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‘Frente a frente’ com Bolsonaro, Fernández prega união acima de ideologias

Líderes trocaram rusgas no passado; em cúpula virtual, presidente brasileiro disse querer acabar com 'opiniões distorcidas' sobre seu governo

Por Julia Braun Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 2 jul 2020, 12h29 - Publicado em 2 jul 2020, 12h17

Em seu pronunciamento durante a 56ª Cúpula do Mercosul, realizada por videoconferência pela primeira vez na história por causa da pandemia de coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro não mencionou as relações entre o Brasil e a Argentina nem se dirigiu pontualmente a Alberto Fernández, com quem trocou rusgas no passado. O líder afirmou ainda que seu governo trabalha para acabar com “opiniões distorcidas” criada sobre o Brasil.

Bolsonaro e Fernández ficaram frente a frente pela primeira vez desde que o presidente argentino foi eleito em 2019. Em sua mensagem, o peronista expressou seu desejo de união e superação das diferenças passadas. A Argentina entrou em choque com o bloco ao deixar as negociações para o acordo fechado em julho de 2019 com a União Europeia (UE) e se opor a pontos dos pactos de livre comércio com o Canadá, Singapura, Coreia do Sul, Índia e Líbano.

O presidente brasileiro se absteve de cumprimentar Fernández e não assistiu à sua posse em 10 de dezembro, incomodado pela campanha do peronista a favor da libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Temeroso de que Fernández, herdeiro de uma economia mergulhada em uma grave crise, adote políticas protecionistas, o governo Bolsonaro chegou a ameaçar deixar o bloco.

Nesta quinta, porém, Bolsonaro não tocou no tema das diferenças ideológicas entre os dois governos. Em um discurso rápido, destacou avanços comandados por seu governo nas áreas de renovação de infraestrutura, atração de investimentos e com a Reforma da Previdência. Pediu ainda que o bloco trabalhe para concluir e assinar o acordo com a União Europeia ainda “neste semestre”.

“Nosso governo dará prosseguimento ao diálogo, com diferentes interlocutores, para desfazer opiniões distorcidas sobre o Brasil e expor as ações que temos tomado em favor da proteção da Floresta Amazônica e do bem-estar das populações indígenas”, afirmou.

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Bolsonaro saudou no início de seu discurso todos os líderes e chanceleres presentes na cúpula online. Ao longo de seu pronunciamento, se dirigiu diretamente ao presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, a presidente da Bolívia, Jeanine Áñez, e do Urguai, Luis Lacalle Pou. Porém, em nenhum momento tratou da relação do Brasil com a Argentina, o mais tradicional parceiro econômico brasileiro.

‘Povos se vinculam mais do que governos’

Alberto Fernández também não se dirigiu a Bolsonaro em seu discurso. O argentino, contudo, tratou da necessidade do bloco agir em conjunto neste momento em que o mundo enfrenta um grande desafio com a pandemia de coronavírus e de acabar com as desigualdades entre os países-membros, principalmente no Uruguai e no Paraguai.

Ressaltou ainda que as diferenças ideológicas entre os governos não devem atrapalhar os trabalhos do bloco. “Precisamos entender que a união dos nossos povos precede nossa condição de governantes ocasionais”, disse. “As diferenças que podem surgir, ideológicas, conceituais ou do tipo que queiram, passarão a segundo plano. Está na hora de entender que são os povos que se vinculam mais do que os governos”, afirmou.

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“Sempre digo que tenho por todos os líderes do mundo o respeito que merecem porque seus povos os elegeram, e sei que não penso igual a muitos desses líderes”, disse. “Mas não é simplesmente porque penso diferente que não temos o direito de nos unirmos e crescermos juntos”.

Fernández também afirmou que a globalização é um “fato consumado”, para o qual não há volta. A declaração parece uma mensagem ao governo brasileiro, que vem conduzindo uma política externa que valoriza o fim do que chama de “globalismo” e um maior isolamento. “O mundo hoje é uma grande aldeia criada por meio da tecnologia e da comunicação, e renegar isso é uma bobagem”, disse.

Sobre a pandemia de coronavírus, o peronista afirmou ainda que “não tem sentido em chorar sobre o leite derramado”, e que os países do bloco precisam se concentrar nos desafios a diante. Disse que a responsabilidade de superar esta crise é dos governantes, e que “se não agimos bem, somos nós os culpados pelas coisas acabarem mal”.

Jair Bolsonaro foi criticado internacionalmente por sua gestão da pandemia no Brasil. Chegou a tratar o vírus como uma “gripezinha”, incentivou manifestações com aglomeração nos últimos meses e agora pede por uma reabertura da economia, apesar do número de novos casos continuar em uma curva crescente.

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Meio ambiente

O presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, também tocou no tema do meio ambiente e pediu atenção do bloco ao tema. “Temos uma região abençoada e nesse sentido temos o dever moral com as novas gerações de cuidar dela”, disse.

O líder uruguaio ainda foi enfático sobre a necessidade do Mercosul agir em conjunto, apesar das diferentes “vocações ideológicas”, e de trabalhar em um “consenso pragmático” para avançar diante do desenvolvimento mundial e das ofertas e demandas econômicas do planeta. Lacalle Pou é filiado ao Partido Nacional, de tendências de centro-direita. Ainda assim, já mostrou no passado não concordar inteiramente com a ideologia pregada pelo governo de Jair Bolsonaro.

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Em seu discurso, o presidente uruguaio disse também que o bloco não deve se envolver nas disputas comerciais entre China e Estados Unidos. Segundo Lacalle Pou, o Mercosul já tratou com Washington a possibilidade de fechar um acordo comercial com o bloco, mas não obteve nenhuma resposta.  Ao mesmo tempo, afirmou que a China manifestou interesse em expandir as relações com o grupo de países sul-americanos. “Creio que há uma omissão de nosso bloco em responder formalmente a esse interesse”, disse.

Renúncia de chanceler uruguaio

O ministro das Relações Exteriores do Uruguai, Ernesto Talvi, renunciou ao cargo nesta quarta-feira 1, menos de 24 horas antes da Presidência do Mercosul passar para seu país. O comando do bloco foi transferido do Paraguai para o Uruguai, conforme dita a tradição.

Em uma carta ao presidente Luis Lacalle Pou, o chanceler deu a entender que sua saída não aconteceu nos termos que esperava. “Tal como manifestei oportunamente, minha intenção era continuar na Chancelaria até o fim do ano, durante a presidência pro tempore do Uruguai no Mercosul”,

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A gestão de Talvi foi marcada por diferenças cada vez mais profundas com a equipe que o acompanhava e por uma política de moderação em relação à Venezuela, que entrou em choque com a visão mais dura de Lacalle Pou. Sua saída já vinha sendo anunciada pela imprensa local há semanas.

O sucessor de Talvi será o atual embaixador do Uruguai na Espanha, Francisco Bustillo, um diplomata de carreira muito próximo de Lacalle Pou e que tem boas relações com Alberto Fernández.

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