Casos de sarampo atingem recorde nos EUA após 25 anos de erradicação da doença
Taxa de vacinação contra o sarampo caiu na pandemia de Covid-19 e não alcançou os 95% necessários para conter a disseminação do vírus no país

Dados do Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos revelaram nesta quarta-feira, 9, que os casos de sarampo atingiram o recorde desde que foi considerado erradicado há 25 anos no país. É um retrocesso perigoso, que pode resultar em surtos mortais por se tratar de um vírus extremamente contagioso. Mais do que isso, é sinal de que outras doenças também podem voltar a ser um problema de saúde pública nos EUA.
Ao todo, 1.288 pessoas tiveram sarampo este ano, 92% das quais não foram vacinadas ou cujo status de vacinação era desconhecido. A maior parte de casos tem relação com um surto da doença, que teve início em janeiro, no sudoeste americano. Apesar do primeiro caso ter sido registrado no Texas, o vírus logo se espalharam para Oklahoma e Novo México. Agora, já alcançou 38 estados dos EUA — um indício, segundo especialistas ouvidos pelo jornal americano The New York Times, de que o país enfrenta um cenário sanitário de vulnerabilidade.
Os sintomas não são graves, mas o vírus pode causar pneumonia e inchaço cerebral, com possíveis danos permanentes, incluindo cegueira, surdez e deficiência intelectual. Ele também causa uma espécie de amnésia imunológica, de forma a tornar o corpo incapaz de se defender contra doenças aos quais foi exposto. No quadro mais grave, uma condição neurológica degenerativa fatal anos após o diagnóstico.
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Queda na vacinação
De 1.000 crianças diagnosticadas com a doença, duas morrerão — o que já aconteceu: em janeiro, duas crianças não vacinadas e um adulto não resistiram. É como se o retorno do sarampo fosse o primeiro sintoma de um perigo maior: se uma doença que é controlada pela vacinação volta a circular, significa que outras também correm o mesmo risco. Coqueluche e meningite por Haemophilus influenzae tipo b (Hib) são exemplos.
Nos EUA, a taxa de vacinação contra o sarampo caiu durante a pandemia de Covid-19 e não alcançou os 95% necessários para conter a disseminação do vírus. Cerca de 93% das crianças no jardim de infância no ano letivo de 2023-24 foram imunizadas contra sarampo, caxumba e rubéola, mas as taxas são bem menores em algumas partes do país.
A situação é grave e pode levar os EUA a perderem o status de erradicação do sarampo, o que seria “um símbolo de quão pior o discurso ficou e de quão politizadas as vacinas se tornaram”, disse Adam Ratner, especialista em doenças infecciosas pediátricas que há pouco publicou um livro sobre o ressurgimento do sarampo, ao The New York Times. Em meio ao surto no Texas, o secretário de Saúde, Robert F. Kennedy Jr., disse que vacinar crianças é “uma decisão pessoal” e e endossou tratamentos não comprovados para o vírus.
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Política de governo
Em junho, o secretário de Saúde demitiu todos os 17 membros do comitê de especialistas responsável por aconselhar os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) sobre como usar vacinas. Conhecido por sua postura cética quanto aos imunizantes – inclusive por espalhar teorias da conspiração que associam, sem fundamento, vacinação ao desenvolvimento de autismo –, o aliado do presidente Donald Trump acusou os profissionais de “conflitos de interesse” e prometeu substituí-los por uma nova equipe.
“Hoje, priorizamos a restauração da confiança pública acima de qualquer agenda específica a favor ou contra vacinas”, disse RFK Jr. na ocasião. “O público precisa saber que a ciência imparcial — avaliada por meio de um processo transparente e isenta de conflitos de interesse — orienta as recomendações de nossas agências de saúde.”
Na época, o presidente da ONG Resolve to Save Lives e ex-diretor do CDC, Tom Frieden, acusou Kennedy de “politizar” o Comitê Consultivo sobre Práticas de Imunização (ACIP), denunciando “uma ação perigosa e sem precedentes que torna nossas famílias menos seguras”.