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Há algo de podre no reino da antes pacata monarquia na Noruega

O filho da futura rainha bate na namorada e depreda sua casa, enquanto outra princesa está para se casar com um xamã americano

Por Caio Saad Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 1 set 2024, 08h00

Sob a moldura de geleiras e fiordes, a realeza da Noruega sempre buscou ficar à distância das elevadas temperaturas que embalam os tabloides. E até agora vinha driblando bem um holofote aqui, outro ali, quando algo menos usual dava de ameaçar a santa paz no reino, que em nada lembra o frenesi de Buckingham, na Inglaterra. Mas eis que, não mais que de repente, aconteceu tudo ao mesmo tempo agora na casa real dos Glücksburg, fazendo os termômetros nessas bandas escandinavas alcançar uma fervura inimaginável. Alojado ainda pequeno no palácio do padrasto, que vem a ser Haakon, o herdeiro do trono, o filho que a futura rainha Mette-­Marit teve em um casamento anterior foi detido depois de agredir a namorada e, não satisfeito, destruir o apartamento dela. O conto de fadas às avessas ainda colhe desdobramentos, e o rei Harald V precisa lidar em paralelo com um segundo dissabor: sua única filha, a princesa Märtha Louise, está de casamento marcado com um plebeu americano que se autointitula xamã, uma cerimônia com toda a pompa e estranhas circunstâncias marcada para este sábado, 31.

O duplo enrosco entalado na garganta real causou zum-zum-zum nos palácios europeus e levou o premiê norueguês Jonas Gahr Støre a relativizar: “Toda família tem problemas, e a realeza não é exceção”, disse, sem abrandar a pressão. Passa o tempo, e o nada enaltecedor episódio envolvendo o jovem Marius Borg Høiby, de 27 anos, não para de render frutos. Ele foi parar na delegacia sob suspeita de “agressão física e psicológica” a uma jovem de 20 anos com quem se relacionava. Amargou trinta horas ali e admitiu tudo, afirmando sofrer de transtornos mentais e estar sob o efeito de álcool e cocaína naquele 4 de agosto. Acrescentou que não há desculpa para o que fez e que, sim, merece ser responsabilizado, mas não conseguiu frear uma enxurrada de posts que não enobrecem o faustoso álbum de família: imagens de lustres quebrados, celulares destruídos, estilhaços de vidro e até uma faca cravada na parede estão sendo vastamente comentadas e compartilhadas.

VIROU MANCHETE - O garoto-problema: um escândalo após o outro
VIROU MANCHETE - O garoto-problema: um escândalo após o outro (Se og Hør/Reprodução)

Se o enredo terminasse por aí, já seria o suficiente para retirar os royals noruegueses de sua usual calmaria. Mas tem mais: duas ex-namoradas subitamente apareceram contando que, também elas, foram vítimas da fúria do integrante da kongefamilien, a família real (mesmo que não tenha nenhum título). “Marius fala como se fosse a primeira vez que uma coisa assim acontece. Pede empatia, porém foi violento comigo. Me deu pontapés e um murro na cara”, relatou Nora Haukland, que engatou um relacionamento com o garoto-enxaqueca em 2023, em vídeo publicado nas redes. As denúncias estão sendo investigadas. Aos 4 anos, ele foi acolhido no palácio da gélida Asker, colada à capital Oslo, após a mãe, que se prepara para acomodar a coroa na cabeça, se separar de seu pai, preso por tráfico de drogas, e ingressar na casa real em 2001, fazendo questão de manter a veia festeira e os hábitos plebeus. “O escândalo de agora, pela violência envolvida, não tem paralelo com nenhum caso recente na história da realeza da Noruega”, avalia o historiador Trond Norén Isaksen, autor de livros sobre a monarquia.

Com a ferida real ainda aberta, o reino se agita com o casório da princesa Märtha Louise, 52 anos, com o xamã Durek Verrett (nascido Derek David Verrett), festança que se estenderá por três dias, incluindo passeio de barco por paisagens invernais sob as lentes de uma revista de celebridades, para arrepio dos residentes do Palácio Slottet. Vestuário sugerido: “sexy e cool”. A conta, segundo a imprensa local, será bancada pelos noivos — ele, uma espécie de guru que sai espalhando por aí dispor de poderes para se comunicar com mortos e gente desaparecida e ter previsto os atentados de 11 de Setembro. A biografia do xamã adentra a seara policial, abrangendo acusações de abuso doméstico, invasão de propriedade, incêndio criminoso e até uso de magia negra. Na pandemia, Durek abasteceu o caixa vendendo um medalhão que seria a cura para a covid-19 e, em paralelo, bolou um artefato que aliviaria vários males caninos. Dizendo-se apaixonada, a própria princesa, que renunciou aos deveres reais em 2022, abraçou a carreira de “clarividente”, sustentando que é capaz de falar com anjos. “O casamento contribui para uma crise de reputação e confiança”, afirma o especialista Svein Tore Bergestuen.

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ALTAR À VISTA - Märtha Louise e Durek Verrett: a curandeira e o xamã
ALTAR À VISTA - Märtha Louise e Durek Verrett: a curandeira e o xamã (Reprodução/Instagram)

O clima já não andava lá muito aprazível no montanhoso solo norueguês, com o soberano à frente do trono, o rei Harald V, 87 anos, acumulando problemas de saúde. No início do ano, ele, o mais longevo monarca em toda a Europa, foi internado com uma infecção respiratória e, meses depois, colocou um marca-passo após um diagnóstico de “baixo nível cardíaco”. Reconheceu que precisa diminuir o ritmo e, em certas agendas, vem sendo substituído pelo herdeiro Haakon. Almejando o repouso, não contava com os atípicos sacolejos na tradicional realeza que já ultrapassa seus 1 000 anos. Por ora, os escândalos não fizeram os noruegueses quererem se livrar de toda a liturgia, menos engessada do que noutros cantos da Europa. São 62% os plebeus que preferem deixar tudo como está. “A continuidade da monarquia depende do apoio do povo, e na Noruega ele é a favor da permanência”, ressalta Robert Hazell, da University College London, autor de um estudo sobre a sobrevivência das casas reais. Parece que os tremores de agora têm servido para dar uma boa apimentada no reino dos arenques e da elevada qualidade de vida.

Publicado em VEJA de 30 de agosto de 2024, edição nº 2908

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