Cartéis são quinto maior empregador do México, revela pesquisa
Pesquisadores defendem que escalada de violência poderia ser reduzida com queda do recrutamento de funcionários por grupos do crime organizado do país
Um estudo publicado nesta quinta-feira, 21, na revista Science revelou que cartéis são o quinto maior empregador do México, com cerca de 175 mil “funcionários”. Escrito pelo ex-policial mexicano e pesquisador na Complexity Science Hub, Rafael Prieto-Curiel, e sua equipe, o artigo utilizou a modulação matemática para examinar tanto as raízes da escalada de violência no país quanto para explorar como o problema de segurança nacional responderia a diferentes políticas públicas.
Os cientistas utilizaram uma década de dados sobre homicídios, desaparecimentos e prisões no país, além de informações sobre embates entre facções rivais. Eles descobriram, então, que o derramamento de sangue poderia ser reduzido com a queda do recrutamento de funcionários por grupos do crime organizado do México, ao passo que o aumento do encarceramento apenas intensificaria o número de mortes em solo mexicano.
“Mais de 1,7 milhões de pessoas na América Latina estão encarceradas e adicionar mais pessoas a prisões saturadas não resolverá o problema de insegurança”, escreveram os autores.
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Os índices de homicídio mais do que triplicaram entre 2007 e 2021, ano em que o governo registrou cerca de 34 mil vítimas. Com isso, o México passou a ser considerado o país mais mortífero da América Latina. Duas principais facções, em constante disputa por ampliação, controlam o cenário de violência à nível nacional: o cartel de Sinaloa e o cartel Nova Geração de Jalisco. No entanto, acredita-se que ao menos 198 grupos armados tenham se estabelecido no país, muitos deles funcionando como subcontratados em confrontos.
O levantamento foi recebido com cautela por analistas do ramo, já que seria “o primeiro deste tipo”, como afirmou Victória Dittmar, pesquisadora do grupo de reflexão Insight Crime, em entrevista ao jornal britânico The Guardian. Ela pondera que o número de membros poderia variar conforme a definição do que seria um cartel e de qual grau de envolvimento caracterizaria ser um funcionário, ou não, dos grupos criminosos.
“Pode ser muito difícil dizer quem é membro de uma organização criminosa e quem não é”, acrescentou Dittmar. “E um político que recebe dinheiro? Ou alguém que coopera com o grupo apenas uma vez?”
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Parte dos membros de organizações de crime organizado não participa de atividades violentas. Entre eles estão a parcela jovem da classe trabalhadora, que pode ser recrutada para o controle do território apossado. Em contrapartida, desertores altamente treinados da polícia mexicana e das forças armadas de países latinos tendem a participar das disputas brutais.
“Uma coisa que falta neste estudo é que a violência no México também é produto do armamento utilizado”, contestou professor da Universidade de Montreal, Valentin Pereda, também em entrevista ao The Guardian. “Não estamos falando de pessoas com facas atacando umas às outras em um bar. Estamos falando de unidades paramilitares com armas de nível militar.”
A política de “abraços, não balas” do presidente do México, Andrés Manuel Lopéz Obrador, acompanha a lógica do trabalho da equipe de Prieto-Curiel: oferecer alternativas econômicas aos jovens seria uma maneira de reduzir a adesão aos cartéis e a brutalidade. Contudo, a corrente estratégia esteve aquém às expectativas de redução da violência no país. Ao todo, estima-se que o mandato de seis anos de Obrador tenha acumulado 156.204 homicídios, um número superior aos dos governos anteriores.