“A Marvel é uma religião”, diz Kevin Feige, chefão do estúdio
Executivo da companhia especializada em filmes de super-heróis fala das novas produções do 'Marvelverso' e reflete sobre entretenimento atual
Kevin Feige, 46 anos, é o presidente da Marvel. Mas ele poderia muito bem passar por um cidadão qualquer. Uma das pessoas mais poderosas do cinema atual, ele não dispensa um figurino simples, composto de tênis, calça jeans, camiseta, blaser e um indefectível boné que usa para esconder a calvície precoce. Feige, antes de tudo, é um amante das histórias de super-heróis: ele as defende com unhas e dentes, principalmente no que diz respeito às lições de moral contidas em suas tramas. O executivo foi uma das atrações da CCXP, que aconteceu na semana passada em São Paulo – no evento, a Marvel exibiu trechos da aventura da Viúva Negra. A plateia respondeu com tanto entusiasmo que a primeira pergunta foi se ele tinha intenções de criar algum tipo de culto religioso.
A plateia da CCXP chegou a urrar de emoção quando o senhor entrou no palco. O senhor tem vocação para virar um líder religioso?
Eu? Nunca. Se existe uma religião, ela se chama Marvel. Você, como eu, presenciou a energia do público.
Os Vingadores – Ultimato encerrou uma trilogia de aventuras da Marvel. O que vem a seguir?
Nos últimos anos, trabalhamos em dois projetos. Um deles, que aconteceu mais aos olhos do público, foi a conclusão da saga Vingadores. Os 23 filmes nos quais trabalhamos por tanto tempo chegam à sua conclusão em Ultimato. Mas a gente trabalhou secretamente no que faria para os próximos cinco anos. Porque uma das razões de termos terminado a saga desses heróis foi justamente porque era necessário começar uma nova história. É, basicamente, o que as revistas têm feito com sucesso por 80 anos e nós estamos fazendo há uma década. E nada melhor do que começar com a Viúva Negra. De antemão, sabemos que a história dela chega ao fim em Ultimato, quando faz uma das escolhas mais heroicas da história da saga para salvar a humanidade. Mas, nas aventuras dessa personagem, poderemos saber mais sobre ela numa trama que nunca havia sido contada desde então.
Os westerns e os filmes épicos reinaram por muito tempo em Hollywood e depois chegaram ao fim. O senhor teme que isso possa acontecer com os filmes de super-heróis?
Bem, os filmes de faroeste duraram quatro décadas e volta e meia retornam aos cinemas. A gente está há apenas dez anos no mercado, quem sabe possamos ter a mesma sorte. Faz vinte anos que entrei na Marvel. E no meu terceiro ano de companhia, as pessoas já perguntavam se o público não iria cansar dos filmes de super-heróis. Minha resposta sempre foi a mesma: a gente vai continuar fazendo os filmes que as pessoas desejam assistir. É claro que se as nossas histórias se resumissem a um sujeito que entra num beco e sai dali fantasiado como super herói para evitar o roubo de um banco, não passaríamos de 2005. Mas a Marvel nunca foi assim: a gente tem uma mitologia incrível, que expande o sobrenatural, e com personagens variados – temos aqueles criados no dia-a-dia, os espaciais e que atuam nos mais diferentes períodos de tempo e espaço. Eu sempre acreditei que a gente poderia se dar ao luxo de explorar todos esses universos, com a conivência do público. Por isso que passamos e Vingadores – O Ultimato para Viúva Negra, para Os Eternos… Foi assim que os personagens das histórias em quadrinhos se desenvolveram e é assim que pretendemos seguir no cinema.
George Lucas sempre foi visto como um cineasta “menor” por seus pares pelo apelo pop da franquia Star Wars. Recentemente, Martin Scorsese, um dos maiores nomes do cinema americano, disse que a Marvel “não faz cinema”. Existe preconceito com o que o senhor faz?
Existem dois tipos de público de cinema: as pessoas que se conectam com as histórias de super heróis e as que não estão nem aí para esse tipo de filme. Felizmente, os fãs do que eu faço são a maioria – e elas são exatamente como eu era quando criança. Gosto de George Lucas, me conecto com esse tipo de filme mais do que qualquer outra coisa na minha vida. Eles passaram para mim alguns códigos morais, como diferenciar o certo do errado, como ser uma boa pessoa. Eu aprendi isso assistindo a filmes como Guerra nas Estrelas e sempre vi isso como a coisa mais nobre e importante que alguém possa fazer. Claro que você pode também aprender valores em outras produções cinematográficas, não sou daqueles que depreciam qualquer tipo de filme. Mas gosto da maneira que as pessoas respondem às produções que eu amo, a ponto de esperar pelo final dos créditos de cada aventura.