O destino não poderia ser mais deslumbrante e idílico: o histórico vinhedo Chateau St. Jean, onde são produzidos alguns dos mais bem avaliados cabernets sauvignons e chardonnays da Califórnia, presença obrigatória no cardápio de restaurantes estrelados. Ah, mas e o imponderável e o inesperado? Há um ano, Katie e Curtis Ferland, de Chicago, tinham marcado a cerimônia de casamento para o outono — e não no verão, temporada de incêndios californianos em virtude da vegetação seca. Os convites foram distribuídos a oitenta pessoas. Na véspera do “sim”, já com amigos e familiares instalados, a região, localizada a 70 quilômetros de São Francisco, virou palco de queimadas colossais, provavelmente provocadas por uma pane na linha de transmissão, mas certamente alastradas pelo clima de baixa umidade e pelos ventos fortes, incomuns para esta época do ano. Em 26 de outubro, o dia D da troca de alianças, o céu tingiu-se de um belo e dramático dégradé de laranja causado pela queima de galhos e árvores. A fotógrafa Karna Roa teve uma ideia e a sugeriu aos pombinhos: que tal associar o glamour do vestido e do terno, do buquê e da lapela às máscaras de proteção para minimizar os efeitos do ar tóxico? O casal voltou a dizer sim, e a foto, como tudo o que é interessante hoje em dia, viralizou. Foi um toque de humor e delicadeza, um olhar íntimo para uma preocupação coletiva. Mais de 185 000 pessoas precisaram deixar suas residências, sob o risco de ser atingidas pelo incêndio, descrito como uma “tempestade de fogo”. Cerca de 2,7 milhões de cidadãos ficaram sem energia elétrica, apesar do esforço de 3 000 voluntários que atuaram para conter as chamas, que, ao menos agora, não foram só de paixão.
Publicado em VEJA de 6 de novembro de 2019, edição nº 2659