Começou nesta terça-feira, 12, o julgamento dos líderes separatistas acusados de promover a independência da Catalunha em outubro de 2017. Nove homens e três mulheres compõem o banco dos réus no Supremo Tribunal da Espanha, em Madrid. Todos são considerados presos políticos por partidos e movimentos civis da comunidade autônoma.
A imprensa espanhola descreve o julgamento como uma “prova de fogo para a democracia” do país, naquele que é considerado o maior evento jurídico desde o fim da ditadura franquista, em 1976. A audiência de hoje se dedica aos trâmites iniciais para a sentença e é mantida sob forte sigilo.
Mas as próximas etapas do processo, que deve se estender pelos próximos três meses, serão transmitidas pela televisão local e acompanhadas por mais de 600 jornalistas, espanhóis e estrangeiros.
Um dos protagonistas do julgamento é o ex-presidente catalão Carles Puigdemont, que se refugiou na Bélgica. Ele não poderá ser condenado pela justiça espanhola porque a legislação proíbe o sentenciamento à distância.
Foi sob o comando de Puigdemont que o governo da Catalunha ignorou a ilegalidade do referendo separatista e fez valer seu resultado. A Constituição da Espanha considera qualquer tentativa de secessão como ofensa à “unidade indissolúvel da nação”.
O ex-vice-presidente da Catalunha Oriol Junqueras é um dos que enfrentará o risco de pena máxima, exigida pela Promotoria. Junqueras, o ex-presidente do parlamento catalão Carme Forcadell e dois ativistas de movimentos civis, Jordi Cuixart e Jordi Sànchez, são acusados de rebelião, crime para o qual está prevista sentença de 25 anos de prisão. Outras acusações contra os réus incluem o mau uso do dinheiro público e a perturbação da ordem.
O advogado de Junqueras, Andreu Van den Eynde, afirmou que o caso tem motivações políticas. À corte, ele disse que os promotores estão tentando criminalizar a liberdade de expressão e o direito dos réus de lutar por sua identidade. “Nenhuma lei internacional ou da União Europeia bloqueia o separatismo de uma entidade regional; autodeterminação é sinônimo de paz e não de guerra”, disse.
Van den Eynde, que também representa o ex-ministro das Relações Exteriores catalão Raül Romeva, argumentou que a “arena política é um espaço livre” e que a “liberdade de expressão se estende até às ideias que chocam e ofendem”, afirmando ainda que a própria independência da Catalunha estava em julgamento.
Já Jordi Pina, advogado de Jordi Sánchez, pediu que o Supremo permita o testemunho do Rei Felipe, que deu um controverso discurso dois dias depois do referendo catalão, mencionado nos documentos da promotoria. Em seu pronunciamento, o monarca espanhol acusou as autoridades separatistas de tentar corromper “a unidade da Espanha” e alertou que sua tentativa de independência arriscava a estabilidade social e econômica do país.
Comunidade dividida
Os partidos pró-independência da Catalunha nunca conseguiram mais de 50% dos votos favoráveis ao separatismo no parlamento regional, e pesquisas locais mostram que a comunidade está dividida em sua opinião sobre o assunto. Depois de organizar o referendo proibido pela Justiça espanhola, em 1° de outubro de 2017, os separatistas catalães proclamaram a república independente, de forma unilateral, em 27 de outubro.
Horas mais tarde, o então primeiro-ministro espanhol Mariano Rajoy destituiu o governo de Puigdemont, dissolveu o Parlamento catalão e suspendeu a autonomia da região. Para que os acusados sejam condenados por rebelião, a comprovação do uso de violência no processo separatista é fundamental.
Durante a declaração frustrada de independência, porém, não foram relatados o uso de armas ou o chamado da população à luta armada. Ma,s segundo a versão do Ministério Público espanhol, os separatistas “contemplavam a utilização de todos os meios necessários para alcançar seu objetivo”.
Ainda de acordo com o Ministério, os acusados de rebelião “convocaram os cidadãos a participarem do dia do referendo, estando conscientes da ilegalidade do ato e de que, com isso, poderia haver explosões violentas.”
Os separatistas descrevem o processo como uma “farsa”, e a oposição de direita mostrou-se solidária a essas alegações, acusando o governo do atual primeiro-ministro espanhol, o socialista Pedro Sánchez, de pressionar magistrados do país e tribunais europeus a não questionarem as decisões de Madri sobre a autonomia da Catalunha.
Em resposta, o governo espanhol entregou à imprensa estrangeira um volumoso dossiê para comprovar a independência da Justiça espanhola, baseando-se nas classificações da Comissão Europeia, da Corte Europeia de Direitos Humanos e da Organização Internacional de Transparência.
A Advocacia da União, representante dos interesses do Estado nesse processo, não apresentou a acusação de rebelião contra os réus, mas de sedição. Esta última, mais leve, tem pena máxima prevista de 12 anos de prisão.