Aborto nos Estados Unidos: marcha a ré à vista
Em frente ao prédio da Suprema Corte em Washington, manifestantes empunharam cartazes contra a ameaça
Há meio século que, por força de uma decisão da Suprema Corte, o aborto é permitido nos Estados Unidos. De tão acostumados ao status quo, os movimentos civis americanos aguardavam meio apáticos o momento — provavelmente no fim de junho — em que a mesma Corte iria rever a histórica votação de seus antecessores no processo Roe x Wade, com grandes chances de anulá-la. Até que o vazamento de um documento interno estremeceu a nação e pôs o bloco na rua. Um site de notícias divulgou o parecer provisório do relator do processo atual, o juiz Samuel Alito, afirmando que o precedente aberto pela Roe x Wade é “notoriamente equivocado” e “deve ser anulado” — opinião seguida por quatro de seus colegas, o que configura maioria para o fim da liberação geral do aborto. Nas TVs, nas redes sociais, nas ruas e em frente ao prédio da Suprema Corte em Washington, manifestantes empunharam cartazes contra a ameaça. “Acredito que a opção de escolha é um direito fundamental das mulheres”, declarou o presidente (católico) Joe Biden. A maioria expressa no documento, que ainda pode ser revista, mas pouca gente acredita que seja, é resultado da atual composição do tribunal — seis juízes conservadores e três liberais — e não reflete a opinião pública: 59% dos americanos acham que o aborto deve ser permitido e 70% são a favor da Roe x Wade. Ler com todas as letras que a Suprema Corte vai fazer os Estados Unidos andar para trás, e ninguém pode impedir, é um baque com reflexos no mundo inteiro.
Publicado em VEJA de 11 de maio de 2022, edição nº 2788