Divulgação de relatório integral do ‘Russiagate’ reacende temores em Trump
Congresso e imprensa dos Estados Unidos pressionam pelo acesso ao texto; resumo teria omitido principais conclusões do procurador Robert Mueller
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, cantou vitória antes do tempo ao ver divulgados, no último dia 24, os resultados da investigação sobre o “Russiagate”, a interferência de Moscou nas eleições de 2016, que o levaram à Casa Branca. Nesta quinta-feira, 4, com a possibilidade de o relatório integral vir a público, o quadro mudou, e Trump novamente se viu diante de razões para se preocupar.
O Congresso pressiona o Departamento de Justiça para obter o texto integral do relatório elaborado pelo procurador especial Robert Mueller, responsável pela apuração. À imprensa americana, membros de seu time de investigadores informaram haver grande distância entre o calhamaço original e o resumo feito e divulgado pelo secretário de Justiça, William Barr, no dia 24.
A íntegra do texto, com centenas de páginas, ainda não foi trazida a público. Barr ignorou as revelações potencialmente prejudiciais para Trump no resumo que escreveu. “Membros da equipe de Mueller se queixaram para colaboradores próximos que as provas reunidas sobre a obstrução (de Justiça por Trump) foram alarmantes e significativas”, informou o jornal The Washington Post.
O jornal The New York Times citou a avaliação de fontes anônimas de que o procurador-geral não apresentara adequadamente as descobertas da investigação, “mais preocupantes para o presidente Trump do que Barr indicou”.
Trump não gostou do que leu. No Twitter, o presidente americano acusou o Times de não ter “fontes legítimas” e que as ouvidas pelo jornal “seriam totalmente ilegais”. “De fato, provavelmente não tinham nenhuma fonte! É um jornal de notícias falsas, que já se viu obrigado a pedir desculpas por suas informações incorretas e péssimas sobre mim!”
O Departamento de Justiça, porém, viu-se obrigado a defender o resumo de Barr nesta quinta-feira, informando que “cada página” do relatório de Mueller fora catalogada por conter material potencialmente confidencial. Também insistiu que o texto virá a público na íntegra assim que forem concluídas as “redações apropriadas”.
Idiotice
Ao longo de dois anos, Trump reprovou várias vezes a “caça às bruxas” supostamente promovida por Mueller e acusou de “idiotice” a ideia de que poderia ter feito um acordo com a Rússia para guiar a opinião pública em seu favor durante as eleições de 2016.
Segundo o resumo do relatório feito por Barr, Mueller descobriu que ninguém na equipe do atual presidente “conspirou ou trabalhou em coordenação com a Rússia”. O texto, portanto, isentaria totalmente Donald Trump desse envolvimento com Moscou.
Sobre a suspeita de Trump ter obstruído a Justiça e tentado impedir que Mueller o investigasse livremente, Barr afirmou no resumo que o procurador especial não chegou a uma conclusão definitiva. “Se bem que este relatório não conclui que o presidente cometeu um delito, também não o exonera”, afirmou Barr, em referência a uma das conclusões de Mueller.
Essa afirmação soou perigosamente ambígua para Trump. Mas o próprio Barr avaliou que, se não havia nenhum delito de obstrução, o presidente poderia dizer que era uma vitória. Em uma série de postagens no Twitter, Trump afirmou que o documento mostrava que ele tinha razão e acusou de traição as autoridades encarregadas de fazer cumprir a lei e os políticos do Partido Democrata que apoiaram a investigação de Mueller.
A estranheza sobre o resumo divulgado, que isentou Trump, está no fato de ele ter demonstrado publicamente seu incômodo com o avanço da investigação. Os jornais americanos publicaram inúmeras vezes seus confrontos com o ex-secretário de Justiça, Jeff Sessions, que se mostrava impossibilitado de barrar as investigações de Mueller, por mais subserviente que fosse a Trump em outras áreas.
Na véspera da divulgação do resumo, já com o texto do relatório nas mãos de Barr, Trump cercou-se de seus advogados no seu resort em Mar-a-Lago, na Flórida.
Democratas raivosos
O questionamento dos democratas sobre o motivo de o relatório completo não ter vindo a público e do vazamento de informações para a imprensa feitos pela equipe de Mueller, porém, estão tirando o gosto de vitória de Trump.
Nesta quinta-feira, o porta-voz do Departamento de Justiça, Kerri Kupec, defendeu o resumo feito por Barr e informou que o secretário “não crê que o relatório deva ser publicado na íntegra ou (de forma) fragmentada”. “Dado o extraordinário interesse público no assunto, o procurador-geral decidiu divulgar os resultados finais do relatório e suas conclusões de imediato, sem tentar resumir o mesmo, por entender que o documento será publicado após o processo de redação”, explicou.
No meio dessa questão, Trump voltou sua carga contra os oponentes democratas pelo Twitter. “De acordo com as pesquisas, interessa a poucas pessoas o engodo da conspiração russa, mas alguns democratas estão lutando para manter viva a caça às bruxas”, escreveu nesta quinta-feira.
“Deveriam focar na legislação ou, melhor ainda, numa investigação sobre como começou a ridícula ilusão da conspiração”, completou.
O advogado de Trump, o ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani quis retomar uma batalha supostamente encerrada. Na quarta-feira 3, em entrevista à rede de televisão conservadora Fox News, chamou a equipe de Mueller de “um grupo de antiéticos que filtram as informações”. Acrescentou que os investigadores eram “democratas raivosos que odeiam o presidente dos Estados Unidos”.
“Acreditamos que podemos provar, acima de qualquer dúvida, que não há nenhum conluio”, disse Giuliani sobre a participação da Rússia nas eleições presidenciais de 2016.
(Com AFP)