O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, está em maus lençóis. Após quase 22 meses de guerra contra a Rússia, durante os quais teve apoio consistente de aliados do chamado mundo ocidental para manter de pé sua resistência, o auxílio precioso dos Estados Unidos ameaça minguar, enquanto suas aspirações para entrar na União Europeia – e aproximar-se ainda mais do Ocidente – podem ser frustradas diante de uma reunião em Bruxelas nesta semana.
Uma conversa breve – mas aparentemente intensa – com o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, evidencia os enroscos do líder de Kiev. Os dois se encontraram na posse do novo presidente da Argentina, Javier Milei, em Buenos Aires, no domingo 10.
Apenas leitores labiais profissionais poderão decifrar o que foi dito entre os mandatários, mas coisa boa não deve ter sido. Orbán opôs-se veementemente ao progresso do pedido de adesão da Ucrânia à União Europeia, que será discutido nesta quinta-feira, 14, em Bruxelas, bem como à aprovação de um novo pacote de auxílio para financiar a resistência dos ucranianos contra a Rússia.
Auxílio americano
O climão no alto escalão dos governos ucraniano e húngaro ocorre diante de uma semana crucial para Kiev.
Na terça-feira, 12, Zelensky fará uma viagem a Washington D.C., sua segunda visita aos Estados Unidos desde o início da guerra, na busca de desbloquear um pacote de ajuda financeira americano no valor de US$ 60 bilhões (R$ 296 bilhões).
O presidente Joe Biden, um importante aliado do líder ucraniano, é a favor da continuidade dos aportes, mas o montante ficou retido devido a uma disputa partidária no Congresso. Deputados e senadores republicanos, que vêm pressionando o governo por mais austeridade financeira, defendem que se algum dinheiro deve ser gasto é com a segurança interna dos Estados Unidos, com foco na proteção da fronteira sul com o México, para conter a entrada de imigrantes ilegais no país.
Na semana passada, uma votação no Senado viu um pacote que incluía o financiamento à Ucrânia ser bloqueado. Por isso, na visita, Zelensky marcou uma reunião com o republicano Mike Johnson, o presidente da Câmara.
Adesão à União Europeia
Na quinta-feira, os líderes da União Europeia devem reunir-se em Bruxelas, onde o plano inicial é dar sinal verde ao início das negociações formais para a entrada da Ucrânia no bloco. Seria o próximo dos muitos passos rumo à plena adesão, embora não haja garantias de sucesso.
Durante o encontro, o grupo também pretende aprovar um novo pacote de assistência financeira de 50 bilhões de euros (R$ 266 bilhões) a Kiev.
No entanto, Viktor Orbán ameaçou inviabilizar ambos os objetivos da reunião, provocando frustração nas capitais da União Europeia e irritação profunda em Kiev.
Os críticos mais ferrenhos do líder húngaro o acusam de ser “porta-voz” de Vladimir Putin, devido à sua escolha de manter laços com a Rússia mesmo após a invasão à Ucrânia, em fevereiro de 2022.
Motivos ulteriores
Orbán se manifestou repetidamente contra o envio de mais dinheiro e armas para a Ucrânia, e acusa os chefes da União Europeia de tentarem “empurrar” a adesão ucraniana “goela abaixo”, sem uma “discussão estratégica” sobre a medida. Ele chegou a descrever Kiev como “um dos países mais corruptos do mundo”, característica que impediria a entrada da nação no bloco europeu.
A alegação provoca indignação em Kiev, dado que Orbán é acusado de patrocinar um retrocesso democrático no seu próprio país, com a diminuição de poderes do Judiciário e o controle das mídias locais. A postura do líder húngaro custou-lhe uma série de repasses que a União Europeia faz para os Estados membros – e alguns acreditam que ele esteja usando a questão ucraniana como uma moeda de troca para liberar dinheiro do bloco.