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Apresentado por:
ESTUDO #32

Ecoinovação – O grande impulso para a sustentabilidade

por Da Redação Atualizado em 29 set 2023, 12h38 - Publicado em
29 set 2023
13h00

Apresentação

Segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), ecoinovação é a criação ou aprimoramento de uma ferramenta que resulta na redução do impacto ambiental, seja esse efeito intencional ou não. Os termos inovação verde e inovação ambiental têm sido utilizados nesse mesmo sentido, e valem para invenções tecnológicas (novos produtos ou processos produtivos) ou não (métodos de marketing, mudanças organizacionais ou institucionais).

Chamar a atenção para a importância da ecoinovação é correr o risco de chover no molhado, mas a falta de investimentos na área no Brasil sugere o contrário. Uma pesquisa realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) com 2 236 gestores de empresas entre os dias 1 e 10 de janeiro de 2023 mostra que menos da metade das indústrias brasileiras têm projetos ou plano de ação formal em ecoinovação. De acordo com o levantamento, apenas 30% delas têm trabalhos em execução e outras 17% estão com projetos aprovados para serem iniciados. Os dados revelam também que 28% das empresas estão realizando estudos iniciais sobre o tema e 19% não realizam nenhuma ação de ecoinovação no momento.

No passado, o movimento ambientalista bateria na tecla de que as empresas precisam fazer algo a respeito do aquecimento global para garantir a vida no planeta Terra no futuro. E isso é mesmo verdade, mas hoje está claro que a própria indústria que arrisca sua sobrevivência, muito antes da humanidade se extinguir, se não achar maneiras de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, seu consumo de água e geração de resíduos.

De um lado, os eventos climáticos extremos (como estiagens, secas, enxurradas e inundações) já ocasionaram prejuízos privados, até 2019, da ordem de R$ 7 bilhões à indústria no Brasil, segundo o Banco Mundial. A cifra foi calculada em cima de dados ligados à disponibilidade de água, flutuações nos preços e na disponibilidade de combustíveis e energia elétrica, disrupções no fornecimento de insumos de origem agrícola, interrupções logísticas por fatores climáticos na terra, no mar e no ar, danos provocados aos ativos da empresa em função de eventos climáticos extremos, entre outros.

Mas investir em ecoinovação não se trata somente de tentar reverter o aquecimento global. Trata-se de adicionar valor aos produtos que vende, e aumentar a própria competitividade no mercado global. Uma análise dos dados relativos ao comércio internacional mostra que em 2018 o valor das exportações com alto teor de patenteamento verde, ou seja, com inovações ambientais recentes, ultrapassou a barreira dos 50% do total de bens comercializados entre países do mundo todo, e continua crescendo.

E quando se verifica a origem desses produtos, nota-se que há uma relação forte e positiva entre o PIB per capita dos países e indicadores de competitividade verde. Quanto maior o percentual de exportações com ecoinovações embutidas, maior tende a ser o desenvolvimento econômico. Essa associação pode ser explicada pelo fato de que a grande quantidade de produção de conhecimento na estrutura produtiva torna as economias mais complexas e, portanto, valiosas. O investimento em ecoinovação cria um ciclo virtuoso ao criar mais riqueza, que permite dedicar mais recursos à pesquisa e desenvolvimento, e assim sucessivamente. E o meio-ambiente agradece.

A boa notícia é que há um grupo de empresas brasileiras que já percebeu isso e está na vanguarda do investimento em tecnologia verde. Cerca de 500 empresas nacionais formam a Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), onde trocam informações e discutem políticas para fomentar a pesquisa e desenvolvimento no Brasil. Setenta e oito porcento delas têm planos de ação ou projetos de ecoinovação em andamento; outros 7% têm projetos aprovados, mas não iniciados; 9% estão em fase de estudos; e apenas 5% não realizam nenhuma ação nesta área. Elas encontram dificuldades para levar adiante seus projetos, a começar pela falta de trabalhadores qualificados para atuar com o tema. As restrições orçamentárias (33%) são a principal barreira para a qualificação de profissionais para trabalhar com ecoinovação. Na sequência, aparecem a necessidade de investir em outras áreas estratégicas (29%), estrutura/cultura da empresa (18%), limitação de tempo disponível para treinamento (20%) e baixo engajamento dos funcionários (12%). Mas há esforços para reverter o quadro: 76% dos entrevistados afirmaram que têm apostado em treinamento de funcionários; 31%, na participação em redes colaborativas; e 24% na terceirização de projetos, funções e iniciativas de tecnologia da informação e comunicação (TIC) para avançar com a agenda.

Nas próximas páginas, VEJA INSIGHTS, em parceria com a Confederação Nacional da Industria, traz um mergulho nas possibilidades e vantagens da ecoinovação no Brasil e no mundo, além de mostrar casos concretos de empresas brasileiras que estão colhendo os frutos de seus investimentos na área. Boa leitura!

Ecoinovação abre caminho para o crescimento sustentável

ROBSON BRAGA DE ANDRADE

ROBSON DE ANDRADE: empresário e presidente da CNI
ROBSON DE ANDRADE: empresário e presidente da CNI (CNI/Divulgação)

O avanço das mudanças climáticas está intensificando o desenvolvimento de tecnologias e soluções voltadas à conservação dos recursos naturais e à redução das emissões de gases de efeito estufa. Essa corrida mundial de investimentos em ecoinovação é fundamental para conter o aquecimento do planeta, e para impulsionar o crescimento econômico e social das nações.

Algumas indústrias brasileiras já perceberam que a combinação entre inovação e sustentabilidade tem um papel essencial na descarbonização da produção. Também é uma estratégia eficiente para atender a crescente demanda por bens e serviços de baixo impacto ambiental, e para encarar a acirrada concorrência internacional.

Por isso, essas empresas estão investindo na criação de produtos de origem natural; na gestão eficiente de resíduos; em processos produtivos mais limpos, que racionalizam o uso de energia, água e matérias-primas; e em outras iniciativas verdes. Nossa expectativa é que, cada vez mais, a ecoinovação passe a fazer parte dos planos estratégicos das indústrias e do desenvolvimento econômico e social do país.

“Nossa expectativa é que, cada vez mais, a ecoinovação passe a fazer parte dos planos estratégicos das indústrias e do desenvolvimento econômico e social do país.”

Uma pesquisa realizada em 2021, sob encomenda da Confederação Nacional da Indústria (CNI), mostra que 81% das empresas entrevistadas consideram importantes as boas práticas ambientais, sociais e de governança corporativa (ESG). Além disso, 55% esperam aumentar os investimentos em ações sustentáveis nos próximos anos.

O Brasil, dono de um extraordinário patrimônio natural e com grande aptidão para a produção de energias renováveis, pode ser um dos líderes globais da econoinovação, da indústria verde e da economia de baixo carbono.

Estudo elaborado pela Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) para a CNI destaca que o país oferece oportunidades promissoras para inovações nas áreas de economia circular, bioeconomia e energias renováveis. Há, ainda, possibilidades ímpares para o desenvolvimento de tecnologias e de soluções industriais para mobilidade urbana e para agricultura e silvicultura.

No entanto, para transformar essas vantagens comparativas em ganhos reais de competitividade, devemos explorar de forma estratégica as nossas potencialidades. Necessitamos implementar um plano abrangente e de longo prazo que apoie a pesquisa e a inovação, e que esteja atrelado a uma política industrial moderna, com metas factíveis e previsibilidade de recursos.

Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Coreia do Sul e outras economias avançadas têm adotado programas robustos de incentivos ao desenvolvimento tecnológico e à descarbonização da economia. Na Alemanha, por exemplo, o Pacote para o Futuro, que tem recursos de US$ 45 bilhões, prevê apoio a projetos verdes, principalmente nas áreas de energia e transporte. A Coreia do Sul está destinando US$ 48 bilhões para o desenvolvimento de veículos elétricos e híbridos, energias renováveis e eficiência energética.

É nessa direção que o Brasil precisa caminhar mais rapidamente. Com políticas públicas e ações consistentes do governo e da iniciativa privada para promover a ecoinovação, o país poderá ter uma indústria mais competitiva, crescer de forma sustentada e tornar-se uma potência mundial em economia verde.

O ciclo virtuoso

VALOR AGREGADO - Montadora de carros elétricos na Alemanha: lucro e sustentabilidade
VALOR AGREGADO – Montadora de carros elétricos na Alemanha: lucro e sustentabilidade (Sean Gallup/Getty Images Europe/.)

Não faz muito tempo que o movimento ambientalista era visto como anti-indústria – uma parte dele de fato o era – e que um grande naco do empresariado respondia aos ataques com desprezo pela natureza e pouco caso com o aquecimento global. O tempo trouxe os campos antagônicos para uma convergência fundamental: o caminho para relação harmoniosa entre o homem e o planeta Terra passa, necessariamente, pela indústria. Só ela pode trazer os níveis de emissão de gases do efeito estufa a níveis aceitáveis na velocidade necessária, sem causar uma crise econômica também catastrófica. Na verdade, o desenvolvimento de tecnologias verdes – a ecoinovação – está se provando um motor formidável para o crescimento da competitividade e do comércio nos países que investem nela. “Não cabe mais dizer que o futuro é verde; a indústria sustentável já é o grande vetor de crescimento econômico no mundo hoje”, afirma Gianna Sagazio, Diretora de Inovação da CNI.

Em linhas gerais, a principal razão para a ecoinovação impulsionar o crescimento do PIB é o que os economistas chamam de dupla externalidade. O termo define os efeitos colaterais – bons ou ruins – de uma decisão ou atividade sobre aqueles que não participaram dela. Nesse caso, ela é dupla porque todas as externalidades ambientais negativas são reduzidas, ao passo que as positivas da inovação são potencializadas. O aumento do conhecimento e aprendizados na economia gera um ciclo virtuoso entre sustentabilidade e desenvolvimento, geração de renda, emprego e inserção competitiva. Os investimentos na construção de capacidades tecnológicas e inovativas, bem como na formação, qualificação e requalificação de trabalhadores estão fortemente interconectados no que diz respeito às possibilidades de inclusão produtiva, geração de empregos decentes e estratégias competitivas. A construção de capacidades contribui para fortalecer a indústria instalada no país, estimulando sua competitividade e evitando que parte dos postos de trabalho e renda gerados se direcionam para o exterior por meio de importação de tecnologias verdes.

A teoria faz sentido, mas ela se comprova na prática? Os estudos da área concluem que sim. Uma análise sobre os dados do comércio internacional mostra com clareza que os setores e países que mais apresentam ecoinovação são mais competitivos. Em 2018, pela primeira vez, produtos que apresentam alto nível de patenteamento verde (uso de tecnologias registradas que reduzem o impacto ambiental) ultrapassaram a marca dos 50% das exportações (em valor) em todo o mundo. Ou seja, aqueles produtos que estão entre os 20% com maior proporção de ecoinovação em sua composição já são dominantes no comércio mundial. Esses dados corroboram com a tendência de aceleração da corrida tecnológica verde mundial.

arte gráfico

O uso dos dados de comércio internacional para se comprovar a relação entre ecoinovação e desenvolvimento econômico é interessante porque as empresas exportadoras estão entre as mais competitivas em cada país, há informação padronizada e altamente desagregada para comparação de níveis de competitividade das indústrias no Brasil e no mundo, e a diversificação da pauta de exportações rumo a setores de maior complexidade está associada à elevação da complexidade da economia, o que está relacionado à maior crescimento do PIB.

O fenômeno fica claro quando se destrincha o desempenho competitivo e ambiental de setores industriais no Brasil e os compara com a China (a grande economia que mais cresceu nos últimos 20 anos) e os Estados Unidos (o maior PIB do planeta).

O número total de setores competitivos da indústria norte-americana vem se mantendo relativamente estável em torno de 70. No Brasil, isso tem oscilado entre 50 e 60 ao longo do período analisado. A cifra é inferior em relação à China, mas o grande ponto de atenção reside na estagnação da diversificação competitiva da economia brasileira, o que pode representar desafios para o desenvolvimento econômico de longo prazo do país.

Do ponto de vista do esverdeamento das indústrias, ou seja, do grau de patenteamento de tecnologias verdes nas indústrias (indústrias do quintil superior em termos de percentual de patentes verdes), observa-se que a maioria dos setores competitivos da China (55%) e dos Estados Unidos (56%) apresentam grau alto ou médio-alto de esverdeamento. Na China, há uma clara tendência de aumento progressivo do número de setores competitivos com alto esverdeamento nas duas últimas décadas – passou de 16 em 1990 para 30 em 2018. Nos Estados Unidos, é possível observar oscilações no período e uma queda recente, de 2001 até 2018, de 29 para 22 setores competitivos com alto esverdeamento, mas ainda assim com um número importante de setores. No caso do Brasil houve uma redução entre 2004 e 2009, seguida por uma relativa estabilidade desde então. Não deveria espantar que a economia brasileira andou de lado na última década.

arte ecoinovação

A estreita relação entre ecoinovações e competitividade das empresas da indústria brasileira pode ser explicada pela interrelação entre desempenho ambiental e desempenho competitivo. A correlação, ou seja, a força da relação entre o número de empresas que realizam ecoinovações na indústria de transformação e o número de empresas que apresentam impacto competitivo no setor é extremamente alta, sendo de 99% para manutenção da participação da empresa no mercado, 99% para market share e 97% para abertura de novos mercados.

Essa forte correlação pode ser explicada por fatores que são considerados preditores da competitividade, incluindo 99% para melhoria da qualidade dos produtos, 99% para aumento da flexibilidade de produção, 99% para redução dos custos de produção, 96% para redução do consumo de matéria-prima e 96% para redução do consumo de energia. Em outras palavras: o investimento em ecoinovações está fortemente relacionado ao bom desempenho econômico de um país e sua indústria.

Entrevista: Roseli Mello

RADAR DE IDEIAS - Natura abre portas para inovação da academia, startups e fornecedores
RADAR DE IDEIAS – Natura abre portas para inovação da academia, startups e fornecedores (Marcos Sugüio/.)

A Natura foi fundada em 1969 já tendo a inovação como linha mestra dos negócios. Nunca se desviou dessa rota, mesmo em momentos de crise, e hoje é presença certa em rankings de empresas mais sustentáveis, mais inovadoras e também mais bem sucedidas: com a aquisição da gigante Avon, em 2020, se tornou o quarto maior grupo empresarial do setor de beleza do mundo.

Às vésperas de sua participação como painelista no 10º Congresso Internacional de Inovação da Indústria , a líder global de pesquisa e desenvolvimento da Natura, Roseli Mello, falou por telefone a VEJA INSIGHTS como mantém a ecoinovação no centro do modelo de negócio da companhia e qual o segredo para atrair os melhores cérebros do país para o ramo dos cosméticos.

Há décadas que se diz que o consumidor exige produtos de empresas com responsabilidade ambiental, mas na prática o preço e a qualidade sempre falaram mais alto no ato da compra. Isso está mudando? Ninguém compra um shampoo que não lave e trate bem os cabelos só porque ele é ecoeficiente. A necessidade primária tem que ser atendida por qualquer produto. Mas, principalmente depois da pandemia, quando ficou muito claro a interdependência das coisas, e que é impossível se proteger dos efeitos das calamidades sozinho, as pessoas estão procurando produtos mais ecológicos. Claro que o entendimento do que é ecológico varia muito, mas eu vejo como um imperativo para a indústria, hoje, que ela entregue esse valor para seus consumidores.

E a indústria brasileira está buscando tornar seus produtos mais verdes? Eu acredito que sim. A gente vê muitas empresas com discurso nessa direção. Na Natura, o investimento em sustentabilidade e inovação é basicamente parte do nosso DNA. Crescemos apostando nisso em um tempo onde não se falava nada de ecologia no mundo corporativo. Fomos pioneiros em várias ações que demonstram esse compromisso, como no oferecimento de refil há 40 anos. As companhias precisam dar certo como negócio, e hoje, para dar certo, você precisa investir em tecnologia, ecoinovação, soluções mais circulares e até em regeneração ecológica ou natural.

O investimento em ecoinovação é fundamental por uma questão econômica ou reputacional? Eu tenho muito orgulho de dizer que eu trabalho numa empresa que é muito bem sucedida do ponto de vista econômico. E isso faz com que a gente consiga mostrar que é possível trabalhar em prol do impacto positivo para toda a cadeia, desde fornecedores até a rede das consultoras que distribuem o nosso produto, pensando e tendo como base princípios de ecoinovação. Não vemos os desafios socioambientais como um pedágio. A Natura tem mais de 250 pesquisadores que têm como diretriz de desenvolvimento o impacto positivo para a cadeia inteira. Não só na Pesquisa e Desenvolvimento, mas também na maneira como trabalhamos com as nossas consultoras, com as comunidades extrativistas que desenvolvem conosco novos bioativos… A roda da bioeconomia tem que trazer prosperidade para a empresa e para toda a rede de fornecedores, de consumidores, de consultoras que se relacionam com ela. Se não, não tem futuro.

O Brasil tem vantagens comparativas em relação a outros países na bioeconomia? A gente tem uma matriz energética limpa, uma riqueza de biomas ainda preservados, e uma biodiversidade ímpar. Tem a possibilidade de ter carbono a um custo muito menor quando a gente fala de mercado de carbono. Toda essa transição para uma economia verde é mais difícil para quem não tem essas características. Devemos aproveitar esse momento único de rearranjo da economia mundial para coordenar políticas públicas, sociedade, empresas, toda a parte de pesquisa e desenvolvimento e juntar essas forças para fazer esse movimento.

Por que o país não é o líder mundial na área? Realmente o Brasil não vem aproveitando tudo isso. Faltam políticas públicas e investimentos em inovação consistentes. Muda tudo o tempo todo. As leis de incentivo, as regras de acesso aos fundos de investimento… inovação e tecnologia se faz com investimentos constantes e previsíveis. O país tem institutos de pesquisa e profissionais excelentes que precisam estar conectados e trabalhar junto com a indústria para que a gente consiga implementar, em grande escala, as soluções que a ciência vai descobrindo nos mais variados lugares. A Natura é uma empresa brasileira, a maioria dos nossos profissionais são brasileiros, mas estamos sempre conectados a uma rede global de inovação, de pesquisa. A tecnologia também passa pela interdependência.

Estamos falando muito de tecnologia, mas a Natura também faz ecoinovação no relacionamento com todos os elos da cadeia. A empresa desenvolveu uma maneira de fazer produtos que envolve uma rede de fornecedores para além dos convencionais. Conseguimos conciliar desenvolvimento científico com os saberes tradicionais das populações, por exemplo, que vivem na Amazônia. Isso tem feito com que a gente descubra bioativos exclusivos, bastante eficazes e potentes, e aí a gente transforma tudo isso em produto. Nesse ciclo a gente consegue deixar valor na cadeia inteira. Repetimos sempre que aqui só é inovação aquilo que gera impacto positivo. Desde a prospecção dos ingredientes até a criação das fórmulas, não utilizamos testes em animais sob hipótese nenhuma. Criamos fórmulas de alto teor de ingredientes naturais e a nossa relação com as populações originais faz com que todo esse conhecimento que é compartilhado entre nós volte para a comunidade na forma de benefícios.

Como vocês aferem esses benefícios? A Natura lançou em 2022 o IP&L (Lucro e Prejuízo Integrados, na sigla em inglês), que monetiza todas as nossas atividades, não só do que considerando que traz impacto positivo, mas também considerando tudo que a gente traz impacto negativo. Através desse índice, a gente vê que cada 1 real investido pela Natura retorna 2,70 reais em benefícios socioambientais. A medição faz com que a gente saiba exatamente onde atuar para aumentar o impacto – nós queremos chegar a 4 reais até 2030.

Vocês trabalham com metas? Claro! Temos metas públicas e corremos atrás delas. É comum não sabermos o que precisamos fazer para atingir a meta que nos colocamos, mas ela serve como um motor que faz com que estejamos sempre andando em direção à regeneração e ao impacto positivo.

Uma pesquisa realizada pela CNI mostrou que o maior obstáculo para as empresas investirem em ecoinovação é a falta de mão de obra qualificada. Como a Natura lida com esse problema? Nós somos muito atrativos enquanto empresa. Temos dois centros de inovação – um aqui em Cajamar (SP) e outro em Benevides (PA) – que formam um dos parques tecnológicos mais modernos da América Latina, e trabalhamos com inovação aberta. Temos uma boa reputação que atrai muito o jovem que busca um propósito. Fazemos convênios com universidades para trabalhar aqui como bolsistas, que é uma excelente porta de entrada para pessoas graduadas, pós-graduadas, doutores e PHDs. Formamos muita gente. Temos também preocupação com inclusão, e hoje 75% dos nossos cientistas e pesquisadores são mulheres. As pessoas querem trabalhar com inovação e com propósito, e encontram aqui uma boa opção.

O que é a inovação aberta? Vou explicar na prática. Começamos em 2006 com um programa chamado Natura Campus, que organizava a nossa relação com as universidades e institutos de ciência e tecnologia. Também fomos evoluindo na maneira de nos relacionarmos com fornecedores e com startups para conseguir absorver as ideias e inovações que vêm daí. Nosso sistema é: não sabemos tudo, e buscamos a melhor solução onde quer que ela esteja. Promovemos desafios à comunidade, fizemos há pouco tempo sobre “zero resíduo” que teve participantes de 300 países, e conhecemos muitas soluções super bacanas em diferentes níveis de TLR (nível de maturidade tecnológica, na sigla em inglês). Nossos pesquisadores têm que ser radar, tem que ser funis abertos e permeáveis à entrada de ideias e soluções em qualquer etapa do processo, desde o briefing até a elaboração da solução final. Esse modus operandi certamente faz com que a gente ande muito mais rápido e consiga ter um alto retorno sobre o investimento, partindo do princípio da interdependência e da colaboração. Quando nos abrimos para as ideias de onde quer que elas venham, acontecem coisas muito legais.

Brasil faz mais com menos

INTELIGÊNCIA - Projeto do Senai: país inova mesmo com pouco investimento
INTELIGÊNCIA – Projeto do Senai: país inova mesmo com pouco investimento (SENAI/Divulgação)

O Brasil tradicionalmente goza de boa reputação internacional quando se trata de sustentabilidade. Nem tanto quando o assunto é desenvolvimento tecnológico. Há que se celebrar, portanto, a notícia de que o Brasil subiu cinco posições no Índice Global de Inovação (IGI) de 2023, na comparação com o ranking de 2022. O país ocupa agora a 49º posição entre 132 países, passando o Chile para assumir como primeiro colocado na América Latina.

A classificação é divulgada anualmente, desde 2007, pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (WIPO, na sigla em inglês), em parceria com o Instituto Portulans e o apoio de parceiros internacionais – no caso do Brasil, a CNI e a Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), parceiras na produção e divulgação do IGI desde 2017.

arte ranking latinos

O índice é calculado a partir da média de dois subíndices. “Insumos de inovação” avalia os elementos da economia que viabilizam e facilitam o desenvolvimento de atividades inovadoras, agrupados em cinco pilares: Instituições; Capital humano e pesquisa; Infraestrutura; Sofisticação do mercado; e Sofisticação empresarial. “Resultados de inovação” capta o resultado efetivo das atividades inovadoras no interior da economia e se divide em dois pilares: Produtos de conhecimento e tecnologia; e Produtos criativos.

O Brasil se sai muito melhor nos Resultados, em que ficou em 49º, do que nos Insumos, onde amargou a 59ª posição. Isso é um sinal de que os agentes do ecossistema de inovação brasileiro (pesquisadores, empresas e governo) conseguiram gerar mais produção científica, patentes, novos produtos, serviços e processos do que no ano anterior, mesmo tendo um ambiente e condições mais adversos para tal. “A brusca queda no orçamento público de investimento em ciência, tecnologia e inovação inviabiliza o fomento à projetos de pesquisa e desenvolvimento para novas demandas da sociedade e, ainda mais grave, interrompeu inúmeros projetos de pesquisa científica e tecnológica, inclusive de empresas brasileiras, que dependem de financiamento regular e previsível para fornecerem os resultados esperados”, lamenta Gianna Sagazio, diretora de Inovação da CNI.

arte ranking melhores

Honrando a sua tradição de sustentabilidade, o Brasil se destaca por ter uma participação maior de patentes verdes em relação ao total em comparação às principais economias do mundo (16,1% no Brasil versus 14,9% nos EUA, 14,3% na UE e 15,3% na China). Com apoio institucional e financeiro mais consistente, o país tem tudo para escalar o ranking até o topo nos próximos anos.

Onde os inovadores se encontram

LIDERANÇA - Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, prestigia o Congresso
LIDERANÇA – Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, prestigia o Congresso (Iano Andrade/CNI/.)

O símbolo universal das ideias é uma lâmpada. Nos desenhos animados, ela aparece sobre a cabeça do personagem normalmente sozinho, seja no banho ou em sua escrivaninha. No mundo real, é bem diferente. As ideias crescem e ganham força ao circular. É no encontro que se trocam as inspirações e conhecimento que trazem o lampejo. Foi para isso que especialistas brasileiros e estrangeiros em inovação voltada para a sustentabilidade se reuniram nos dias 27 e 28 de setembro, em São Paulo, no 10º Congresso Internacional de Inovação da Indústria.

Idealizado pela Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), e realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o Congresso trouxe empresários, representantes do governo e da academia para discutir tecnologia verde, políticas públicas, financiamento, bioeconomia, descarbonização, e tudo o mais que gira em torno do tema do evento: ecoinovação.

Ao final do evento, os organizadores apresentaram uma proposta de diretrizes para a criação de uma Estratégia Nacional de Ecoinovação voltada para a indústria brasileira.

O documento sinaliza que, embora a indústria brasileira tenha capacidade de inovar, são necessárias políticas públicas para o país ocupar a posição de liderança verde global. Para impulsionar a ecoinovação na indústria é necessário investir em políticas públicas, que serão capazes de revitalizar o setor produtivo e as cadeias a ele integradas. A partir disso será possível criar mais empregos, renda e expandir a economia do Brasil.

No painel de lançamento das propostas, o presidente da GranBio e integrante da MEI, Bernardo Gradin, destacou o impacto das drásticas mudanças climáticas e o movimento das principais economias do planeta para desenvolver políticas que impulsionam a competitividade verde. É o caso dos Estados Unidos, cujas políticas superam US$ 1 trilhão, o maior direcionamento de recursos públicos para a agenda sustentável já realizado pelo país. A China, por sua vez, tem como metas atingir o pico de emissões em 2030 e a neutralidade de carbono até 2060. “Após a pandemia, surge uma nova ordem mundial geopolítica e comercial que terá como principais eixos a transição energética em resposta à mudança climática e uma onda de estímulos públicos e subsídios, via preço de carbono para reintegração de cadeias produtivas como defesa de mercado e política de desenvolvimento protecionista”, pontuou Gradin. “Vivenciaremos novos paradigmas sem precedentes nos modelos de negócios, comércio exterior e na competitividade dos países, e uma palavra vai ganhar cada vez mais importância estratégica: a ecoinovação”.

CONEXÕES - Milhares de pessoas atenderam ao Congresso presencialmente ou online
CONEXÕES – Milhares de pessoas atenderam ao Congresso presencialmente ou online (Daniela Luquini/CNI/.)

A estratégia, que combina interesses públicos e privados, se baseia nos seguintes fundamentos: a responsabilidade pelas mudanças climáticas e os custos econômicos do não enfrentamento da emergência climática; as novas políticas de desenvolvimento que impulsionam a competitividade verde; a aceleração da corrida tecnológica; as vantagens do Brasil em relação ao restante do mundo, como a biodiversidade, no cenário da ecoinovação; e o desempenho de uma série de empresas brasileiras no tema da ecoinovação.

Para Gradin, a estratégia busca assegurar um ambiente regulatório adequado, com investimentos governamentais aliados ao compromisso do setor industrial com o aumento da produtividade e da competitividade, sempre em bases sustentáveis. “Priorizando a agenda de ecoinovação, o Brasil vai avançar na construção de uma imagem positiva para o mundo, de país referência no desenvolvimento e na oferta de soluções verdes”, frisou.

A proposta de diretrizes compõe uma visão de longo prazo pautada no conceito de missão de Estado, com mecanismos de estímulo e recompensa ao investimento privado. O documento também propõe uma política de fomento à ecoinovação, com o objetivo de ser referência para o cumprimento das metas e compromissos climáticos, além de tornar a indústria brasileira reconhecida globalmente como a mais inovadora em soluções sustentáveis.

Outros objetivos da estratégia são valorizar a biodiversidade brasileira enquanto vantagem competitiva, promover a transição para uma economia circular de baixo carbono e fortalecer a academia brasileira, sobretudo no que diz respeito a produzir conhecimento de impacto.

Entre as ações estratégicas para acelerar a ecoinovação na indústria brasileira, foram definidas as seguintes prioridades:

  • Criação de um mercado regulado de carbono;
  • Harmonização regulatória quanto ao acesso à biodiversidade amazônica;
  • Desenvolvimento de uma taxonomia sustentável para investimentos verdes no país;
  • Visão de escala ao fomento à ecoinovação na indústria brasileira por meio de estímulos financeiros e tributários;
  • Formação de profissionais para trabalharem na indústria verde;
  • Ampliação do compartilhamento de risco tecnológico entre academia, institutos de pesquisa aplicada e setor empresarial;
  • Promoção da cooperação internacional para solucionar problemas globais.

Só o esforço coletivo de todos os agentes do ecossistema da inovação pode acender todas as lâmpadas e ideias que o Brasil precisa para iluminar seu futuro.

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