O rosto continua (quase) o mesmo, mas Mickey Mouse chega aos 90 anos de idade neste domingo, dia 18 de novembro, data de estreia de seu primeiro curta lançado comercialmente, O Vapor Willie (Steamboat Willie, no original), em 1928. Quando criou o personagem para substituir Oswald, o coelho, do qual tinha perdido os direitos, Walt Disney não poderia imaginar que o rato com voz fina (feita pelo próprio criador) ia não só durar tantas décadas como representaria o início de um império de entretenimento abarcando animações e filmes live action, parques temáticos, hotéis, séries de televisão e produtos licenciados, além de empresas como a Pixar, a Marvel, a Lucasfilm e em breve a Fox.
Até a primeira semana de novembro deste ano, a companhia tinha arrecadado 2,7 bilhões de dólares só com a bilheteria de onze longas lançados, entre eles Pantera Negra, Os Incríveis 2, Viva – A Vida é uma Festa!, Os Vingadores: Guerra Infinita e Star Wars: Os Últimos Jedi. No ano passado, foram 55,6 bilhões de dólares de faturamento, com patrimônio líquido estimado em cerca de 150 bilhões de dólares.
“Só espero que nunca percamos de vista uma coisa — que tudo começou com um camundongo” (Walt Disney)
O personagem foi um sucesso desde o princípio. Mickey Mouse, otimista, um pouco levado, mas de bom coração, foi perfeito para o período difícil que o mundo atravessaria, com a Depressão de 1929. Numa viagem a Nova York pouco depois do lançamento de O Vapor Willie, Walt Disney recebeu uma oferta de 300 dólares para colocar o personagem em seu primeiro produto: um caderno para crianças, mantido como tesouro no arquivo da companhia, em Burbank, região de Los Angeles, na Califórnia.
Depois disso vieram objetos famosos, como o relógio cujos ponteiros são os braços do Mickey, telefones e as réplicas em pelúcia, que começaram a ser feitos, em 1930, na casa de Charlotte Clark, uma costureira que vivia não muito longe da sede da companhia. A demanda foi tão grande que ela não conseguiu atender, e logo foi preciso contratar uma empresa. As famosas orelhas foram criadas pelo animador Roy Williams, que se inspirou num curta de 1929 chamado The Karnival Kid, em que Mickey Mouse tirava o topo da cabeça como se fosse um chapéu. Em princípio, elas eram feitas a mão. Agora, há dezenas de modelos à disposição. Hoje, os produtos licenciados faturam cerca de 1 bilhão de dólares por ano.
Mickey Mouse e O Vapor Willie eram tão caros a Walt Disney que ele manteve uma cópia original do roteiro, um dos primeiros storyboards de que se tem notícia, na gaveta do escritório, que é mantido nos arquivos como ele deixou quando morreu, em 1966.
“Acho que Mickey é um personagem com quem todo o mundo gostaria de passar um tempo. Por isso ele e tão popular”, diz Mary Walsh, diretora do setor de pesquisa da Disney
As origens do personagem são pouco claras porque Disney gostava de mudar a história: podia ter criado Mickey Mouse numa viagem de trem, ou visto um rato correr por sua prancheta. Mas seu princípio está bem documentado visualmente na biblioteca da companhia, que contém milhões de desenhos, modelos e pinturas desde os primeiros rascunhos do personagem. No total, 65 milhões de peças físicas da produção de animações do estúdio estão guardadas neste acervo, em Glendale, Los Angeles — 1,2 milhão delas foram fotografadas e estão disponíveis digitalmente para pesquisa de pessoas que trabalham na companhia, com o intuito de preservar o amplo acervo, composto em sua maior parte de material delicado.
“Durante muito tempo, esta foi nossa arma secreta, porque muitos dos estúdios de Hollywood simplesmente se desfizeram de seu passado”, diz a VEJA Mary Walsh, diretora do setor de pesquisa em animação da Disney. “Mas manter as origens de Mickey Mouse ajuda os artistas e funcionários da companhia a serem constantemente inspirados por ele.”
Os retoques na imagem do personagem ao longo dos anos também eram parte do espírito Disney. “Walt não tinha medo de mudanças. Se ele estava fazendo alterações era porque estava interessado. O que ninguém queria era ouvir seus dedos batendo no braço da cadeira, sintoma de que ele estaria entediado.”
Em certos casos, é mais do que inspiração: os envolvidos no curta Hora de Viajar! (2013), que concorreu ao Oscar, mergulharam nos arquivos do estúdio para recriar nos dias de hoje os desenhos do passado (veja abaixo o curta). O mesmo fizeram as equipes dos curtas feitos para o YouTube e a série Mickey: Aventuras sobre Rodas. Esses trabalhos deixam claro, aliás, que o personagem pode ter várias caras diferentes, evoluindo ao longo dos anos e tendo até versões diferentes ao mesmo tempo. O que nunca muda é sua personalidade. “O que manteve Mickey Mouse tão popular nesses anos todos foi seu espírito”, conta o animador Eric Goldberg, que está no estúdio desde os anos 1990. “Ele é engenhoso, é brincalhão, está sempre do lado do bem, mas também é levado.” É um otimista, o que sempre vem a calhar em momentos difíceis.
A comemoração dos 90 anos começou em grande estilo, com o lançamento de um livro de luxo pela editora europeia Taschen, com exclusivos 995 exemplares à venda por 200 dólares cada (cerca de 750 reais), e uma exposição em Nova York, além de inúmeros itens especiais de colecionador que chegam ao mercado. Confira a seguir uma linha do tempo do personagem, seus momentos mais marcantes, curtas-metragens e imagens da mostra.