Espanha concede cidadania a descendentes de estrangeiros que combateram franquismo
Governo de Pedro Sánchez reconhece 170 herdeiros das Brigadas Internacionais, reafirmando compromisso com a memória democrática
O governo da Espanha concedeu nesta terça-feira, 4, cidadania a 170 descendentes dos integrantes das Brigadas Internacionais, grupos de voluntários estrangeiros que lutaram na Guerra Civil (1936–1939) contra o regime fascista do general Francisco Franco. O gesto, anunciado durante uma cerimônia em Madri, simbolizou um reconhecimento tardio àqueles que deixaram seus países para defender a democracia em solo espanhol.
“Será uma honra chamá-los de compatriotas”, declarou o primeiro-ministro, Pedro Sánchez, durante o evento do “Dia da Memória e Homenagem a Todas as Vítimas do Golpe Militar, da Guerra e da Ditadura”, celebrado desde 2022 com a entrada em vigor da Lei de Memória Democrática. “Eles lutaram pela mesma democracia que hoje volta a ser ameaçada em várias partes do mundo”, ele completou.
A decisão coincide com o 50º aniversário da morte de Franco, cuja ditadura perdurou por quase quatro décadas. Ao todo, cerca de 32 mil voluntários integraram as Brigadas Internacionais, vindos de mais de cinquenta países, entre eles pelo menos 78 brasileiros, segundo a historiadora Eliane Venturini de Oliveira, da Universidade de Valência.
Legado do franquismo
A concessão de cidadania é parte de uma série de medidas do governo socialista para reparar as vítimas do franquismo e combater a apologia ao regime. Madri determinou que a Fundação Nacional Francisco Franco, entidade criada para exaltar a figura do ditador, tem dez dias para responder a acusações de violar a Lei de Memória Democrática, que proíbe a promoção de ideais fascistas. Caso não o faça, o governo iniciará o processo de dissolução da instituição.
Para Jim Jump, presidente do Fundo Memorial da Brigada Internacional, em Londres, a decisão “reforça a determinação da Espanha em apagar o legado tóxico do franquismo”. Segundo ele, muitas famílias de brigadistas seguiram lutando pela restauração da democracia espanhola durante os anos de repressão.
Promoção da democracia
Durante a cerimônia, Sánchez defendeu a memória democrática contra o revisionismo histórico. Segundo ele, há uma “lenta, mas constante, deslegitimação da democracia”, que começa ao “chamar concórdia ao revisionismo” e termina ao “ignorar que, em alguns edifícios institucionais, a tortura foi levada até o fim”. O premiê classificou como “terrível” o fato de mais de um quinto dos espanhóis ainda hoje considerarem que a ditadura de Franco foi boa ou muito boa.
O chefe do governo espanhol também anunciou que, por decreto real, símbolos e monumentos franquistas ainda espalhados por ruas e praças do país serão removidos “de uma vez por todas”.
A cerimônia em Madri incluiu ainda homenagens a 18 vítimas da ditadura, entre elas o poeta Federico García Lorca, assassinado em 1936, e o cineasta Luis Buñuel, exilado durante o regime. Entre os homenageados estavam também figuras menos conhecidas, como Margot Moles Piña, pioneira do esporte feminino na Espanha, e María Luisa Ramos Barril, de 98 anos, deportada para o campo de concentração de Mauthausen em 1940, que compareceu pessoalmente à cerimônia para receber o reconhecimento.







