Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana

Peça censurada sobre Jesus travesti prega amor e respeito

Monólogo defende a tolerância a partir da releitura de textos bíblicos como 'O Filho Pródigo' e o caso da mulher adúltera salva por Cristo do apedrejamento

Por Maria Carolina Maia Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 28 set 2017, 13h08 - Publicado em 28 set 2017, 12h01

Para os que entendem a religião como um caminho para a tolerância, a harmonia e a união dos povos, o monólogo O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu, censurado em Jundiaí por um juiz que viu no texto da dramaturga escocesa Jo Clifford uma iniciativa “atentatória à dignidade da fé cristã”, carrega uma mensagem de viés espiritual. Em pouco mais de uma hora de peça, um Jesus que se assumiu mulher – “Vivia como um homem, a tantos séculos atrás” – relê passagens bíblicas, sempre chamando a atenção do público para aquilo que elas propõem ou que, pelo menos na opinião da britânica Jo Clifford, também ela uma transexual, deveriam propor: perdão, acolhimento e amor.

A criação do mundo narrada em Gênesis, o primeiro livro da Bíblia, é recontada com um discurso de empoderamento, para usar uma palavra cara às minorias. No princípio, era a escuridão. Depois, fez-se a luz, e cada um tem uma luz própria que precisa deixar brilhar.

Pouco depois, Jesus, que na montagem da diretora Natalia Mallo é vivido (ou melhor, vivida) pela atriz trans Renata Carvalho, lembra da máxima “Ama ao próximo como a ti mesmo”, e a confronta com uma cena de discriminação sofrida na rua por uma travesti.

A questão da discriminação retorna mais forte com o episódio da adúltera que é salva por Cristo da morte por apedrejamento – a passagem do Novo Testamento em que é dita a famosa frase, “Quem não tem pecado que atire a primeira pedra”. O texto de Clifford levanta a possibilidade de a adúltera ter na verdade reagido a um estupro ou a um relacionamento abusivo, e lembra outra fala conhecida de Jesus, aquela em que diz que, seja qual for o pecado que a mulher tenha cometido, não se vê melhor do que ela.

Essa é a levada da peça. A cada paráfrase bíblica, é repisada a ideia de que a religião representa respeito e compreensão, e de que viram a costas à Bíblia os que se voltam contra transexuais e homossexuais — que compõem a maioria da plateia. Não há discurso de ódio contra os que discriminam, mas um chamamento à pacificação, o tempo todo.

Continua após a publicidade

Em uma nova versão da parábola do filho pródigo, o filho, que se descobre transgênero, vira filha. Incapaz de aceitar a mudança, o pai expulsa a garota de casa, mas dá a ela um envelope de dinheiro para a sua sobrevivência. A menina, pródiga que é, gasta tudo em festas e vestidos Versace e Chanel. Ao se ver sem recursos e sem amigos – que a abandonaram quando ficou quebrada –, bate na porta de casa. O pai a recebe de volta, por amor, e faz uma festa de arromba com direito a música alta e champanhe.

O compromisso com a transmissão de uma determinada mensagem é tamanho que poderia ameaçar a qualidade artística do espetáculo. Mas Jo Clifford domina o ritmo do texto e insere mudanças repentinas de tom que, além de espanar o catecismo, garantem o humor. Depois de discursar sobre empatia e humildade ao salvar a adúltera do apedrejamento, Jesus vira para ela e diz, “Vem, amapoa”, fazendo uso de uma gíria tipicamente gay que é sinônimo de mulher.

Continua após a publicidade

Leve e ao mesmo tempo provocativo, com direito a um “Fora Temer” no final, O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu merecia um tratamento melhor que o concedido pelo juiz Luiz Antonio de Campos Júnior. Converter Jesus em um travesti, para Jo Clifford, não é uma forma de achincalhá-lo, mas de questionar e reforçar a ideia, presente na Bíblia, da sua onipresença – se está em todo lugar, por que não em um trans?

O juiz de Jundiaí, aliás, acabou dando visibilidade à peça. O monólogo, encenado mais de setenta vezes desde 2016, teve sessão lotada nesta quarta-feira no Sesc Santo Amaro, onde volta a ser representado nesta quinta-feira, antes de seguir para outros palcos. “Nosso trabalho não vai parar jamais”, disse a diretora, Natalia Mallo, ao fim da apresentação desta quarta.

Renata Carvalho em cena da peça
A atriz Renata Carvalho no espetáculo ‘O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu’ (Lenise Pinheiro/Folhapress)
Continua após a publicidade
VINDE A MIM – Renata: “Quem nos ataca não leu a Bíblia, porque Jesus estava do lado dos excluídos”
VINDE A MIM – Renata: ‘Quem nos ataca não leu a Bíblia, porque Jesus estava do lado dos excluídos’ (Lilian Fernandes/)
O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu
Cena da peça O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu (Foto/Divulgação)
Publicidade

Imagem do bloco

4 Colunas 2 Conteúdo para assinantes

Vejinhas Conteúdo para assinantes

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.