Os israelenses vão às urnas nesta terça-feira, 9, para decidir o futuro do país em uma eleição cujo resultado promete ser muito apertado. Apesar dos escândalos de corrupção que envolvem seu nome, das acusações de racismo e de sua política cada vez mais truculenta com os palestinos, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e seus aliados ainda aparecem como os favoritos para formar o novo governo.
O premiê está há dez anos seguidos no comando do país, sustentado pela imagem construída de político forte, capaz de proteger os israelenses das ameaças externas, o que lhe rendeu o codinome de “Mr. Security” – em português, Senhor Segurança. Trata-se de apelido bem menos suave do que Bibi, como sempre foi tratado no seu círculo mais próximo.
Desde o ano passado, contudo, Netanyahu é alvo de fortes críticas pela forma como vem lidando com o conflito na Faixa de Gaza. Foguetes vêm sendo lançados contra Israel do enclave palestino – muitos em reação à truculência do Exército israelense – e parte dos cidadãos israelenses acredita que sua abordagem não foi suficiente para impedir a escalada da violência.
Para alavancar sua campanha nestas eleições, Mr. Secutity decidiu posar como bom diplomata. Bibi serviu como representante de Israel nas Nações Unidas entre 1984 e 1988. Só nas últimas semanas, com ambições mais eleitorais do que diplomáticas, reuniu-se com o presidente americano Donald Trump, em Washington, e com o líder russo Vladimir Putin, em Moscou, e recebeu Jair Bolsonaro em uma visita oficial a Israel. De Trump, conseguiu o reconhecimento formal à soberania de Israel sobre as Colinas de Golã, território sírio ocupado desde 1967, a quinze dias da eleição.
Netanyahu e seu partido, o Likud, concorrem na eleição desta terça-feira contra o ex-chefe do Estado-Maior do Exército, Benjamin Gantz, líder da nova legenda Kahol Lavan. A fim de derrotar o primeiro-ministro, o militar formou uma aliança com outros dois ex-chefes das Forças Armadas, Moshe Yaalon e Gabi Eshkenazi. Também fortaleceu seu partido com o ex-âncora de TV e líder do partido político Yesh Atid, Yair Lapid.
As últimas pesquisas de opinião, divulgadas na sexta-feira 5, mostram o Likud e o Kahol Lavan empatados em número de assentos no Knesset. Uma única sondagem, feita pelo jornal Yediot Acharonot, mostra Gantz à frente, com quatro assentos a mais do que Netanyahu.
Para Noah Slepkov, consultor político e ex-assistente parlamentar do Knesset, os dois principais adversários desta eleição não se distanciam nos principais tópicos eleitorais, como a segurança, a diplomacia e a economia.
“A votação não está focada em pontos específicos da sociedade israelense, mas sim na personalidade dos candidatos”, afirma. “A grande questão é se Netahyanu se reelegerá ou não”, completa Slepkov.
O premiê, contudo, viu sua campanha ser abalada por uma série de escândalos nos últimos meses. Netanyahu está envolvido em acusações de corrupção, fraude e quebra de confiança que podem ter consequências nos resultados e, se vencer, em seu futuro governo.
Ao todo, os investigadores apuram três casos contra Bibi. Em um deles, acreditam que o governo de Netanyahu teria concedido favores correspondentes a milhões de dólares para o Bezeq, o maior grupo de telecomunicações do país, em troca de uma cobertura favorável dos atos de seu governo.
Também é acusado de tentar fechar um acordo com o principal proprietário do maior jornal financeiro do país em troca de uma lei para limitar a distribuição de seu principal concorrente. Em outro caso, os investigadores tentam determinar se alguns milionários deram ao primeiro-ministro e a sua família, em troca de favores financeiros e pessoais, presentes como charutos, garrafas de champanhe e joias.
Prazeres do poder
Gantz criticou o governo “viciado nos prazeres do poder, da corrupção e do hedonismo”. Também acusou Netanyahu de cobrar 16 milhões de shekels (cerca de 17,2 milhões de reais) por ações de uma empresa que se beneficiou da compra, por Israel, de submarinos alemães.
Para a maior parte dos eleitores de Netanyahu, contudo, os escândalos não parecem ter importância. Em um dos maiores redutos eleitorais do Likud em Jerusalém, o mercado Mahane Yehuda, o nome do atual governante está na boca de vendedores e clientes.
“Bibi é o melhor”, diz Ofer Ycwov, dono de bancas de carnes, frutas e especiarias no tradicional mercado de Jerusalém. “As acusações de corrupção não são verdadeiras, foram inventadas para prejudicar ele. Ele é bom para o Estado, para a economia, para a segurança, para tudo”.
Para esse comerciante de 49 anos, Netanyahu tem o que mais falta a seu principal adversário: experiência. “Gantz não é bom o suficiente ainda, não tem o que um bom líder precisa”, afirma.
Itamar, de 24 anos, também declarou seu apoio ao Likud. “Ele (Netanyahu) fala sobre Israel ao mundo e é bom para nós aqui no país”, diz o vendedor da banca de frutas secas. “Ele é muito violento em Gaza, não gosto muito disso. Mas é a melhor opção.”
Aproveitando-se das críticas direcionadas contra Bibi pela sua má gestão em relação à Palestina, o Kahol Lavan também quer levar Israel à dianteira nos processos de paz. Porém, assim como a maioria dos partidos nacionais, essa legenda nova defende a proposta de que Jerusalém deve permanecer unificada como capital israelense e que as Colinas do Golã também sejam parte do território do país. Trata-se de tópicos em disputa e de posições contrariadas pelas Nações Unidas.
Gantz define-se como centrista e promete, por meio de uma nova agenda econômica, reduzir a desigualdade social no país. Porém, acredita que a identidade judaica deva ser preservada em debates sobre o papel do Estado e da religião.
O partido da oposição liderado por ex-chefes do Estado-Maior vem conquistando apoio entre os jovens militares, que tradicionalmente votam pela direita. Em Israel, o serviço militar é obrigatório a todos os cidadãos: dois anos e oito meses para os homens, e dois anos para as mulheres.
O período nas Forças Armadas tende a tornar os jovens mais conservadores, explica o professor de Ciência Política da Universidade Hebraica de Jerusalém e membro do centro de pesquisas Israel Democracy Institute, Gideon Rahat. “Quando saem do Exército e começam seus estudos em universidades, muitos mudam de opinião”, diz.
“Bibi soube sustentar bem o governo até agora e é a melhor opção para todos”, diz um soldado que pediu para não ser identificado.
O rapaz judeu de 18 anos acabou de começar o serviço militar, mas já anda armado com um fuzil pelas ruas de Jerusalém. Ele minimiza as acusações de corrupção contra o primeiro-ministro.
“Existe um ditado em Israel que diz algo como: ‘Um homem sábio não é aquele que não se envolve em problemas, mas aquele que sabe sair deles’. Netanyahu se envolveu com corrupção, mas todos cometem erros. E ele é sábio, vai conseguir resolver”.
Ao seu lado, outro soldado do Exército israelense discorda e diz que votará no Kahol Lavan. “Em dez anos, Bibi não fez nada de positivo para o país e está envolvido em muita corrupção”, diz o soldado de 21 anos, que nasceu em Honduras, mas mora com a família em Israel há cinco anos.
“Acho que Gantz é a melhor opção porque é uma cara nova e foi general. Ele pode melhorar o país e torná-lo mais seguro.”
Identidade religiosa
Na maior parte dos casos, a forma como os israelenses votam pode ser explicada por sua identidade religiosa. “Quanto mais religiosas as pessoas são, mais elas tendem a apoiar os partidos de direita, e quanto mais seculares, mais votam pela esquerda”, explica o professor de ciência política da Universidade Hebraica de Jerusalém e membro do centro de pesquisas Israel Democracy Institute, Gideon Rahat.
Entre os chamados judeus religiosos, israelenses de famílias judaicas que seguem as práticas em seu dia a dia, Netanyhu costuma contar com grande apoio. Já os membros da comunidade Haredi, ou ultraortodoxa, votam nos seus próprios partidos.
É o caso de Yakov, de 32 anos, que vive com os pais. Ele decidiu apoiar o Agudat Yisrael, partido ultraortodoxo que faz parte da aliança Yahadut HaTorah, liderada pelo rabino Yaakov Litzman, atual vice-ministro da Saúde.
“Mas acredito que Netanyhu é um bom primeiro-ministro para o Estado de Israel. Estamos seguros com ele”, pondera Yakov no portão de Jafa, em Jerusalém.