos, sem saber se poderiam seguir em frente em um momento tão cercado de expectativas — o da escolha da universidade. Por quatro dias uma decisão judicial ameaçou suspender as inscrições no Sistema de Seleção Unificada (Sisu), no qual o aluno opta pelas faculdades que quer submetendo sua nota no exame — um enrosco finalmente resolvido na terça-feira 28, com a liberação do Sisu pelo Supremo Tribunal de Justiça. Deu-se o alívio, o que não significa uma trégua para o ministro. O episódio foi apenas um abalo, talvez o mais potente, em uma gestão que chama atenção, dentro e fora do governo, pela falta de resultados concretos nesses dez meses em que Weintraub teve nas mãos o leme da educação.

    Um misto de inépcia para o diálogo, filtro ideológico e ausência de bons quadros emperra várias iniciativas que, se postas adiante, poderiam auxiliar na necessária elevação de patamar do Brasil na sala de aula (necessária, diga-se, para o pleno desenvolvimento do país). Na virada do ano, uma leva de técnicos deixou o ministério, parte por ter sido demitida para abrir espaço para gente mais afinada com Weintraub, outra por vontade própria. Os conhecidos arroubos do ministro e o fato de estar cambaleante no posto contribuíram para a revoada. Em certas áreas, os efeitos se fizeram sentir de modo mais acentuado, como na reforma do ensino médio. Muita gente que vinha acompanhando o processo que desembocou na Base Nacional Comum Curricular, documento que propõe uma bem-vinda reviravolta no ultrapassado modelo em vigor, não está mais por lá. E tudo atrasou em uma escala que preocupa quem observa de perto o desenrolar. Hoje, dez dos 26 estados mais o Distrito Federal nem deram a partida em seus novos currículos (veja o quadro abaixo). “O MEC deveria estar funcionando como o grande indutor da mudança”, ressalta João Marcelo Borges, diretor de estratégia política da ONG Todos pela Educação.

    Lição incompleta

     

    Assim, boas ideias vão ficando pelo caminho. Um exemplo é a Política Nacional de Alfabetização, a única meta voltada para o ensino incluída no rol das que deveriam ter sido executadas nos 100 primeiros dias de governo. Passados aproximadamente 400 dias, tudo o que saiu dos gabinetes até agora, além de um seminário, foi um programa para incentivar a leitura em família e a promessa de um cronograma — uma gota diante do oceano de medidas alardeadas para chacoalhar um cenário em que 55% das crianças concluem o 3º ano sem saber ler. “O ministério nunca deixou claro se pretende enviar verbas para estados e municípios, capacitar professores ou mudar os livros didáticos”, sublinha Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais (Ceipe), da FGV.

    Um dos últimos movimentos erráticos de Weintraub sacudiu o Congresso. Depois de quatro anos de visitas técnicas a cidades e estados e debates cheios de idas e vindas, a Comissão de Educação da Câmara havia enfim chegado, em setembro passado, a um projeto de lei, relatado pela deputada Dorinha Seabra (DEM-TO), para a renovação do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica, o Fundeb. É de onde sai o maior quinhão para o financiamento da rede pública. Como o fundo expira já no fim de 2020 e renová-lo envolve trâmite demorado, o clima era de correria — até que Weintraub resolveu puxar o freio de mão. Primeiro, disse que queria reduzir o aporte da União de 40% para 15% do valor do fundo. Em janeiro, e aí veio o pior, avisou que recomeçaria as conversas “do zero”. “O temor geral é que não haja tempo hábil para pôr de pé algo tão complexo”, afirma Cecília Motta, presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Educação (Consed).

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    O Fundeb estremeceu as já tensas relações do ministro com o Congresso e expôs sua inabilidade em fazer costuras. Em algum momento, os parlamentares apreciarão o Future-se, projeto para o ensino superior que é “a menina dos olhos” de Weintraub. O objetivo é mexer nas regras que regem a administração das universidades federais, facilitando o afluxo de recursos privados por meio da criação de fundos. Poderia até ser um avanço na hoje engessada administração do dinheiro nessas instituições, mas tudo sugere que não vai passar pelo crivo do Congresso, nem pelo dos reitores, a quem cabe decidir no fim se abraçam o plano. Nenhuma das duas versões do projeto esclarece como ele funcionaria na prática. Enquanto o tempo se esvai, o Brasil continua no fundo da sala de qualidade, com péssimas notas.

    Publicado em VEJA de 5 de fevereiro de 2020, edição nº 2672

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