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Drama mexicano: uma das maiores metrópoles do mundo está afundando lentamente

Extração de água do subsolo para abastecer a capital do país tem provocado o problema

Por Duda Monteiro de Barros Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 13 set 2025, 08h00

Por ordem dos deuses, os astecas, um povo nômade que circulava pelo território hoje conhecido como México, num remoto passado, deveriam se fixar na terra onde encontrassem uma águia pousada em um cacto, com uma cobra no bico. Tal condição, reza a lenda, se deu lá pelo ano de 1325, em uma ilha do lago Texcoco, onde os indígenas se estabeleceram, cercados de água por todos os lados. A topografia garantiu boas condições para a defesa, pesca e agricultura, até a chegada de Cortés, quase dois séculos depois. O processo de colonização deflagrado pelo conquistador espanhol, no entanto, pouco levou em consideração os limites geográficos impostos pelo lago. Resultado: hoje a capital mexicana vive um problema que soa como uma vingança dos povos originários. A drenagem constante de seus aquíferos, que garante o abastecimento de quase 22 milhões de habitantes de uma das maiores metrópoles do mundo, está fazendo com que a cidade, erguida sobre um solo argiloso, afunde lentamente.

ORIGEM - Nos primeiros anos: gestão hídrica dos astecas agora inspira soluções
ORIGEM - Nos primeiros anos: gestão hídrica dos astecas agora inspira soluções (G. Dagli Orti/Getty Images)

O problema é observado desde 1800, quando foi notado pela primeira vez, mas está chegando a níveis alarmantes. Um estudo recente da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam) adverte que o processo se intensificou. De 10 centímetros por ano, alguns pontos passaram a ceder até 40 centímetros a cada doze meses. Nesse ritmo, dizem os geólogos, algumas zonas se tornarão inabitáveis na próxima década, obrigando os moradores a deixar suas casas. Milhares de domicílios já estão condenados. A situação é pior na porção leste, onde o terreno desaba enquanto os sistemas de drenagem colapsam. As tempestades, cada vez mais recorrentes e intensas em função das mudanças climáticas, inundam as vias públicas ao mesmo tempo em que a água sobe pelos ralos. “A cidade experimentou um desenvolvimento urbano e industrial exponencial, mas o crescimento não foi acompanhado de um ordenamento adequado”, diz a geóloga Wendy Morales, da Unam.

Entre os símbolos arquitetônicos afetados pelo fenômeno batizado de “subsidência” está o Monumento à Independência, conhecido como “El Ángel”, que já exigiu a adição de degraus extras em sua base, devido ao rebaixamento do solo ao redor (veja o quadro). A Catedral Metropolitana, construída ao longo de três séculos, apresenta visíveis inclinações e rachaduras, exigindo intervenções constantes de estabilização. Em agosto, um temporal fechou o aeroporto internacional Benito Juárez, cuja área virou uma bacia para onde a água corre. Além dos danos técnicos, que demandam gastos constantes com manutenção, o desnível tornou-se um espetáculo assustador no cotidiano. Nas redes sociais, moradores compartilham imagens de paredes tortas e danificadas e de crateras gigantes, abertas em algumas das principais ruas e avenidas. “O afundamento é evidente na basílica de Guadalupe”, alerta um vídeo que denuncia as estruturas oblíquas do templo da padroeira nacional.

arte México

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O cenário se torna ainda mais crítico em função da impermeabilização do solo, que impede a água da chuva de retornar ao lençol freático. O programa governamental de “acupuntura hídrica” busca restabelecer o nível desses rios subterrâneos reintroduzindo a água pelos poços que foram cavados para extraí-la. Outro projeto pioneiro de captação pluvial instalou mais de 30 000 cisternas em residências carentes, diminuindo a pressão sobre o sistema de abastecimento. “Cada litro captado é um litro a menos retirado do subsolo”, diz Valentina Lima Sinta, coordenadora de gestão da iniciativa, apelidada de Ilha Urbana, ressaltando que as ações mais decisivas para amenizar a erosão do terreno estão relacionadas à redução da retirada de tão fundamental líquido.

Em outra ponta, especialistas estão resgatando saberes ancestrais dos astecas para tentar fazer uma melhor gestão dos recursos hídricos. No passado, os indígenas construíram canais, barreiras de contenção e ilhas flutuantes que tornavam a vida na antiga Tenochtitlán mais sustentável. Nenhum grande projeto, contudo, saiu do papel até o momento. “Sempre foi o dilema eterno: como drenar a água em uma cidade fundada sobre um lago”, observa Victor Magaña, geógrafo da Unam. O problema é cada vez mais urgente. Enquanto não se encontra uma solução, o país sofre as consequências de ter negligenciado os erros que vêm de muito tempo. O drama mexicano está longe de ter um fim.

Publicado em VEJA de 12 de setembro de 2025, edição nº 2961

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