A VEJA, porta-voz detalha expectativas para encontro de Biden e Bolsonaro
Segundo Kristina Rosales, do Departamento de Estado dos EUA, governo deseja medidas concretas no combate ao desmatamento antes de um possível acordo
A IX Cúpula das Américas começa nesta quarta-feira (8) em Los Angeles, nos Estados Unidos, sob uma nuvem de críticas por parte dos líderes dos países do continente de que o governo do presidente Joe Biden dá pouca atenção à região.
Poucas horas antes da Cerimônia Inaugural da Cúpula, oferecida pelo presidente Biden e pela primeira-dama Jill Biden, VEJA conversou com Kristina Rosales, porta-voz do Departamento de Estado dos Estados Unidos sobre as expectativas do governo americano para o evento.
A decisão dos Estados Unidos de não convidar países considerados não-democráticos para a Cúpula, e o boicote ao evento por parte de alguns países acabou jogando o tema Democracia para o centro do debate nos últimos dias. Isso atrapalha as discussões na Cúpula?
Estamos cientes de que alguns presidentes preferiram não participar da Cúpula, como é o caso do presidente do México. E há outros países que decidimos não convidar: Cuba, Venezuela e Nicarágua. Nosso objetivo como Cúpula é que todos cumpram a Carta Democrática Interamericana. Os países que participam da Cúpula precisam ser democráticos, e esses 3 países não são. Isso não significa que não tenhamos representantes destes países: há pessoas da sociedade civil e do setor privado que já estão aqui participando dos eventos e reuniões.
Os próximos dias serão um pouco mais carregados de conversas entre chefes de Estado, como é o caso da reunião entre o presidente Biden e o presidente Bolsonaro. O presidente Biden tem 5 temas específicos para discutir com os líderes do continente: prosperidade econômica, crise migratória, crise climática, crise sanitária/COVID, e segurança alimentar.
O que os Estados Unidos esperam que saia de concreto desses encontros?
Os Estados Unidos vai dar apoio econômico para lutar contra a pobreza e a fome, que estão crescendo no continente. Temos programas que já existem, como o USAID e o Feed the Future, que receberão mais investimentos. Esperamos anunciar mais detalhes nos próximos dias. Sobre a crise climática, as conversas na Cúpula vão priorizar a situação nas ilhas do Caribe, que são hoje as mais afetadas com a subida no nível do mar.
Sobre o pacote econômico, é mais abrangente e complexo. Ontem anunciamos um investimento de 1,9 bilhão para melhorar a vida das pessoas da América Central, onde a questão da imigração é mais acentuada. Não é só investimento financeiro, mas também criação de empregos por parte de empresas americanas e multinacionais nesses países.
Bolsonaro tem atacado o processo eleitoral brasileiro. Em uma Cúpula voltada à democracia, como isso é visto?
O tema Democracia vai sempre ser um importante pano de fundo. Vai fazer parte de todas as conversas feitas aqui na Cúpula. O governo americano sabe que o sistema eleitoral brasileiro funciona. Já houve várias eleições nas últimas décadas, que aconteceram de forma livre e com apuração rigorosa. Não há motivo para se preocupar, temos muita confiança de que a voz dos brasileiros será ouvida. Confiamos 100% que as eleições serão livres e justas.
O Brasil é um exemplo de democracia. Estados Unidos e Brasil são as duas maiores democracias da região, e têm a responsabilidade de mostrar isso para seus próprios cidadãos e também para seus vizinhos. É sobre isso que o presidente Biden pretende conversar com o presidente Bolsonaro: reafirmar a confiança no sistema eleitoral e na democracia brasileira.
O presidente brasileiro voltou a levantar suspeitas sobre as últimas eleições presidenciais americanas. Como o governo responde a isso?
Temos um presidente eleito de forma livre, justa e correta. Houve investigações a esse respeito, e o resultado das eleições foi confirmado.
O presidente Bolsonaro é muito criticado pela atuação de seu governo no tema do meio-ambiente. O presidente Biden pretende pressioná-lo nesta questão?
Houve uma mudança de tom por parte do governo Bolsonaro no tema meio-ambiente depois da COP 26 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima , realizada em novembro de 2021 na Escócia). Foi prometido um comprometimento do governo para trabalhar na questão do metano, poluição e desmatamento. O que é importante agora é dar seguimento a essas conversas do ano passado, e procurar formas de medir e verificar se há de fato uma evolução concreta. O Brasil sempre teve um papel de liderança na questão climática.
Será proposto um novo acordo?
Queremos saber o que vem sendo feito. Em novembro conversamos. Queremos saber que ações foram tomadas para o cumprimento dos acordos da COP.
A Vice-Presidente Kamala Harris tem entre suas atribuições a relação com a América Latina, mas tem sido criticada por dar pouca atenção à região. Há um plano para corrigir essa rota?
Não julgamos esta crítica procedente. A própria Cúpula é um passo importante nesta relação. A vice-presidente foi à posse da presidente Xiomara Castro, de Honduras, e mantém conversas constantes com membros de governos e sociedade civil dos países da América Latina. Os investimentos já anunciados e o pacto que será assinado nos próximos dias são consequência deste trabalho que a vice-presidente tem feito nos últimos dois anos.
A China está investindo muito na América Latina, e já ultrapassou os Estados Unidos como o mais importante parceiro comercial do Brasil. Isso causa preocupação?
Não vemos a participação da China como um problema, não vemos as relações comerciais de outros países como um problema. O que nós tentamos colocar em pauta é que a China costuma exigir contrapartidas para investir em determinado país. Os Estados Unidos investiram muito na distribuição de vacinas contra a Covid-19 na América Latina para amenizar a crise sanitária, por exemplo. Sem exigir contrapartida. Não é o que vemos a China e a Rússia fazerem.