No poder há doze anos, o venezuelano Nicolás Maduro tornou-se um mestre em driblar resultado eleitoral e proclamar que, apesar da pilha de evidências em contrário, é um mandatário legítimo. Na última votação, em 2018, conquistou o segundo mandato com uma receita que incluiu a desqualificação dos principais candidatos de uma oposição fragmentada e a desmobilização da população, que mais se absteve (54%) do que compareceu às urnas. Foi o que bastou para ele cantar vitória, com 67% dos votos. Neste domingo, 28, a situação será mais complicada: Maduro vai enfrentar uma oposição unida e uma sociedade mobilizada. Pesquisa divulgada pelo Instituto Delphos, na terça-feira 23, indicou que a coalizão de onze partidos que desafia o regime está 35 pontos à frente, com 60% das intenções de votos, e que a participação deve bater nos 80%. Restará ao presidente bolivariano, nesse cenário, duas opções: ou assume de vez o autoritarismo, ou admite que perdeu.
Sentindo a pressão, a retórica do ditador esquentou. Em comício em Caracas, alertou que a nação enfrentará um “banho de sangue” se derrotado, indício de que pode ignorar os resultados. Até o presidente Lula, aliado de primeira hora, titubeou. “Fiquei assustado”, afirmou. “Maduro precisa aprender que, quando você ganha, você fica; quando você perde, você vai embora.” Ferido nos brios, o venezuelano observou, sem provas, que as eleições no Brasil não são auditadas e mandou o petista “tomar um chá de camomila”. No calor do bate-boca, o TSE voltou atrás na intenção de enviar funcionários para monitorar o processo eleitoral, enquanto Celso Amorim, em pessoa, assessor especial de Lula, anunciou que irá à Venezuela para monitorar o processo eleitoral. “Indicação de que o governo está tenso. Amorim tem mais peso que um técnico”, disse um diplomata a VEJA.
A última parada da campanha da oposição, na quarta-feira 24, traduziu um sentimento de esperança que há muito não se via entre os eleitores. Com direito a buzinaços e desfile de trio elétrico, milhares inundaram as ruas de Maracaibo para receber Edmundo González, diplomata desconhecido alçado a presidenciável após o regime declarar a inelegibilidade da líder oposicionista María Corina Machado. Popularíssima, ela postou-se no alto do trio de mãos dadas com González, para colar sua imagem ao colega no palanque improvisado — a equipe encarregada de montar o palco foi presa no dia anterior, uma costumeira técnica de intimidação. Ao menos 37 figuras da oposição foram detidas neste ano, e a fiscalização fecha hotéis e restaurantes que recebem as que ainda estão livres. Maduro parece disposto a tudo para ficar no poder. “Para ele, é questão de sobrevivência, sob risco de ser preso e julgado”, ressalta Carolina Pedroso, professora de relações internacionais da Unifesp. Até domingo, o mundo prende a respiração.
Publicado em VEJA de 26 de julho de 2024, edição nº 2903