A reeleição de Donald Trump marca uma nova fase de incertezas jurídicas e políticas nos Estados Unidos. Eleito novamente à presidência, Trump enfrenta uma série de processos criminais que podem ter implicações profundas para sua governança. Entre os mais graves está sua condenação por acusações de falsificação de registros comerciais em Nova York, relacionadas a um esquema de pagamento para silenciar a estrela pornô, Stormy Daniels, antes das eleições de 2016. No entanto, com sua vitória nas urnas, a pergunta que se impõe é: o que acontece agora que um presidente eleito pode estar à beira de uma sentença criminal?
O juiz Juan Merchan, responsável pelo caso em Nova York, está prestes a decidir se a condenação de Trump será anulada. O que gera dúvidas sobre a condenação de Trump neste caso é a decisão da Suprema Corte dos EUA, em julho de 2024, que decidiu dar imunidade presidencial. Com isso, o republicano pode reivindicar imunidade por algumas ações durante sua gestão, como o tentar reverter o resultado das eleições de 2020. Embora a decisão tenha criado um precedente ao afirmar que os presidentes gozam de imunidade processual quando se trata de atos relacionados a suas funções oficiais, não ficou claro se a imunidade vale em casos que envolvam condutas pessoais anteriores à presidência, como na acusão de suborno da estrela pornô em 2016. Caso Merchan mantenha a condenação, Trump poderá enfrentar uma sentença que pode incluir até quatro anos de prisão.
Este cenário coloca os EUA em território jurídico inexplorado. Trump é o primeiro presidente da história americana a ser condenado criminalmente. Em situações normais, a condenação por um crime poderia resultar na prisão ou em sanções que poderiam comprometer sua capacidade de governar. Especialistas jurídicos preveem que, se Merchan não arquivar o caso com base na decisão de imunidade da Suprema Corte, os advogados de Trump provavelmente solicitarão o adiamento da sentença, evitando que ele seja preso antes da posse em janeiro de 2025. A Constituição dos EUA não impede explicitamente que um presidente condenado criminalmente tome posse ou governe enquanto cumpre pena, criando um dilema inédito. A narrativa de “perseguição política” que Trump tem utilizado ao longo de sua campanha pode ganhar ainda mais tração entre seus apoiadores, aumentando a pressão sobre o sistema jurídico.
Trump enfrenta outros três processos criminais: duas acusações federais movidas pelo Conselheiro Especial Jack Smith, uma envolvendo a retenção ilegal de documentos confidenciais e outra sobre sua tentativa de reverter os resultados das eleições de 2020; e um processo estadual na Geórgia, onde ele é acusado de interferir diretamente nas eleições. Se Trump fosse um cidadão comum, essas acusações poderiam resultar em sérias consequências, incluindo prisão. No entanto, há precedentes legais e políticos que indicam que presidentes em exercício, ou presidentes eleitos, podem evitar processos criminais ativos, algo que o Departamento de Justiça dos EUA já sinalizou estar considerando.
Se os tribunais decidirem que Trump deve ser preso, há inúmeras complicações práticas. Um presidente pode governar de trás das grades? A resposta simples é que não há regras claras para esse cenário. A capacidade de um presidente de exercer sua função remotamente ou de ser impedido de exercer o cargo por circunstâncias excepcionais já foi discutida em relação a questões de saúde, mas nunca sobre uma prisão. Tal possibilidade pode forçar o Congresso a considerar um processo de impeachment ou, em última instância, uma transferência de poder, caso Trump seja considerado incapaz de exercer suas funções.
Com uma base de apoio leal, Trump pode continuar a moldar o discurso político nacional, utilizando-se das acusações para alimentar sua narrativa de vítima do “sistema”. Ao mesmo tempo, essas pendências legais inevitavelmente distrairão e potencialmente paralisarão partes importantes de sua administração.
*com Reuters