Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana

Boris Johnson surpreende e muda cláusula do acordo do Brexit

Com a popularidade desgastada pela pandemia e pela crise econômica, o líder tenta recuperar a fama de durão

Por Caio Saad Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 15h17 - Publicado em 18 set 2020, 06h00

Prova inequívoca de que o mundo, apesar da pandemia, caminha para a normalidade: o Brexit voltou a ser assunto no Reino Unido. Faltando pouco mais de três meses para vencer o prazo finalíssimo da atormentada separação, o primeiro-ministro britânico Boris Johnson resolveu, na cara de pau, reescrever trechos do acordo que ele mesmo lavrou e assinou com a União Europeia. “Sim, isso viola as leis internacionais de modo específico e limitado”, admitiu Brandon Lewis, secretário do governo para questões da Irlanda do Norte. Em outras palavras: é ilegal, mas só um pouquinho. Na mesma semana em que colocou a proposta de mudança em votação no Parlamento, o primeiro-ministro, às voltas com um recrudescimento do contágio do novo coronavírus, instaurou no reino uma universalmente abominada “regra de seis” — reuniões ficam limitadas a meia dúzia de pessoas, em vez das trinta de antes. Com tudo isso, e com a economia agonizando no abismo mais fundo da Europa, Johnson vai ter de fazer força para provar que, apesar de muitos duvidarem, tem musculatura para tirar o país das cordas.

O Brexit voltou à baila porque o prazo para os finalmentes do divórcio — burilar e arrematar pontas soltas do acordo — vence em dezembro e as negociações, que deveriam se estender pelo ano todo, ficaram em ponto morto durante boa parte do primeiro semestre. Ressuscitando a tática que usou no ano passado, e que lhe rendeu vitória esmagadora nas eleições antecipadas e maioria de oitenta parlamentares em Westminster, Johnson partiu para o confronto mal as conversas foram retomadas. Se não houver concordância até 15 de outubro, quando o Conselho Europeu se reúne e deve pôr na pauta os últimos acertos, é melhor esquecer o assunto, disse, brandindo a eterna ameaça de bater a porta e ir embora.

A mudança no texto do acordo veio em seguida, no contexto de uma lei que dá a seus ministros poder decisivo em relação a subsídios e trânsito de mercadorias na Irlanda do Norte — exatamente o maior perrengue da exaustiva negociação do Brexit. Na terça 15, a lei foi aprovada em primeira votação, mas um punhado de parlamentares conservadores, do governo, posicionou-se contra, trazendo à memória o racha partidário que paralisou o Reino Unido durante meses. A medida ainda passará por outras votações e é possível que seja amenizada por uma emenda que submeteria as decisões dos ministros ao Parlamento ou mesmo pela retirada do monstrengo da pauta, caso as duas partes cheguem a um consenso. O enrosco deu, no entanto, o tom dos próximos capítulos de uma novela que ninguém aguenta mais acompanhar. “A confiança dos países da UE no governo britânico sofreu um golpe. Ninguém sabe com certeza qual é o plano de Boris Johnson. Talvez ele nem tenha um plano e só esteja sondando para ver o que pode conseguir”, avalia Fabian Zuleeg, do European Policy Centre, sediado em Bruxelas.

No combate à pandemia, que o governo primeiro tratou com leveza e depois endureceu, até as autoridades reconhecem que não terão meios de fiscalizar com rigor a nova “regra de seis”, que prevê multa de 100 libras a quem descumprir, dobrada a cada reincidência — isso depois de semanas de vigorosos incentivos à volta à vida normal. Nos primeiros dias de vigência, grupos maiores do que o permitido foram fotografados tomando sol em parques públicos de Londres e participando de um protesto contra o uso de máscara. O Reino Unido soma mais de 378 000 casos confirmados e quase 42 000 mortes por Covid-19. Depois de um período de recuo, em setembro os novos casos diários passaram de 3 000 e o temido “fator R” — o número médio de pessoas a quem alguém contagiado pode transmitir o vírus — superou o limite ideal. A aplicação de testes, atabalhoada desde o começo, segue prejudicada pela escassez e pelo acúmulo de resultados retidos nos laboratórios, que a liberação da volta às aulas intensificou.

A paralisação na pandemia deve eliminar 1 milhão de postos de trabalho neste ano, segundo o Instituto de Estudos sobre Emprego, sendo 450 000 só entre julho e setembro. O Trussell Trust, que administra uma rede de distribuição de alimentos, alerta sobre o fato de que 670 000 britânicos devem ingressar na faixa da pobreza até o fim do ano. O PIB encolheu 20% no segundo trimestre, um recorde histórico. Nesse contexto desolador, uma pesquisa publicada no fim de agosto mostrou que apenas 29% da população aprova o primeiro-ministro, uma queda de 12 pontos em relação a julho. “Entraves à finalização da saída negociada da União Europeia serão mais um grande golpe para a economia britânica”, diz Jonathan Portes, professor de economia da King’s College de Londres. Para alívio de muita gente, no mesmo dia da votação da “lei de exceção” encaminhada por Johnson, o representante da UE na negociação do Brexit, Michel Barnier, desembarcou em Londres para reuniões pré-agendadas. A presença dele foi vista como sinal de que o bloco confia em um compromisso que encerre a novela e risque pelo menos um problema da lista do Reino Unido.

Publicado em VEJA de 23 de setembro de 2020, edição nº 2705

Publicidade

Imagem do bloco

4 Colunas 2 Conteúdo para assinantes

Vejinhas Conteúdo para assinantes

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.